"O que foi que eu fiz?..." Era a única coisa que se passava na minha cabeça. Como eu pude machucá-lo tanto? Ele deve me odiar, tem motivos pra isso, e eu não o culpo. Que droga, eu só sei lamentar, só sei chorar pelo que faço, é patético; Me pergunto o que meu pai pensaria de mim se me visse nessa situação tão deplorável.
E eu me desculparia, pediria perdão mil vezes a Sal se eu pensasse que adiantaria de algo. Mas eu sei que foi demais, fui muito cruel. E não existe desculpa no mundo que resolveria isso.
Estava meio perdido em meus pensamentos, até que estremeço quando ouço passos pelo banheiro.— Olá?
Ah, não... Ele não, por favor...
Tentei não fazer barulho, na esperança de que ele fosse embora.— Travis, sei que está aí — Ah, merda.
— ... O que quer, Sally Face?
— Encontrei um bilhete no chão, é seu? — Disse ele, baixo e calmo.
Por um momento, meu corpo pareceu desaprender a respirar. Por que eu tinha que ferrar tanto as coisas? Pra quê que eu escrevi aquele bilhete maldito?
— Não sei sobre o que está dizendo — Minto.
— Nah, você sabe. Eu conheço sua letra, já fizemos um trabalho juntos antes, lembra? Você quem escreveu — Falou, passando o pedaço de papel amassado por debaixo da porta de onde eu estava.
"Eu sei que não nos conhecemos de verdade e que você provavelmente tem suas opiniões sobre mim. Achei que talvez se eu te contasse como me sinto, as coisas poderiam ser diferentes.
A verdade é que não consigo parar de pensar em você. Eu sou louco por você. Eu te acho incrível! Mas sei que esses sentimentos que tenho são errados; não é assim que um garoto deveria se sentir. Meu corpo transborda vergonha. Meu pai me mataria se soubesse, mas não posso viver na sombra dele para sempre."
— Quer chegar onde com isso? — Eu estava farto, já não bastava eu ter feito mal a ele, e ele ainda descobre esse meu segredo? E que segredo horrível... Deus, porque me punes? Bem, eu sei por quê...
— Lugar nenhum, eu só... — Ele parou de falar de repente, como se tivesse repensado o que ia dizer — Deve ser pesado guardar tudo isso pra si; Seu pai é ruim com você, não é? Ele deve ser bem rígido...
— Você nem imagina — Digo, dando uma curta risada cansada.
— Sinto muito...
— Não preciso da sua misericórdia, Sally Face.
Ouvi um som na porta, logo vendo suas pernas pelo espaço entre a porta e o chão. Ele estava sentado bem ao lado da porta da cabine, escorado.
O lugar ficou submerso em um silêncio tortuoso. Acho que foi uma das poucas vezes que tive um contato mais ou menos normal com ele, algo pelo menos civilizado. E eu queria tanto isso, eu poderia falar com ele todos os dias, mas sei que não devo, que não posso. Meu pai me odiaria por isso, Deus me odiaria.— Sabe que não precisa ser assim, não é?
— Está falando do quê?
— De nós. Não precisamos ser "inimigos", Travis.
E ele ainda quer ter uma amizade? Esse garoto é maluco? Ninguém é tão bondoso assim.
— ... Por que está sendo legal comigo?
— Eu não acredito que você seja uma pessoa ruim, Travis.
Ri de seu comentário, como se sua fala tivesse sido a maior idiotice já dita, e que eu não me importava nem um pouco. Mas era tudo mentira.
Não consegui me segurar, me pus a chorar de novo. Como ele podia ser assim? E assim com alguém como eu, ainda por cima. Dei o meu máximo para disfarçar, a última coisa que eu queria era que ele ouvisse meus soluços, mas acabei deixando um ruído ou outro escapar... Que vergonhoso, garotos não deveriam chorar, não deveriam ser tão frágeis e ridículos como estou sendo agora.— Travis, tudo bem... — Vi ele passar a mão por debaixo da porta, parecendo oferecer ela para mim. Não fiz nada sobre isso. — Podemos ser amigos, se quiser.
— Eu te fiz mal.
— Eu posso te perdoar por isso.
— Hah, nem eu me perdoaria...
— Bom, acho que não somos muito parecidos, então — Disse o azulado, enquanto estendia ainda mais a mão em minha direção. Eu a peguei, em desistência.
— Pretende contar a pessoa? Sobre o bilhete?
— O que? De jeito nenhum!
— Por quê?! Não acho que seja má idéia! — Opinou, com um tom animado em sua voz.
— Eu não posso ser assim.
— E por quê não? — Ele insiste.
— ... Adora fazer perguntas, ein?
— Por que sente tanta vergonha disso?
— E como não sentiria? Eu sei o quão errado isso é, e não tenho tanta sorte como você e seus amiguinhos viadinhos que podem fazer o que quiserem da vida. Existem regras, ok? E eu devo seguí-las.
— E quem é que definiu a porra das regras? Não existem "regras", Travis... Quer dizer, pelo menos não como essas. Não é errado ter sentimentos, é meio que algo básico.
— ... Meu pai me ensinou-
— Mande-o ir pro inferno. As regras dele não são as minhas, e também não precisam ser as suas — Ele segurou minha mão mais forte — Você não deve se culpar por isso, tudo bem? É normal.
— Hum. Não sei por qual motivo está falando essas coisas, mas espero que não seja nenhuma merda.
— Você é bem desconfiado, não?
— E não ouse contar pra ninguém sobre qualquer coisa que aconteceu aqui agora — Continuei, contornando a pergunta dele. É claro que sou desconfiado, como não seria? — Por favor...
— Eu não vou, não sou assim — Jurou, aos poucos se afastando de mim e se levantando do chão do banheiro.
Ouvi o som do caminhar dele, mas senti que deveria falar algo antes que fosse embora. Abri a porta da cabine para dizer isso frente a frente.
— Aí, Sally- É... Sal — Não é uma boa hora pra se usar apelidos, eu acredito.
— Hum?
— Me desculpe, pelo soco... — Será que tinha doído muito? Ó Deus, eu espero que não — Eu não vou mais te perturbar, nem ao seus amigos. Diga a Ashley que pedi desculpas por tê-la xingado; sinto que deveria dizer isso eu mesmo a ela, mas duvido que ela queira me ver agora.
— Ah- — Ele ficou sem reação? — Não, tudo bem, eu estou bem. E vou falar com a Ashley sim. Obrigado.
— Está agradecendo pelo quê?
— Por ter pedido desculpas e estar se tornando alguém decente?
— Mas isso não é o mínimo? — Com esse comentário, ouvi ele rir baixinho. Eu fiz ele rir? Eu fiz ele rir!
— Beleza, Travis. Tchau. E eu quero te ver conosco amanhã — O vi saindo do banheiro, sem dar muita explicação.
— "Conosco"? — Repeti para mim mesmo, tentando entender — Espera aí! "Conosco" quem??
Ele já tinha ido embora pra sabe se lá onde.
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blue eyes like the devils water
FanfictionApós incontáveis erros, Travis está disposto a se redimir com Sal Fisher, constante alvo de seu bullying. Estaria Sally convencido da mudança de Travis? É capaz de desculpa-lo? _._._._._._._._._._._._._._._._._. Esta estória será feita com capítulo...