Capítulo 8: Lavanda

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— Você tá estranha — Foi a primeira coisa que Taís falou ao avistar Natália toda sorrateira entrar pela porta de casa, e de fato, ela estava estranha. Estranhissima. Mas quem seria Natália Cardoso se não estivesse estranha um dia se quer?

— Não estou.

— Está sim. Toda feliz, andando flutuando por aí, a Natália que eu conheço sempre chega da rua reclamando e fazendo questão de deixar todos sabendo que está de mal humor, então, o que está acontecendo com você?

— Não aconteceu nada, não posso estar feliz por simplesmente nenhum motivo?

— Não né Natália, todo mundo te conhece — Taís foi incisiva, seus cabelos soltos em um lindo volume afro, os olhos estreitos, tudo nela a acusava. Natália se calou.

— Oi tia Natália! Você tá estranha — Joaquim irrompeu de uma das portas do corredor, já vestia pijamas e a encarava sério, Natália por um segundo quis se atirar pelo universo. Parecia um complô contra ela — Quer jogar comigo?

— Claro, por que não? — Sorriu falsamente para Taís.

A viu virar os olhos pelo ato desesperado e a óbvia forma de fugir da conversa na qual Taís provavelmente arrancaria todas as informações possíveis e impossíveis da enorme boca grande da Natália.

Seria um exagero dizer que as últimas duas horas seguidas foram um sufoco sem tamanho, daquele tipo que te faz querer fugir para o mais longe e se encolher pequeneninha em um buraco qualquer, óbvio, seria um exagero, mas era verdade. Joaquim era um líder selvagem quando se tratava de jogos eletrônicos, ele a assustava, mesmo tendo onze anos e ela, bem, quarenta. Um fato já era claro, Natália e tecnologia eram coisas completamente opostas, quase água e vinho, e ela amava vinho. Sempre fugia daquele tipo de programação tia e sobrinho porque Joaquim não deixava barato, sugava até a última gota de sua vontade de viver e aspirava toda a esperança que tinha nas gerações futuras, ele era um grandississimo mini chato de galocha, sempre mandando, gritante, rindo de suas jogadas toscas e a expulsando do quarto quando ganhava pela vigésima vez seguida.

— Tia Natália, você é péssima, mas sabe, não existe glória sem muita luta, quem sabe um dia você melhore.

— Eu duvido muito.

— Posso te perguntar algo? — Seu rosto focado na tela bem a sua frente enquanto ganhava um jogo de corrida com certa facilidade.

— Depois que eu fizer você comer poeira.

— Isso não vai rolar, sabe disso. Você já esteve com alguém que fosse realmente muito difícil de estar perto?

— Que papo é esse para uma criança de onze anos?

— Eu acho que estou com problemas na escola, as pessoas são difíceis de entender às vezes, mesmo que me esforce muito e tente de verdade.

— Joca, olha, o que eu posso te dizer é que pessoas são realmente complicadas, mas as que valem a pena exigem o esforço. Um sábio me disse uma vez, não há vitória sem muita luta, e se essa pessoa for alguém que vala a pena se lutar, por que não simplesmente batalhar pela glória? Eu vou passar você!

Natália era uma negação em jogos eletrônicos, mas não se importava nenhum pouco com isso.

Ainda ouvia o tilintar do sino, via a senhora grisalha que caminhava pela loja toda perdida, via Carol simpática a apontar várias espécies de flores diferentes mesmo estando ligeiramente bagunçada e com os lábios borrados do batom clarinho que Natália usava, a via balançar as mãos empolgadas, falar entre risadas, e tudo o que realmente conseguia ver era toda aquela beleza majestosamente divina.

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