Capítulo 15 - Não temos tempo a perder

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O sol não nasceu ainda, no relógio marca 05:39AM. Caminho descalço pelo piso, sentindo o gelo da cerâmica se espalhar sob meus pés.

Desde que a notícia sobre o Sol se espalhou, cada dia eu recebo menos correspondências. Na verdade já faz mais de um mês que não chega uma. Procuro em meus e-mails, mensagens do celular, mas não encontro boleto para o pagamento de luz ou de água. Única coisa que sei que ainda é descontado, é a Internet, mas acho que é por estar em automático no meu cartão de crédito. É muito interessante, mas parei de receber ligações das operadores e trotes sobre resgate de dinheiro fantasma. Eu ainda quero fazer minha parte, mesmo que mundo esteja se encaminhando para o fim. Dinheiro e bens materiais estão por um fio de perder todo o seu valor, acredito que mais perto do final, a verdadeira face da humanidade vai dar as caras. Será o colapso da sociedade, construída lentamente durante os séculos.

Troquei algumas mensagens com a Alicia de manhã, mas foi algo sem jeito. Um bom dia e um como esta... Oque vai fazer a tarde? Tem planos para de noite? Eu noto que ela ainda está trancada em seu mundinho particular, mas se ofereceu junto com o Marcos para ir até a casa da minha tia me ajudar a recolher alguns itens que ficaram para trás. A verdade é que nada disso importa mais, mas ainda sinto vontade de visitar uma última vez aquele lugar.

Meu carro já está coberto a muito tempo, nunca fui o tipo de cara que liga para quantos "cavalos" seu carro tem? Qual o ano? Quantos litros faz por quilômetro? Mas tenho que admitir, eu amo oque está em minha garagem.

Retiro o pano que cobre a máquina. Um Chevrolet Impala 1967, quarta geração. Esse carro é um legado deixado pelo meu pai antes dele partir. Não vou mentir, a sensação de sentar em seu banco de couro e ligar o motor, é arrepiante.

É engraçado, mas agora sentando dentro do carro, sinto uma conexão com meu pai, sinto até sua presença aqui comigo. Enquanto seguro na direção, me desce algumas lágrimas pelos olhos.

- Eu acho que nunca te agradeci o suficiente pai! Oque eu sou hoje é graças a você...

Sinto um arrepio em minha nuca, meu corpo treme por inteiro por alguns segundos.

- Obrigado por tudo!

Dou a partida e sigo para a casa da minha tia. São quase quarenta minutos de carro até lá. No caminho eu vejo um posto com uma pequena fila de automóveis. Noto uma placa escrita a mão em frente a conveniência.

"Apenas 25 Litros por carro. Estamos com falta se abastecimento"

O tanque está na metade, porém, esse carro consegue consumir rapidinho a sua reserva. Decido parar para abastecer, tenho planos para ele.

No percurso eu noto que as pessoas param para observar, faz sentido, é um monstro sobre rodas. Em frente a casa da minha tia, alguns garotos que estavam de bicicleta param para tirar fotos, eles me encaram esperando reprovação, mas eu apenas aceno com a cabeça em concordância. Eles me lançam um sorriso e após alguns clicks no celular, seguem seu rumo. São tão jovens, as vezes sua única preocupação agora é viver, sem pensar no que esta por vir.

Estou parado encarando a porta da frente. A madeira desgastada e o trinco corroído pelo tempo. Minha tia foi uma professora durante toda a sua vida, não ganhava muito dinheiro, e tudo que tinha estava nessa casa.

O piso é de madeira, da para ouvir os ruídos enquanto caminho sobre ele. Seus móveis são antiguidades passados de geração para geração. A maioria das coisas estão dentro de caixas, e algumas coisas foram levadas, como cama, sofá, o ar condicionado. Acredito que meu tio não perdeu tempo assim que soube da morte dela. Eu não dou a mínima para esses bens materiais, só quero ver se restou alguma coisa que eu possa levar comigo, para me lembrar dela até os últimos dias aqui na terra.

No último dia em que te conheciOnde histórias criam vida. Descubra agora