Capítulo 01 - It's My Life

284 21 3
                                    

01 de Janeiro de 2030
Reino Unido - Cambridge

Freen acordou mais cedo do que pretendia naquele feriado, o seu despertador programado para o horário de aulas fez ir por água abaixo a sua promessa de dormir até mais tarde no feriado. Ainda que pretendesse revisar o seu projeto mais recente naquela manhã, teria o dia todo para isso, os computadores da universidade ainda estariam lá quando ela chegasse. Desligou o aparelho de som irritante e se cobriu até a cabeça com os dois grossos cobertores de poliéster, mesmo sabendo que aquilo não lhe devolveria o sono perdido.

Do outro lado da janela a neve caía grossa sob os telhados simétricos das residências e ela esperou dois minutos para finalmente esticar as pernas para fora da cama. Além das meias e pijama aveludado, o aquecedor fazia bem o seu trabalho de mantê-la quente nessa manhã, esse era o seu aconchego todos os dias, já que os sete anos de residência no país não foram suficientes para fazer a jovem tailandesa se acostumar com o clima. Após escolher a sua roupa mais quente e um cachecol estiloso, ela pedala para longe do seu apartamento, rumo à sua segunda casa.

Já do lado de fora, as ruas estão enfeitadas de crianças e suas guerras de neve, enquanto o campus está silencioso como uma câmara anecóica e isso é justamente o que Freen precisa para se concentrar. Os computadores já estão ligados quando ela chega no laboratório cedido pela universidade e todos eles captam ondas de rádio vindos do espaço através do telescópio Lovell, que fica em Macclesfield. O seu tópico de pesquisa são rajadas rápidas de rádio, mas um som diferente rouba a sua atenção: o seu celular vibrando. Ela tira o casaco aproveitando a sala aquecida e atende o aparelho, que o mostra o nome "Heng" na tela. Ela põe no viva voz.

Segundo a lei inglesa, é proibido negar convites de amigos no primeiro dia do ano. — ele começa e a mulher sorri — Vamos ao The Lab hoje.

— Por que faríamos isso?

Precisamos comemorar o início do ano, Freen. — ele argumenta — Você já aproveitou a sua própria companhia o suficiente ontem à noite, hoje eu quero curtir um pouco a minha amiga.

A garota sorri e pensa por alguns segundos. Heng é o seu melhor amigo desde que chegou à Inglaterra, eram os únicos tailandeses na graduação de Engenharia e isso os aproximou de forma extraordinária, ela nunca precisou esconder nada sobre si com o amigo. A sua cultura, o seu idioma, os seus gostos, as suas caretas, os seus receios. Tudo sempre pareceu muito natural com ele, Heng é o seu lugar seguro longe de casa.

— Tá, me convenceu. Você pode passar na universidade às 18h?

Você está na universidade?! — o rapaz levanta a voz incrédulo — Eu não acredito que você está na universidade no feriado, Sarocha. Eu estou indo até aí te tirar do magnetismo estranho que você tem com esse lugar.

Freen não escuta metade da frase do amigo, porque algo chama a sua atenção na tela do computador principal. Em meio aos terabytes de dados coletados de três dias atrás do telescópio Lovell, há um sinal muito específico, algo que difere do seu tópico de pesquisa e varia de um modo muito estranho, parece muito com uma onda de rádio modulada em torno da frequência da linha do hidrogênio, com a duração de 1.696 segundos.

Freen?

Mais uma vez a voz de Heng se perde em meio aos ruídos dos computadores. A mulher busca na gaveta uma caneta e papel para anotar a contagem, cada pedaço tem um número específico de picos modulados.

— Dois, três, cinco, sete, onze, treze, dezessete, cento e noventa e três... — Freen repete para si mesma. Não foi difícil escrever um programa para determinar que o sinal de 30 minutos contava todos os números primos até aproximadamente 2.000. Esse sinal não se encaixa em nenhuma explicação natural e nem pode ser facilmente explicado como um erro do detector, nada podia explicar isso, salvo talvez uma hipótese, mas nem mesmo ela se arriscaria a dizer.

O que acontece depois?Onde histórias criam vida. Descubra agora