Ruas de El Paso, Texas – 00:55 hrs
Yong-gi.
Yan refletiu sobre esse nome. Não sabia o porquê de ter tido aquela ideia, mas um novo nome era sinal de um recomeço, e ele sabia que, lá no fundo, era isso que ele queria tentar. Algo encaixou no seu cérebro e virou uma alavanca para aquelas mudanças desde que viu Adler na praça. O loiro foi o responsável pela sua vida ausente de amor e dignidade, ele foi a sua porta de entrada para o submundo da noite e para toda a desesperança. Depois que o confrontou, sentiu que fechou algumas lacunas importantes e soltou alguns pensamentos que o sufocavam. Enfim, pôde deixá-lo no passado, e isso significava escrever uma nova história; uma história com direito a tudo o que ele próprio havia se privado pela raiva, pela dor e pela vergonha do que aconteceu na sua vida. E ele queria incluir Miguel, ou Yong-gi, na sua história. Por isso, um novo nome se fazia importante, pois Yan não era o único que estava abandonando o seu passado sombrio. Miguel era a criança ferida de um casal irresponsável e amargo. Yong-gi era o filho de Park Yan Lee.
Veronica, a travesti alta e bronzeada, se aproximou.
— Andou sumido, gatinho?
— Eu estava tentando conseguir clientes em outros lugares.
— Hurum. E o menininho que você ajudou? Achou a mãe dele?
Yan soltou um suspiro profundo e cansado.
— Aconteceram tantas coisas...
— Com o menino? Xii, conta esse babado, vai.
Ele se virou para ela.
— Veronica... aquele menino é o meu filho.
O olhar dela estagnou nos olhos pretos dele por longos segundos, parecia estar tentando captar a mensagem por completo.
— Seu filho? Tipo... seu filho biológico? Espera aí... você transou com uma mulher?
— Eu sei, é difícil acreditar — ele olhou para o horizonte, distraindo seus pensamentos perturbados com as luzes dos carros que iam e vinham de pontos distantes da cidade. — No momento, a coisa mais importante pra mim é ter a guarda dele, mas... eu sei o que fazer, e, ao mesmo tempo, não sei. Eu não quero arriscar que ele volte pra família horrível dele. Eu não quero perdê-lo.
— U-au... okay, pelo visto, eu perdi um monte de coisa — ela jogou o cabelo para o lado e passou a admirar o horizonte com o rapaz. — Se você conseguir a guarda dele, você vai continuar vindo pra cá?
Ele suspirou.
— Eu não sei...
— "Eu não sei, eu não sei"... Yan, bebê, tá na hora de saber das coisas, não?
— É difícil, Vê! É muito difícil... Porra, você não faz ideia...
Ele levou as duas mãos à cabeça e apertou os olhos. Tentou segurar as lágrimas, mas uma, solitária e brilhante, resvalou por sua bochecha, surpreendendo a loira bronzeada. Ela enfim percebeu como aquela situação estava o levando ao limite.
Ele continuou.
— Eu não quero perder ele... E-eu sei que eu posso perder ele a qualquer momento. Eu... eu nem posso cuidar dele, eu não me sinto pronto. Eu sou GP, eu não sei fazer outra coisa... eu não me imagino fazendo outra coisa! Tem uma coisa dentro de mim que dói... d-dói tanto... que eu preciso machucar o meu corpo toda noite, toda droga de noite, pra esquecer que essa dor existe! E-eu não mereço ter um filho.
De todos os assuntos que já conversou com ele, aquela foi a primeira vez que Yan desabafava sobre pontos tão delicados da sua vida. Eram amigos, e ainda sim, e apesar disso, jamais uma conversa como aquela havia acontecido. Veronica estava arrasada, seus olhos fitavam os dele sem titubear, seus pés fixaram no chão, suas pernas não se mexiam.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Todas as Coisas Voltam
RomanceMiguel é um menino criado em um lar fragilizado que sonha em conhecer seu verdadeiro pai. Yan Lee é um garoto de programa solitário que busca o amor verdadeiro nos olhos dos clientes com quem se relaciona. Ambos almejam mudar suas vidas amargas de u...