Jab, jab, cruzado. Jab, jab, cruzado. Cruzado, cruzado, cruzado.
O suor escorria para os olhos de Marília, fazendo-os arder. Ela passou o antebraço no rosto antes de cerrar o punho e atingir de novo o saco de pancadas. Quando algum pensamento se infiltrava em sua mente, batia mais forte. Pensamentos demais, sentimentos demais.
Jab, esquiva, gancho. Jab, cruzado.
Seus braços queimavam. Era uma dor bem-vinda, que incinerava tudo dentro de sua cabeça. Não havia nada além da resistência pesada da areia dentro do saco e do grave impacto que provocava ondas de choque pelos braços e pernas.
Jab, jab, jab, cruzado, cruzado, cruzado. Mais forte. Será que conseguiria derrubar o saco de pancadas preso por correntes? Talvez. Cruzado, cruzado, cruzado, cruzado...
Batidas escandalosas na porta interromperam no meio de um soco, e ela olhou feio naquela direção. Sua irritação logo se transformou em receio. Poderia ser o senhorio querendo falar sobre o aluguel?
Jogando uma toalha sobre o pescoço, Maeil abriu a porta.
— E aí? — Henrique passou por ela, colocou um pacote com seis long necks na mesinha de centro e atirou a jaqueta de motoqueiro sobre o sofá. Sem se dar ao trabalho de olhar para Marília, foi até a cozinha e abriu a geladeira. — Tem alguma coisa para comer?
— Quem trabalha num restaurante é você — Marília respondeu, voltando aos socos.
O saco de pancadas ainda balançava por causa da sequência de golpes que tinha desferido. Marília o endireitou antes de cravar o punho outra vez no couro gasto. Enquanto atingia o equipamento, ouviu uma série de bipes de micro-ondas.
— Vou comer as sobras que encontrei aqui — Henrique avisou. Marília o ignorou e continuou batendo.
O micro-ondas apitou. Pouco depois, Henrique apareceu com uma tigela fumegante, sentou no sofá e começou a devorar o jantar de Marília. Fazendo bastante barulho.
Quando cansou de aturar aquilo, Marília parou de bater e falou: — A maioria das pessoas come na mesa da cozinha.
Henrique deu de ombros. — Prefiro o sofá. — Ele enfiou uma garfada de macarrão na boca e chupou os fios pendurados. Em seguida lançou um olhar para a prima como quem pergunta que foi?
Marília cerrou os dentes e tentou retomar o ritmo.
— Você anda puxando ferro? Seus braços estão maiores. Parece até que você tem uns pãezinhos escondidos aí, mulher.
Endireitando o saco de pancadas, Marília perguntou: — O que está fazendo aqui?
— Você vai se desculpar comigo ou não? Porque está sendo uma prima de merda. De verdade.
Marília fechou os olhos e soltou o ar com força. — Desculpa.
— Vou ter que pedir para você tentar de novo.
Ela se afastou do saco de pancadas e se jogou no sofá ao lado do primo.
— Desculpa mesmo. As coisas estão complicadas para mim e... — Marília apoiou os cotovelos nos joelhos e cobriu o rosto com as mãos enfaixadas. — Desculpa.
— Não entendo por que mentiu sobre ter namorada. 'Ninguém especial' o cacete. Está com medo de que ela não goste da família ou coisa do tipo? — Henrique perguntou com um risinho de deboche.
Marília teve que se segurar para não arrancar os cabelos. — Não quero falar sobre isso.
— Porra, Marília. — Henrique pôs a tigela na mesinha ao lado das cervejas e pegou a jaqueta. — Tô caindo fora então. — Ele foi até a porta e virou a maçaneta.
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Love Numbers | G!P
FanfictionMaraisa Pereira tem dificuldades de se relacionar com as pessoas, ela tem síndrome de Asperger e muitas vezes não consegue filtrar o que diz ou simplesmente 'trava'. É uma mulher sensível e odeia desorganização. Sendo econometrista, ama números e é...