Esses pensamentos de repente me entristeceram. Será que eu tinha tomado a decisão certa? Agora era tarde demais para voltar atrás. Quando nos despedimos, senti uma pontada de algo mais profundo, que escolhi ignorar. E de alguma forma, senti-me culpada por ele não avançar no treinamento por minha causa. Era estranho pensar no que poderia ter sido e não poder fazer nada a respeito. Com relutância, forcei-me a não pensar mais nisso, por ora. Incerta sobre como ou mesmo se deveria responder, voltei minha atenção para o envelope de Kentin. Embora ele também estivesse ainda em treinamento, tinha sido designado para as fronteiras. Isso me fez pensar onde Armin teria ficado. Será que o treinamento inicial era no palácio?"
E se... Foco Zelennah! Foco!- Lenna? - ouvi meu pai chamar atrás da porta e, de forma quase frenética, escondi as cartas debaixo do travesseiro e senti meu rosto esquentar.
- Sim, pai? - abri a porta e o vi um pouco apreensivo.- O que houve?
- Temos uma visita. - respondeu. Ergui uma sobrancelha estranhando pelo horário, mas segui meu pai sem questionar.
Uma mulher nos aguardava enquanto minha mãe servia uma bebida quente. Analisei sua postura e visual. Muito bem vestida por sinal. Tinha cabelos curtos e bem pretos, um tanto despojados e usava uma roupa social igualmente preta.
- Filha, quero que você conheça a Chino. Ela veio de Lille. - notificou minha mãe ao nos ver chegando na sala.
- Boa noite. Mais uma vez peço desculpas pelo horário. - cumprimentou Chino de forma simpática. - Tenho algumas instruções para vocês, mas primeiro quero parabenizá-los. Vocês estão convocados para servir a família real durante o grande evento de aniversário da nossa gloriosa capital. - A cena a seguir foi quase engraçada. Meu pai ficou vermelho, minha mãe colocou as mãos na cabeça com expressão em choque e eu me sentei lentamente no sofá com um frio na barriga.
- Desculpa, Chino. Você pode repetir? - perguntei sem acreditar. Ela riu da situação.
- Sei que estão impressionados mas, ouso dizer que estão entre os melhores selecionados. Temos muito o que discutir e pouco tempo para processar. Mas não se preocupem. Poderão fazer isso a caminho do palácio. - Se a intenção dela era nos acalmar, falhou miseravelmente.
Após a saída da Chino, tivemos que correr para arrumar o que iríamos levar mesmo que não fosse necessariamente preciso. No palácio já teríamos o essencial. Como a nossa partida era ao nascer do sol, meu pai colocou na cabeça que precisava ir buscar sua colher da sorte no restaurante e então resolvi ir com ele. Ia aproveitar para passar na casa do Alexy e avisar que nos próximos dias, estarei ocupadíssima.
- Não acredito que ficarei sem os meus amigos. - Ele fingiu lamentar assim que contei. Estávamos sentados na soleira da porta enquanto meu pai conversava com os pais dele lá dentro.
- Será só por alguns dias, Ale. -Bagunceu se cabelo. - Prometo trazer muitas guloseimas para você. - Deitei a cabeça no seu ombro. - Nem acredito que isso está acontecendo. Minha família está nas nuvens. Mas estou com um pouco de medo. É uma baita responsabilidade.
- Nada que vocês não possam dar conta. Capaz de o rei nem querer deixar vocês voltarem. - rimos desse devaneio e conversamos mais um pouco antes de nos despedir.
- Se virem o Armin por lá, digam que estamos morrendo de saudades. - Quando a senhora Leger, mãe dos meninos, mencionou essa possibilidade, meu coração palpitou.
- Ahh... Claro que... Claro! Direi sim. Quer dizer, diremos. - Pronto. Quero enterrar minha cabeça. Meu pai, bem... Parecia se divertir com minha gagueira repentina.
- Sim, diremos. Foi um prazer revê-los. Até breve.
- Até breve. - Os Leger responderam juntos.Após alguns minutos de caminhada, o velho senhor Singer resolveu me provocar.
- Eu deveria ter insistido um pouco mais nesse casamento.
- Agora não, pai! - Nervosa e envergonhada, apressei meus passos enquanto escutava a sua risada nada sutil.
Eu entrei novamente no meu quarto não só com uma, mas duas novas preocupações. Servir às majestades e, talvez, reencontrar Armin após ler a sua carta. Como vou reagir? Bom, não sabia se iria descobrir.
A ansiedade nos concedeu pouquíssimas horas de sono e, pontualmente, uma carruagem já nos esperava do lado de fora. Ela nos levaria até o cais para uma viagem de quase meio dia até Lille. Já tinha visto navios do rei antes, mas nunca tão de perto. Meu pai parecia ainda mais impressionado que eu; seu entusiasmo era contagiante, como o de uma criança, o que me divertia. Avistamos Chino, que acenava com energia. Em contraste com a noite anterior, ela usava um traje branquíssimo, que refletia a luz do sol e combinava perfeitamente com a embarcação.
- Que prazer revê-los, - disse ela.
- O prazer é nosso - respondeu minha mãe por todos nós, enquanto eu oferecia um sorriso em cumprimento.
- Vamos a bordo. Quanto mais cedo zarparmos, mais cedo chegaremos. - continuou Chino. - Vou mostrar onde podem deixar os seus pertences.
Seguimos Chino tentando não nos distrair com o interior luxuoso do navio. Como era nossa primeira viagem pelo mar, ela nos aconselhou a comer pouco para evitar enjoo, e eu segui o conselho à risca. Depois de algumas horas, começamos a nos aproximar de terra firme, e já era possível vislumbrar a silhueta imponente das torres do palácio ao longe. Eu não fazia ideia das emoções que viveria naquele lugar.
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Coração Real
FanficNo reino de Voulon, o jovem príncipe Nathaniel está diante do maior desafio de sua vida. Herdeiro do trono e amado por seu povo, ele sempre soube que suas responsabilidades para com o reino viriam antes de seus desejos pessoais. No entanto, seu cora...