— Onde vamos encontrar Ruan? — Coloquei o cotovelo na janela, apoiando a mão no teto do carro.
— Na cafeteria perto da praia. — Olhei para o lado oposto ao revirar os olhos.
Claro que seria na praia.
Diferente da família do Gui, a de Ruan tem pensamentos mais abertos, ninguém se importa de fato com ninguém, mas estão sempre juntos, defendem-se com unhas e dentes. Eles me aceitaram fácil, fácil, às vezes acho que esquecem que não faço parte dela. Por isso, o rapaz sempre fez o que lhe dá na telha, sem se importar com muito.
Quando ele me disse pela primeira vez que está cursando gastronomia, eu ri da cara dele, no entanto, ele permaneceu firme. Em minha defesa, a situação não era das melhores, estávamos na direção, pois Ruan estava com drogas ilícitas desfilando pelos corredores como se nada tivesse acontecido, achei serem drogas surtindo efeito. Ele não tem cara de cozinheiro, o olhando de longe diriam fácil que é educador físico.
Ao chegarmos, escolhemos uma mesa e esperamos o bendito chegar, com uma xícara de café fumegante e confortável. Tínhamos a certeza de que estava dentro d’água num pedaço de isopor flutuante.
— Por que está dando em cima do pobre coitado? — tomei um gole de café.
— Sem rodeios, não é? Ainda não me acostumei com esse seu jeito.
— Não vou mudar de assunto. — Deixei claro que a tentativa foi frustrada.
— Foi só uma brincadeira, não sabia que ele iria corresponder. — falou, afundando um pouco na cadeira.
Franzi os cenhos.
— Não foi bem o que percebi. — O loiro ficou vermelho ao ser acusado.
— Você não entenderia, ele é gay. Eu senti isso. — falou mais baixo, antes de engolir um pouco de cappuccino.
— Até onde sei, ele estava tendo um caso com uma menina. — Guilherme fez uma cara de descrente e acenou com pouco caso.
— Eu também já fiquei com mulheres… — deixou subentendido.
— Sabe que não estou falando isso por ele, não é? Não sei como se conheceram, mas não quero que leve isso a sério, pode ser que ele não tenha a mesma coragem que você. — Falei um pouco mais baixo, olhando diretamente nos seus olhos azuis bondosos que beiram o transparente.
— Quem precisa de coragem? — Ruan se jogou na cadeira, respingando água por todo lado, sem cerimônia, e chamou o garçom, quanto esperava que lhe respondesse. — Já pediram?
— Não. — Como Gui não parecia estar disposto a responder, o fiz.
— Que bom, estou morrendo de fome e não quero comer sozinho. — falou antes de pedir meias porções. Depois que o atendente foi embora, o chegado nos olhou de cenhos franzidos, encontrando seu amigo de infância de cabeça baixa e ombros caídos, limpando nervosamente as unhas limpas.
Eu o olhava, tomando gradualmente meu café.
— O que está acontecendo?
Lhe fiz um sinal de que não era nada com que precisasse se preocupar, mudando ainda mais a expressão, estranhou.
— Neste final de semana vai ter a festa de fim do período de uma turma. E aí? — Nos olhou esperançoso. Suspirando, o loiro nos olhou, agora com um sorriso.
— Que horas vão ser? — falou.
— A partir das 22 h — respondeu Ruan, dando espaço para o garçom preencher a mesa.
— Hum, tem algo importante… — falou com croissant na boca. — É a fantasia.
— Tô fora. — falei.
— Deixa de ser chato, Alex. — Me repreendeu o negro que mais parecia uma muralha ao meu lado.
— Eh, Alex, qual foi a última vez que fomos a uma festa, ainda por cima fantasiados? Será ótimo. Temos que ir combinando. — Gui falou empolgado, quase saindo da cadeira ao falar.
— Se eu já não estava disposto, isso acabou de realmente me dar a certeza. — Espatulei uma torrada com requeijão.
— Você também acha uma má ideia? — o loiro perguntou ao amigo.
Esse terminou de engolir a torta de frango com a ajuda do suco de manga antes de confabular.
— Um dia desses fiquei com uma menina da turma de pedagogia, não que isso venha ao caso, mas para entrar no contesto, nós estávamos no… no ato… tá ligado? — Nos olhou nervoso.
É engraçado como o Ruan pode ser o mais aberto e o mais fechado, no meio de outras pessoas ele não hesitaria em falar como fez e aconteceu com a dita cuja citada, mas quando está somente nos três ele trava. A minha guerra é entre engolir a torrada e não rir do constrangimento dele.
Com os olhos focados no amigo, Guilherme o incentivou a continuar em um gesto, pondo uvas na boca como se a história fosse a melhor que ouvisse em séculos.
— Bom, teve uma hora, que não vem ao caso, ela disse: “me castiga com esse tridente, Poseidon.”
Agora, não consegui. A vontade de rir já estava presa na garganta. Acho que eu nunca ri tanto na minha vida. Pior, eu fui acompanhado pelos dois. E sempre que achávamos que tinha acabado, olhávamos um para os outros. Com certeza, as pessoas do café estavam nos achando os mais loucos.
— Que ridículo! — tomei fôlego.
— De onde ela tirou isso? — o loiro perguntou.
— Pior fui eu que tive de segurar o riso. — Tomei um pouco de água para limpar a garganta, voltando a dar atenção à comida.
— Ela foi bem criativa.— Não acabou. — falou. — Descobri, meu amigo, que é assim que somos conhecidos pelas meninas da faculdade. Poseidon… — apontou para si. — Zeus… — indicou Guilherme. — E Hades. — Direcionou o dedo para mim.
— Sério? E por quê? — falou o galego, mais que interessado.
Eu sabia que nossos nomes sempre eram jogados nas conversas do Campos, mas nada comparado a isso. É surreal saber que somos quase como estrelinhas naquele lugar, daqui a alguns anos ninguém lembrará de ninguém, para que esse alvoroço todo? Apenas pela beleza? Há outros caras com esses requisitos também, no entanto, admito que o nosso dom em estar sempre em confusões colaborem para o estrelato.
— Ela explicou, mais ou menos, que estou na praia o tempo todo, você é o mais “doce” e está sempre leve e o Alex é o fechado, que só sorri para quem ele quer. — Vimos o louro balançar a cabeça ponderando.
— E por que deuses gregos?
— Como a própria disse, somos deuses gregos em pessoa. — Quanta devoção.
— Foi ótimo saber dessa história — fui sarcástico. — Mas como chegamos neste ponto? — disse comendo pudim.
— Pensei em irmos de como fomos apelidados, seria impactante. — Senti meus lábios repuxarem. Ruam ignora tudo isso, o que ele quer é ser o centro das atenções.
— Talvez não seja má ideia. — falei por fim. Deixando um Guilherme super empolgado. — Agora terminem logo com isso, que temos aula.
E eu tenho atividades para entregar, o futuro de vocês está garantido, mas o meu só correndo atrás.
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O Céu Na Palma Da Mão [concluído]
RomanceAtena Loyola que aos vinte e sete anos tinha o sonho de ser mãe, mesmo depois de ter passado por más experiências em relacionamentos fracassados, ainda assim decidiu realizar esse bendito sonho, nem que para isso tenha que fazer uma inseminação assi...