O Cálice Mortal

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Taehyung abaixou o caderno lentamente para seu colo. Namjoon tinha razão, era um belo desenho de Jungkook. Ele havia conseguido retratar a linha rígida de sua boca, aqueles olhos estranhamente vulneráveis. As asas pareciam tão reais que imaginou que, se passasse os dedos nelas, seriam macias. Ele deixou a mão passar pela página, com a mente vagando.

Seus dedos tocaram não a página seca. Taehyung olhou para os símbolos que havia desenhado no canto da folha. Estavam brilhando, do jeito que ele viu brilharem os símbolos que Jungkook desenhava com a estela. O coração de Taehyung começou a bater acelerado, firme e rígido. Se um símbolo podia dar vida a um desenho, então talvez...

Sem tirar os olhos do desenho, ele procurou os lápis. Sem fôlego, passou as folhas, procurando uma página nova, limpa, e apressadamente começou a desenhar a primeira coisa que veio à sua mente. Foi a xícara de café repousada na cabeceira ao lado da cama. Acessando as lembranças das aulas de desenho de natureza-morta, Taehyung desenhou nos mínimos detalhes: a aba borrada, a rachadura na alça.

Quando terminou, a figura era tão precisa quanto ele podia fazer. Guiado por alguma espécie de instinto que ele não conseguia entender muito bem, Taehyung pegou a xícara e colocou-a sobre o papel. Depois, cuidadosamente, começou a desenhar os símbolos ao lado dela.

Jungkook estava deitado na cama fingindo dormir — para não falar com ninguém — quando as batidas na porta finalmente se tornaram demais, ele se arrastou para fora da cama, franzindo o rosto. Por mais que tivesse fingido que estava tudo bem na estufa, ainda tinha dores no corpo inteiro por tudo que havia sofrido na noite anterior.

Ele sabia quem era antes de abrir a porta. Talvez Namjoon tivesse conseguido se transformar em um rato outra vez. Dessa vez, podia continuar um maldito rato pelo resto da vida, porque ele, Jeon Jungkook Wayland, não ia fazer nada a respeito.

Taehyung trazia o caderno de desenho, os cabelos brilhantes escapando do elástico. Jungkook se apoiou na porta, ignorando a onda de adrenalina produzida ao vê-lo. Ele imaginou o porquê, e não foi a primeira vez. Jimin utilizava a beleza como utilizava o chicote, mas Taehyung não fazia a menor ideia de que era lindo. Talvez fosse por isso.

Jungkook só podia pensar em uma razão para Taehyung estar lá, embora não fizesse o menor sentido depois do que disse a ele. Palavras são como armas, seu pai lhe ensinou, e ele quis machucar Taehyung mais do que jamais havia desejado machucar uma pessoa. Em geral, Jungkook apenas queria as pessoas, e depois queria que o deixassem sozinho.

— Não diga — Jungkook disse, proferindo as palavras daquele jeito que ele sabia que Taehyung detestava. — Namjoon se transformou em uma jaguatirica e você quer que eu faça alguma coisa a respeito antes que Jimin o transforme em um casaco de pelo. Bem, você vai ter que esperar até amanhã. Estou fora de expediente. — Ele apontou para o pijama azul com um buraco na manga que estava usando. — Veja. Pijama.

Taehyung parecia mal tê-lo escutado.

— Jungkook — Taehyung disse. — É importante!

— Não me diga — Jungkook respondeu. — Você está com uma emergência artística. Precisa de um modelo nu. Na verdade, não estou a fim. Você pode pedir para Hodge — acrescentou, como uma ideia que tivesse ocorrido depois. — Ouvi dizer que ele faz qualquer coisa por...

— JUNGKOOK! — Taehyung interrompeu, com a voz se elevando a um grito. — Quer calar a boca por um segundo e ouvir, por favor?

Jungkook piscou.

Taehyung respirou fundo e olhou para ele, a expressão cheia de incerteza. Um impulso estranho surgiu nele: o impulso de colocar os braços em volta dele e dizer que estava tudo bem. Não o fez. Pela sua experiência, as coisas raramente estavam bem.

Shadowhunters: City of Bones | TaekookOnde histórias criam vida. Descubra agora