Um Conto para Três

4. Maya

Quanto mais subíamos a serra mais tensa eu fiquei. Não estava conseguindo disfarçar pro Oliver o quanto eu estava nervosa. Ele perguntou:

- Tudo bem, amor? Você ficou calada de repente.

- Calada, eu? Não, tô só apreciando a paisagem. - Menti.

Então ele começou a puxar assunto e falou do Lucca:

- Hoje é a primeira vez que vou ver o Lucca depois da morte do pai. Nem sei como vai ser isso. A verdade é que, por mim, Lucca poderia ter ficado no Canadá.

Oliver quase nunca falava do Lucca. Foi um baque pra mim escutar aquilo saindo da boca dele. Eles sempre foram muito amigos. O Lucca sempre cuidou e protegeu o Oliver com unhas e dentes. Não achei certa aquela fala e retruquei:

- Ele é seu irmão, Oliver! Não sente saudade? Você sabe que ele não teve culpa na morte do seu pai. Foi uma fatalidade. Achei que isso já tinha saído da sua cabeça.

- Uma fatalidade? Se ele não tivesse começado uma discussão, talvez meu pai ainda estivesse aqui. - Disse ele já um pouco alterado.

- Você não sabe disso, você não estava lá. Nem sabe se foi ele que começou a briga. Você nem quis conversar com o Lucca depois do que aconteceu. - Retruquei

- Por que você tá defendendo ele? - Disse ele já com o rosto vermelho. Oliver era muito branquinho e a vermelhidão no rosto era o primeiro sinal da irritação dele.

- Eu não tô defendendo! Só acho cruel demais você jogar a responsabilidade da morte do seu pai pra cima do Lucca. Isso não se faz, Oliver. Ele tá sofrendo assim como você. - Ele me olhou friamente, e eu segui falando:

- Eu só acho que você devia aproveitar que ele tá aqui pra vocês se curtirem como família. Ficarem bem e se apoiarem. A mãe de vocês também deve estar querendo isso.

Eu mal terminei a frase e ele falou num tom bastante firme:

- Maya! Deixa que com o Lucca eu me entendo. - Eu pude perceber o quanto ele ficou incomodado.

Não era minha intenção irritar o Oliver, mas quando dei por mim já estava defendendo o Lucca. Oliver só tinha comentado comigo uma vez sobre achar que o Lucca tinha uma parcela de culpa pelo infarto do pai, e eu também o repreendi. Nessa época ainda éramos apenas amigos, e ele ouviu a minha opinião sem reclamar. Hoje percebi que isso mudou. Oliver queria que eu concordasse com ele nisso e não que ficasse ao lado do Lucca. Isso seria impossível. Jamais concordaria com o Oliver nessa.

Ele ficou calado pelo resto do caminho. Eu já estava tensa e essa discussão só piorou as coisas pra mim. Quando estávamos quase chegando ele parou o carro num posto de gasolina, tirou o cinto, respirou fundo, virou pra mim e disse:

- Hoje é um dia importante pra mim. Você sabe o quanto eu gosto de você e eu tô muito feliz de te levar como namorada lá em casa. E eu sei que você também é amiga do Lucca e que eu nunca conversei direito com você sobre isso, mas eu e ele, nós mudamos. Nossa relação não é mais a que você conheceu antes. Eu não consigo olhar pra ele como antes e eu ainda tô muito confuso sobre isso. A última coisa que eu quero é discutir com você por causa do Lucca.

Oliver falou tudo isso de uma vez só, quase que sem pausas, sem nem respirar... Quando ele terminou respirou fundo e ficou pensativo por alguns segundos, e eu percebi o quanto foi difícil pra ele dizer aquilo em voz alta. Ele amava o irmão, mas essa dor, tudo isso que ele tava sentindo, era genuíno.

Eu não podia acreditar no que tinha acabado de ouvir. O Oliver estava mesmo com raiva do Lucca, e eu, como amiga dos dois, estava no meio disso. Não tinha como a minha situação ficar pior e eu só conseguia pensar no quanto eu poderia piorar isso quando encontrasse o Lucca. E se ele contasse pro Oliver? Mas quem eu tava querendo enganar? Eu também não podia ficar com o Oliver sem que ele soubesse a verdade. A sensação que eu tinha é que minha cabeça ia explodir, e eu não via nenhum jeito dessa história acabar bem.