Ravener

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A noite havia se tornado ainda mais quente e correr para casa soava como nadar o mais rápido possível em sopa fervente.

Na esquina de seu quarteirão, Taehyung ficou preso por um sinal vermelho para pedestres. Ele saltitou impacientemente enquanto o tráfego de carros passava em um borrão de faróis. Tentou ligar para casa outra vez, mas Jungkook não havia mentido, o telefone dele não era um telefone. Pelo menos não parecia com nenhum telefone que Taehyung já tivesse visto. Os botões do sensor não tinham números, só alguns daqueles símbolos estranhos, e não havia tela.

Correndo pela rua em direção à sua casa, ele viu que as janelas do segundo andar estavam acesas, o que, geralmente significava que sua mãe estava em casa. Tudo bem, ele disse a si mesma. Está tudo bem. Mas o estômago embrulhou assim que ele pisou na entrada. A luz do teto havia queimado e o saguão estava escuro. As sombras pareciam cheias de movimentos secretos. Tremendo, ele começou a subir.

— Aonde você pensa que vai? — disse uma voz.

Taehyung girou assustado.

— O que...

Ele parou no meio da frase. Seus olhos estavam se ajustando à pouca luz, e ele podia enxergar o formato de uma poltrona grande, na frente da porta fechada da casa de Madame Dorothea. A senhora estava encaixada nela, como uma almofada enorme. Com a falta de luz, Taehyung só pôde ver o formato redondo do rosto da mulher, o leque branco em sua mão, o buraco escuro da boca enquanto ela falava.

— Sua mãe — disse Dorothea — está fazendo um barulho horroroso ali em cima. O que ela está fazendo? Arrastando móveis?

— Acho que não...

— E a luz da escada queimou, você percebeu? — Dorothea passou o leque no braço da cadeira. — Será que sua mãe pode pedir para o namorado dela trocar?

— Jin não é...

— A claraboia também precisa ser lavada. Está imunda. Não é à toa que está tudo preto ali dentro.

Jin NÃO é o zelador, Taehyung queria dizer, mas não o fez. Isso era típico da vizinha mais velha. Quando ela conseguisse que Jin viesse trocar uma lâmpada, pediria para ele fazer centenas de outras coisas, carregar as compras e consertar o chuveiro.

Taehyung suspirou.

— Vou pedir.

— É bom mesmo. — Dorothea fechou o leque com um rápido movimento de pulso.

A sensação de que alguma coisa estava errada só aumentou ao chegar à porta do apartamento. Estava destrancada, entreaberta, deixando vazar um feixe de luz no chão. Com um sentimento crescente de pânico, ele empurrou a porta. Dentro do apartamento, as luzes estavam acesas, todas as lâmpadas, tudo completamente claro. O brilho agrediu seus olhos. As chaves e a bolsa cor-de-rosa da mãe estavam na prateleira moldada de metal ao lado da porta, onde ela sempre as deixava.

— Mãe? — gritou Taehyung. — Mãe, estou em casa.

Não houve resposta.

Ele foi até a sala. Ambas as janelas estavam abertas, metros de cortinas brancas e leves esvoaçavam com a brisa como fantasmas inquietos. Só quando o vento parou e as cortinas sossegaram ele conseguiu ver que as almofadas tinham sido arrancadas do sofá e espalhadas pela sala. Algumas estavam completamente rasgadas, com os forros de algodão transbordando para o chão. As estantes de livros haviam sido derrubadas. O banco do piano estava caído de lado, aberto como uma ferida, os amados livros de música de Dahyun, jogados para fora.

Ainda mais aterrorizantes eram as pinturas. Todas elas haviam sido cortadas da moldura e rasgadas em tiras, que estavam espalhadas pelo chão. O trabalho deveria ter sido feito com uma faca, a lona da tela era quase impossível de rasgar simplesmente usando as mãos. As molduras vazias pareciam ossos limpos.

Shadowhunters: City of Bones | TaekookOnde histórias criam vida. Descubra agora