Uma leve brisa enchia a sala esvoaçando os cabelos ruivos da jovem senhora à minha frente. Admirando A Noite Estrelada no teto, percebi seu olhar firme que parecia penetrar até a minha alma. Não meu coração. Não tinha um. Decidi que não tinha. Não mais.
- O que quer dizer com "Não tenho coração"? Todos temos!
- Anatomicamente sim. Emocionalmente não. - suspirei
- Seja mais precisa, se puder, por favor.
- Quer que eu seja mais clara que isso? - quase gritei. Imediatamente me arrependi. Ela não tinha culpa de nada. - Pois bem. O amor é fatal. Amar pode ti levar à morte. E consequentemente a perda de um coração... Mas não perdi o meu. O mataram. O destroçaram sem dó, nem piedade. Como um gangster arranca as unhas do seu inimigo com um alicate, arrancaram essa droga do meu peito. Pisaram e o jogaram em uma vala. Sem utilidade. Sem propósito. Sem vida.
A senhora ruiva pareceu incomodada de certa forma. Talvez pelo tapa poético de minhas palavras, ou simplesmente por tê-la despertado algo.
- Amor não é dor, minha querida. O amor é puro, significativo, relevante. Necessário. O que você passou a fez ter uma visão distorcida e sofrida do que ele realmente é. E eu sinto muito por isso.
"Eu não sinto". Pensei. "Ninguém sente".
- A minha vida toda sonhei com o dia em que entregaria totalmente meus sentimentos a alguém. A maneira afetuosa e responsável que dariam valor. Que cuidariam de algo tão íntimo. Porém na primeira oportunidade fui atraída pelo Judas do amor. E este traiu o que eu sentia sem excitar. Eu poderia entregá-lo? Poderia. Eu poderia condená-lo? Poderia. Eu poderia matá-lo? Poderia. Mas eu sou boa demais para tal. E só agora percebo que não ter faltado às aulas trouxe-me ótimos resultados. - sorri. Não teria conseguido superar sem elas. - sentei-me no divã
Naquele momento a senhora ruiva franzia o cenho confusa.
- Espere... que aulas exatamente?
Levantei-me já com a mochila nas costas. Abri um meio sorriso e disse:
- Boxe.
"Aquele tonto não ia conseguir andar por dias". Concluí fechando a porta atrás de mim. "Azar o dele".
Continua...
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PoetryUma coletânea de emoções, angústias, medos e prazeres. Em outras palavras... sentimentos em forma de texto.