Capítulo 16 - Na ilusão de ótica

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  Os barulhos das ondas já me desnorteavam o suficiente para eu não perceber o tempo passar. Eu na realidade nem queria que o tempo passasse, por mim aquele simples momento seria infinito, duraria por toda a eternidade. 
  Nesse momento eu já estava com a cabeça encostada no ombro de Kel enquanto ele acariciava meus cabelos com sua mão quente e macia. Quentes o suficiente para derreterem qualquer verso de poesia abstrata que descansasse em minha pele, não havia mais nenhum enigma em mim, somente a certeza de que eu o amava do mesmo jeito que ele me amava. 
  De repente eu percebo que esqueci de um detalhe, eu estava tão nervoso na hora que esqueci de entregar a flor para ele. Aí, Meu Deus. Parabéns, Sunny. Será que dá pra entregar agora? Aí, foda-se. Não vou deixar minhas paranoias estragarem o meu momento, não hoje. 

Sunny: -Ei, Kel. 

Kel: -Oi? 

Sunny: -Fecha teus olhos rapidinhos. 

Kel: -Tá bom. -Ele fecha, foi mais fácil do que eu pensei. Com cuidado, eu tiro a mecha de seu cabelo que estava na sua orelha e a substituo pela flor que Basil tinha me dado. Nunca pensei que algo rosa ficaria tão fofo no Kel. Lindo...

Kel: -Oque é isso que você colocou?

Sunny: -Uma flor. Pode abrir os olhos. 

Kel: -Aww que fofo. Eu fiquei maneiro com ela? 

Sunny: -Ficou lindo. 

Kel: -Não mais que você, pode apostar. 

Kel: -E lá se vai começar a boiolagem. -Ele diz após ficar corado com o próprio elogio. 

Sunny: -Um relacionamento funciona assim. É brega, cafona e vergonhoso. 

Kel: -Por isso que é bom. É muito massa passar vergonha falando de amor. 

Sunny: -Meu Deus...

Kel: -Mas é verdade! Não dá uma leveza quando você fala assim comigo? 

Sunny: -É...Dá sim.

Kel: -Tá vendo. Eu sei oque eu falo, fi. Sou romântico. 

Sunny: -Com certeza...

  Como eu amo um homem idiota. É tudo tão puro, verdadeiro, da boca pra fora. É tudo vindo do coração, disso eu tenho certeza. Amo nisso no Kel, ele sempre coloca tudo pra fora sem filtro nem nada, mas nunca fere ninguém por conta dessa falta de filtro, porque no fundo tudo que ele pense e fala nunca é pra machucar alguém. Ele é de fato uma das melhores pessoas que eu já conheci na vida. 

Kel: -Eu posso continuar boiolando? Só mais uma.

Sunny: -Pode. Vá em frente. 

Kel: -Por que, de todas as pessoas, você escolheu eu pra gostar?

Sunny: -Eu me recuso a repetir aquela viadagem. 

Kel: -Aww vai. Aquilo foi oque você sentia e eu quero saber o motivo de você sentir aquilo. Entendeu?

Sunny: -Não.

Kel: -Entendeu sim. Só tá com vergonha de falar. 

Sunny: -Tá...Olha. Eu não sei o motivo de eu ter desenvolvido esse tipo de sentimento por você. Eu só sei que foi tudo natural e quando eu fui ver já tava pensando em você vinte e quatro horas por dia. 

Kel: -Que fofo. 

Sunny: -B-Bem e você? Percebeu como? 

Kel: -Eu não percebi. 

Sunny: -Oi?

Kel: -Eu só percebi que eu queria namorar você quando você se declarou pra mim. Quando você falou aquilo lá a minha vida toda passou na minha mente em um segundo e fez eu pensar: "Caralho, como eu não namorei ele antes." e assim foi que eu senti a avassaladora vontade de beijar você. 

Sunny: -Meu Deus, que lindo. 

Kel: -Que gay.

Sunny: -Muito gay. 

Kel: -Bem. Como eu acho que seus amigos já devem saber, quer voltar pra casa pra gente contar a novidade pra todo mundo?

Sunny: -Pra casa de quem?

Kel: -Pra tua.

Sunny: -Ah sim. Bora. Mari deve estar ansiosa por notícias de mim, nem mandei mensagem pra ninguém.

  Nós dois nos levantamos, tiramos um pouco da areia que estava na nossa pele e vamos rumo pra casa. Enquanto estávamos na porta quase entrando Kel me para.

Sunny: -Uhm?

Kel: -Antes da gente entrar, você pode finalmente me dizer oque aconteceu com o seu olho? 

Não não não não não não
Por que isso agora?
POR QUE ISSO AGORA?!?!?! 

Sunny: -Eu...Não quero.


Kel: -Mas, Sunny...

Sunny: -Por favor. Eu te imploro. Deixa isso pra lá. 

Kel: -...

Kel: -Eu vou deixar pra lá por enquanto, mas não pense que você vai escapar de me dizer oque aconteceu. Tá bom? Eu me importo com você e quero saber oque aconteceu com você para que você precisasse se distanciar de todo mundo por tanto tempo, beleza?

Sunny: -Tá bom...

  Finalmente aperto a campainha e espero alguém vir atender. Quando a porta se abre eu só vejo Mari de cabelo roxo e Aubrey de cabelo rosa. Parece que não foi só eu que fez algo diferente hoje. 

Sunny: -MEU DEUS, VOCÊS TÃO DIVAS. 

Mari: -Aubrey que me lembrou! Eu já tinha esquecido. Combinou, não combinou?

Kel: -Demais. Você duas ficaram ótimas. 

Aubrey: -Obrigada! Foi um momento muito lindo pra nós duas. -An? Aubrey não está mais com ódio de mim? O Basil deve ter dado uma baita lição de moral nela pra ela estar tão simpática assim comigo por perto. 

Mari: -Foi! A gente até chorou lá no cabelereiro de emoção. A gente ficou relembrando a época em que a gente começou a querer a pintar o cabelo e lá se foi a choradeira. 

Sunny: -E não foi só você que chorou hoje não viu, Mari...-Ela me olha com um olhar de orgulho de irmã mais velha. Olhar que ela não me dá desde que quando eu comecei tocar violino e...O resto não importa. 

Aubrey: -Desembucha. -Eu pego Kel pelo braço e o puxo para mais perto de mim. 

Sunny: -Então...Nois meio que tá namorando. 

Aubrey: -AEEEEEE PORRA. FINALMENTE!!! TAVA DANDO AGONIA JÁ ESSE LENGA-LENGA QUE NÃO IA PRA CANTO NENHUM.

Mari: -Parabéns para os dois! Fico muito feliz que finalmente tenha dado certo. Sejam muito felizes e Kel, cuide bem dele por mim. 

Kel: -Sim, senhora. 

  Palavras não conseguiam descrever a minha alegria no momento. Estava tudo no lugar. Eu finalmente estava com o cara que eu queria, Basil, meu melhor amigo, conseguiu seguir o seu rumo, Aubrey aparentemente me perdoou e Mari está com Hero feliz da vida. Que vida boa. De repente ouço passos vindo da escada em direção a porta. Era minha mãe. 

Mãe de Sun: -Que zuada é essa e MARI?! OQUE FOI QUE VOCÊ FEZ NO SEU CABELO?! -Ela vai correndo até minha irmã para passar a mão pelo cabelo da filha. 

Mari: -Oi, mãe...

Mãe de Sun: -OQUE VOCÊ FEZ?! Seu cabelo era tão lindo...agora parece um suco de uva em pó. O trabalho que vai ser pra cuidar disso. E ainda mais que você parece uma LGBT agora...Você não é LGBT não né?

Mari: -Não, por que?

Mãe de Sun: -Ufa! Porque uma senhora lá da igreja muito sabia disse que LGBT vai tudo pro inferno e o pastor concordou também! Ainda bem que você só tem o cabelo de um. 

An?
Que?

Mãe de Sun: -Mesmo assim, ainda é uma pena oque você fez com o seu cabelo. Tudo isso deve ter sido ideia dessa marginal da Aubrey.

Aubrey: -EI! 

Ah claro...
Era tudo uma ilusão de ótica.
Claro que não tava tudo bem. 

Mãe de Sun: -Vocês dois é melhor nem pensarem em algo assim. 


Kel: -Eu gosto do meu cabelo do jeito que ele é...

Mãe de Sun: -...Não é grande coisa, mas é melhor que isso aí. Bom, eu vou voltar para o meu quarto. 

Lágrimas começam a escorrer do meu rosto sem que eu consiga notar.
Eram lágrimas negras
Que caem, saem, doem...


Aubrey: -Sunny, eu posso falar com você em particular um minuto? -Meus pensamentos são cortados pela fala de Aubrey.

Sunny: -Ah, sim...Claro...-Ela me guia para fora de casa e antes que eu consiga dizer algo, ela me abraça fortemente. 

Aubrey: -Eu sei oque tá passando na sua cabeça agora. Eu sei que você percebeu algo sobre a sua mãe que lhe põe em perigo, mas antes de eu continuar eu quero lhe pedir perdão pela a minha ignorância pelo oque aconteceu com o Basil. Eu me importo muito com ele...E aquilo me transtornou muito. E acabou que eu queria arrumar um culpado pra descontar o meu ódio e só tinha sobrado você. Você me desculpa? -Eu tento dizer algo, mas minha voz é cortada pelo meu choro. 

Choro de lágrimas negras 
Que caem, saem, doem...

Aubrey: -Shh...Tá tudo bem. Nada de ruim vai acontecer com você.

Sunny: -E se ela descobrir?

Aubrey: -...Eu não sei, mas ela não vai fazer nada que nós juntos não possamos te ajudar.

Aubrey: -Agora estamos nós seis juntos de novo. Eu tenho certeza que vamos conseguir te ajudar a superar o preconceito da sua mãe quando você sair do armário pra ela. 

Sunny: -Você acha?

Aubrey: -Pff, óbvio! E também a sua mãe não é tão ruim quanto a minha. Tenho certeza de que ela vai quebrar esse preconceito por você ser filho dela.  

Sunny: -...Obrigado, Aubrey. Sou grato por ter uma pessoa como você ao meu lado. 

Aubrey: -E eu...Pena que nós começamos tudo de novo com o mesmo pé esquerdo de antigamente, mas agora podemos recomeçar de novo só que do jeito certo. Conte comigo.

Sunny: -Você mesmo na situação que está...Quer me ajudar.

Aubrey: -Óbvio! O Basil me ajuda e eu te ajudo. É um corrente de apoio. Eu aposto que ele estaria muito feliz de eu estar te ajudando já que ele já tá cuidando de mim. 

Sunny: -Você é maravilhosa.

Aubrey: -Você também.

  Ela me dá um soquinho no ombro e entra dentro de casa. Após se despedir de Mari e Kel, Aubrey vai embora. Não muito tempo depois, Kel faz o mesmo, porém comigo ele se despediu com outro beijo caloroso e disse que qualquer coisa podia ligar pra ele e ele pediu também para eu avisar para o Basil da novidade que ele ia avisar pro Hero. Com ele longe daqui eu vou para o meu quarto chorar um pouco. 

Kel POV: ON


  Chegando em casa corro para a cozinha comunicar Hero da novidade. Ele vai ficar orgulhoso de mim. Tomara. 

Kel: -HEROOO -Ele dá um pulo de leve.

Hero: -QUE SUSTO DA...Eu tava aqui esperando o micro-ondas terminar de aquecer um bagulho, mas sim. Conta. 

Kel: -Adivinha. -Ele cruza os braços e me olha com um olhar um pouco debochado. 

Hero: -Eu não sei, Kelsey Desoto, qual é a grande novidade da vez?

Kel: -Eu e o Sunny a gente tá namorando. 

Hero: -Que bom! Fico muito feliz por você, mas eu já esperava.

Kel: -Já?

Hero: -É...Meio que eu dava um apoio extra pro Sunny arrumar coragem o suficiente para se declarar para você. -Eu faço uma expressão de choque falsa e dramática.

Kel: -Como você pode? 

Hero: -Eu sei...Me perdoe. -Ele retribui o drama falso. -Bom, o jantar tá pronto. Vem comer.

Kel: -Tô indo. 

Kel POV: OFF

Sunny POV: ON

  Depois de derramar muitas lágrimas, eu decido finalmente ligar para o Basil. 

Basil: -Oi?

Sunny: -E aí...

Basil: -Ah, oi, Sunny! A Aubrey acabou de chegar daí, o cabelo dela ficou lindo, né?

Sunny: -Foi...Ficou lindo.

Basil: -Sim! E como foi o negócio com o Kel? Deu certo a flor? 

Sunny: -Deu tudo certo. Ele aceitou e teve toda a cena lá e tals. Foi maravilhoso.

Basil: -Sunny, você parece meio pra baixo. Aconteceu algo? Tá tudo bem? -Droga, não consigo disfarçar nada. 

Sunny: -Não, Basil, não tá tudo bem...

Basil: -Pela sua voz de choro eu consegui perceber, mas oque foi que aconteceu? Aparentemente deu tudo certo. 

Sunny: -Minha mãe, eu descobri hoje que ela é homofóbica. 

Basil: -Sunny...Eu sinto muito, mesmo, mas você já contou pra ela?

Sunny: -Não. Eu acho que se eu contar ela pode me expulsar de casa, me matar, tentar me converter na igreja. -Quanto mais eu falo mais eu choro. 

Basil: -Fica assim não. A gente vai dar um jeito! Infelizmente eu acho que a opção é você não dizer nada mesmo. Sei que deve parecer tentador, mas é melhor esperar um pouco. 

Sunny: -Certo...

Basil: -Mais uma vez, saiba que você pode contar comigo pra tudo! E agora com o Kel também. Né. -Ele me provoca um pouco para tentar levantar o clima. 

Sunny: -É...também. -Mas falhou.

Basil: -Eu vou ter que ir, desculpa. Não se esqueça, tudo dá certo no final! 

No final... 

Sunny: -Certo.


  Eu desligo o celular e vou dormir. Meus olhos já estava pesados de tanto chorar. 





Continua...

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