FLORIAN
Duas coisas aconteceram enquanto Branca explicava que me trouxe a esse lugar por impulso.
Primeiro: quase falei sobre minhas personalidades quando ela questionou sobre meu cabelo. Segundo: Eu me lembrei de tudo que aconteceu na clínica, quando eu não era eu. Isso nunca aconteceu tão claro assim.
Agora estou aqui nesse quarto estranho, olhando essa roupa de um tal de João sobre a cama. Não quero nem saber por que ela tem roupas de homens em sua casa. Está claro que uma mulher morando "sozinha" tem seus casos ou relacionamentos.
Ela é normal, pode ter uma vida. Não é como eu.
Sem escolha, visto o moletom preto e a camisa cinza.
Quando desço encontro Branca na cozinha. Ela também tomou banho. O cheiro gostoso do seu hidratante desperta uma parte em mim que não deveria.
"Sem ereção agora, idiota". Resmungo em pensamento.
— Oi, você está aqui — diz sem jeito.
— A roupa serviu. Agradeça ao seu namorado.
— É do irmão da Maria. É que às vezes ela usa roupas dele. E como sempre está aqui, acaba deixando para trás. Eu não tenho namorado.
— Sei. — Gosto de saber, mas me faço de indiferente.
— Estou fazendo o jantar. Gosta de moqueca de peixe?
— Sim.
— Pode assistir televisão na sala enquanto espera. Tem alguns aplicativos de streaming.
— Ou posso te ajudar de alguma forma. Estou meio cansado de não fazer nada. — Na clínica eu era servido como rei, isso às vezes cansa.
— Já está quase pronto. Vamos combinar que você lava, então. — Ela sorri. Esse sorriso é demais para a sanidade de qualquer mortal. — Se não quiser assistir, pode ficar aqui. Me fala um pouco mais sobre você.
— Prefiro que me fale sobre você.
— Humm... fugindo da pergunta, muito suspeito. — Sorrio de canto. — Mas tudo bem. O que quer saber?
Puxo um banquinho e sento apoiando os braços no balcão.
Não passa despercebido o jeito como ela olha o meu braço, deslizando o olhar pelos meus músculos. Ela gosta do que vê.
— Por que mora sozinha? — faço a primeira pergunta que me vem a mente.
— Resumindo. Meu pai, que eu não sabia que era bandido, ficou com a minha guarda depois que minha mãe morreu. Eu tinha quinze anos. Na época eu era bem desengonçada, magrela, aparelho nos dentes, nada atraente. Mas depois meu corpo começou a ir para o caminho certo, tirei o aparelho e passei a cuidar melhor da aparência. — Franzo a testa sem entender o rumo dessa história. Ela ri. — Desculpe, sou péssima em contar histórias. Esqueci de dizer que meu pai tem uma mulher mais jovem. Ela tem vinte e três e eu vinte. Ela era até menor de idade quando se juntaram. Enfim... Acontece que essa "madrasta" — faz aspas com os dedos e se aproxima de mim, deixando o fogão fazer o trabalho dele — viu em mim uma rival. Era um pesadelo viver com ela. Sempre sabotava as minhas coisas, roupas, cremes... esses tipos de coisas. Uma vez ela colocou alguma coisa em um gloss meu e quase que destrói minha boca...
— Por isso é vermelha assim?
Ela sorri de um jeitinho envergonhado. Porra de mulher que mexe com meu tesão apenas sorrindo!
— Não. Nasci assim. A raiva dela era essa. Parece que é exótico.
— É lindo.
Sem jeito com meu comentário ela continua:
— Ai meu pai acabou me deixando morar sozinha. Vigiada, mas longe dela.
— Sua história parece um conto de madrasta má. Ela falava algo como "Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?" Por isso seu nome é Branca? — sinto minha boca formar um sorriso ao imaginá-la em uma fantasia de princesa, uma estilo sexy shop.
— Eu já era Branca antes da madrasta má — ela brinca.
— Branca de Neve também.
— Me pegou. Quem sabe um dia eu não vá morar com os sete anões?
Rimos e ela volta a olhar a panela.
— Que morro é esse? — pergunto o que tenho quase certeza que já sei.
— Morro da morte. Meu pai é o Jafar.
— Imaginei. — Ela me olha. — Vai ser bem difícil sair sem ser notado. Fico me perguntando como me trouxe.
Ela desvia o olhar.
— Nem queira saber — sussurra.
Conversamos sobre amenidades até o jantar ficar pronto. Suas perguntas sobre mim ficaram sem respostas por enquanto.
Depois do jantar, tomamos um vinho assistindo um filme antigo sobre dança que não prestei atenção nem no nome e conversamos sobre a forma como ela irá me tirar desse morro.
Enquanto conversávamos eu só pensava que sentiria falta da sua presença quando voltasse para minha vida.
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Branca de Neve do Mafioso - Contos da Máfia IV - Completo até 01/07/2024
RomanceFlorian Seven não espera ter uma vida comum, com esposa e filhos. Essa possibilidade o apavora. Não por fazer parte de uma família de mafiosos, mas por ter momentos em que não controla o próprio corpo. Desde muito cedo ele foi vigiado e passou anos...