— Você é maluca?
Minha mãe falou alterada, levantando-se da poltrona. De cabeça erguida, continuei no meu lugar para ouvir todo o sermão que seguiria.
— Não pensa nas consequências dos seus atos, não? Como iria conciliar sua vida com uma criança? E quando ela nascesse, sabe o trabalho que dá cuidar de um bebê?
Pelo visto a única pessoa que deveria ter compaixão por mim, no momento está me tratando como se eu fosse uma menina imatura e despreparada. Sim, ontem pela manhã fiz o teste e não deu o resultado que eu queria, resoluta fiz o de sangue, também deu negativo.
Eu estava ansiosa e esperançosa, claro que também estava preparada para não estar gravida, ainda assim, sentir meu coração afundar no peito.
Não foi caro o procedimento, é certo que tive uns bons meses para fazer tudo com seguridade e ainda estar preparada para futuros remédios. No entanto, dinheiro não é a questão, caso tentasse mais uma vez teriam de ser novos meses, preparação psicológica, além disto não sei se estaria pronta para ser novamente inseminada. Minha idade dissuadiria uma gestação que não fosse de risco.
— Pare de me tratar assim. Sei de tudo isso, não foi um ato impulsivo. — Falei na esperança de acalmá-la.
— Pois, não parece. Sabe o que os vizinhos iriam pensar se você do dia para noite surgisse com uma barriga na boca?
Ela me olhou como se fosse a pior loucura que aconteceria na minha vida.
— Muito obrigada por se compadecer por mim. — Soei sarcástica. — Mas sinto te informar, mãe, que eu não preciso da aprovação de ninguém para fazer o que bem entender da minha vida. — Enfatizei para a própria poder entender que eu só queria deixá-la ciente da minha perda, não estava nem estou atrás do seu ponto de “achar ser melhor”.
— Tudo bem. — Mamãe levantou as mãos em rendição. — Deus é tão justo que findou essa loucura. — disse desgostosa.
Para mim, acabou aqui. Não consigo mais ter paciência, não agora. Está tudo tão recente, ela poderia guardar a opinião para outro momento, que eu aceitaria, mas não assim.
Levantei de onde estava e segui a porta a abrindo, dando entender que sua presença não era mais bem-vinda.
— Você pode até me expulsar da sua casa e me excluir da sua vida, mas sabe que o que digo é verdade. Para falar a verdade, preferiria que estivesse engravidado do neto de Carmem. — De cabeça erguida, falou sem demonstrar arrependimento nos olhos de gelo. Sentindo meu queijo tamborilar, mantive o alto controle.
— É, seria melhor mesmo, engravidar de uma pessoa que você considera um vadio de riqueza duvidosa e que nunca dirigir nem a palavra. Mas se para você tem um rosto, tudo bem, não é, mãe? — Negando, ri. — O que de fato te incomoda?
— Isso vai contra tudo que é natural. Não é normal uma criança ser feita sem um pai. Já é escandaloso o suficiente não ser num matrimônio, ainda quer expor esse ser à humilhação de não ter uma figura paterna? É uma prática infiel a Deus, Atena. — falou.
Ela estava disposta a me machucar. Porém, não a deixaria ver o quanto o que disse permeou o meu corpo ao ponto de senti-lo formigar.
— Não sabia que era tão religiosa… — Ainda mantendo a porta aberta, me segurei no trinco com mais força, pondo meu peso sobre ele.
— Como poderia, não é? — Com um sorriso consternado, me encarou atentamente. Engolindo as lágrimas, desviei o olhar.
Afrodite, mesmo ressentida e magoada por minha atitude, como um furacão, se foi. Deixando o silêncio do que foi destruído.
Será mesmo que Deus está me privando de ter um bebê? Ou sou alguém que não merece ser mãe? O que estou fazendo de errado?
Durante a semana, o tempo estava semelhante aos meus sentimentos, o sol havia saído poucas vezes, a garoa persistente acompanhou o frio que me deixou ainda mais melancólica. Por conta de tal, trabalhar se dificultou, me deixando resfriada e o corpo reclamou rigorosamente. Estava tonteando, o mundo parecia girar, muitas vezes as vozes das crianças se misturavam e sempre que isso acontecia, me manter sentada era o que amenizava.
Pode ser que sejam sintomas emocionais, pesquisei isso na Internet. Muitas pessoas, depois que passam por situações tidas como traumáticas, tendem a ter reações refletidas pelo corpo. Vi o caso de um menino de dois anos que, ao perder a mãe, adquiriu diabetes emocional.
Somando isso, meus dias foram péssimos.
Hoje é sexta e pedi à Cristina para sair mais cedo, não estou me sentindo bem. Agora, no caminho de casa, só penso em tomar um analgésico e dormir o final de semana inteiro. Talvez tenha que ir ao médico ver o que é isso, mas antes passarei na farmácia.
— Olá, boa noite, em que posso ajudar?
A atendente jovenzinha se dirigiu rapidamente a mim.
— Quero uma caixinha de analgésico — falei com a voz fraca.
A tontura me pegou de surpresa e tive de segurar no batente com mais firmeza.
— A senhora está bem?
— Estou sim — falei com pouca convicção, ela me olhou desconfiada.
Por que essa menina está demorando tanto? Analgésico é tão fácil de achar. Levantei os olhos a tempo de ver a atendente desesperada tentando chegar onde eu estava, mesmo estando do outro lado do balcão. Meu corpo foi se afastando das suas mãos. Não consegui fazer nada mais do que sentir minhas pálpebras pesarem com todo o conjunto de pestana, levando-me à gradativa inércia. Fui impossibilitada de qualquer que fosse o contrário de não ser abduzida pela escuridão.
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Texto com revisão.
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O Céu Na Palma Da Mão [concluído]
RomanceAtena Loyola que aos vinte e sete anos tinha o sonho de ser mãe, mesmo depois de ter passado por más experiências em relacionamentos fracassados, ainda assim decidiu realizar esse bendito sonho, nem que para isso tenha que fazer uma inseminação assi...