Oito: Till It Hurts or Bleeds

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Hannibal poderia considerar a repentina aproximação com Will um tanto perigosa se fosse verdadeiramente honesto e não gostava de pensar na possibilidade de estar sendo enclausurado dentro de sua própria jaula. Ele costumeiramente afastava todos os tipos de afeto, mas de alguma maneira, sua obsessão e necessidade de moldar e manusear Will tornava-se algo mais a partir do momento em que ele se via ansioso esperando o próximo momento onde veriam um ao outro. Desde o maldito vinho embalado em um papel simplório que agora lhe servia como marca páginas e contaminava seus livros com o cheiro de loção pós barba barata e excessivamente impregnado, indicando que aquilo realmente fora feito manualmente por Will, até mesmo as consultas com Abigail. 

Will permanecia monossilábico, como sempre. Ansioso é claro pela evolução do quadro de sua filha e não era para menos, a agressividade com a qual o tumor se espalhava era algo que Hannibal evitava mencionar ao agente. Não buscava o apavorar ou até mesmo fazê-lo perder seu foco no trabalho, logo agora que surtiam efeitos de seus esforços. 

O agente, por outro lado, voltava ao hábito de seus pesadelos perturbadores. Não era uma novidade o fato de que simplesmente era de maneira constante assombrado pelos fantasmas de seu trabalho, mas aquilo era algo diferente e mais intenso, como se uma mensagem constante estivesse tentando se fazer clara, como se tudo aquilo fosse sua culpa, resultado de sua negligência em uma dança exigente com o assassino. Se ele se comportasse da maneira devida, aquilo passaria como um resfriado febril, outrora, haveria carnificina por todos os lados. 

Ele poderia confessar a si mesmo estar levemente ansioso com os exames que Abigail precisava fazer. Implicaria mais tempo ao lado de Hannibal Lecter e ele não saberia dizer se o médico havia ou não gostado do presente. Não era algo que costumava fazer, presentear pessoas além de Abigail, mas... Bem, ele era grato. Era a vida de sua menina que estava em jogo e diante de um homem ocupado ser tão solicito, ele precisava fazer o mínimo. Mas ficar ao lado do médico o deixava nervoso. Quase que com medo. 

O caso do totém não tivera progressos senão pelas vítimas sendo encontradas por suas famílias e com semanas sem nem mesmo um único crime que pudessem relacionar ao assassino, era de se esperar que ele estivesse satisfeito com o choque causado na equipe do FBI, ou talvez até mesmo com o estado psicológico em declínio de Will Graham. Mas Hannibal Lecter na verdade, estava apenas ocupado com a parte burocrática da cirurgia de Abigail. Era um procedimento caro, não que para ele fosse realmente relevante, mas custaria cerca de duas ou três vezes mais do que a propriedade simples de Will em Wolftrap. Ele não deixaria o agente ser informado, claro. 

Não era novidade que Lecter era um homem de posses. Dado as tragédias em sua infância e o rumo que sua vida eventualmente tomou, ele ainda assim, era um duque em seu país natal, a Lituânia. A propriedade que um dia fora seu lar, a qual ele se recusava retornar pelas fortes memórias que traziam sobre Mischa, sua falecida irmã mais nova, agora servia de atração cultural e ele estava mais do que satisfeito em apenas receber os extensivos depósitos. Além de que, claro, era um médico de renome e sua hora custava mais de um salário mínimo. Ele era seletivo com seus pacientes graças a suas inclinações pessoais, não gostava de colocar a si mesmo em risco e geralmente, atendia também em algumas ocasiões, tinha investimentos. Em suma, seus ternos de três peças eram um luxo de milhares de dólares que se permitia ter. 

Ao observar Abigail, imaginou como a jovem poderia aproveitar de suas conexões, frequentar uma boa faculdade e se tornar uma adulta minimamente decente com boas oportunidades. Ele não se importaria de prover para ela o que fosse necessário, ou para Will, mesmo que reconhecesse claramente fortes nuances de orgulho nele.

Naquela manhã, tinha se responsabilizado em pegá-los para os exames de Abigail. Will conseguiu o dia de folga, e ele ponderou se naquela situação, Jack Crawford estava se importando verdadeiramente com o bem estar de seu menino dos olhos ou se apenas desejava que sua filha se recuperasse em breve para que pudesse voltar a explorar a mente deturpada de Graham. De toda maneira, Hannibal sem sombra de dúvidas era crente pela segunda opção. 

State of Grace | HannigramOnde histórias criam vida. Descubra agora