VII - SONHOS INCOMPLETOS

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Adorais o que não conheceis

Nós adoramos o que conhecemos


           Eu estava em pé, meu corpo envolto por um vestido lilás e leve, e podia sentir que meu coração estava em paz. Não conseguia identificar onde estava, mas essa falta de conhecimento não me preocupava. Eu sabia que havia um propósito em ir até ali, que pessoas precisavam de mim. Caminhei de um lado para o outro, absorvendo a serenidade do lugar, até avistar alguém de costas. Não conseguia discernir se era homem ou mulher, pois estava envolto em um manto que cobria sua cabeça. Um respeito profundo me impediu de me aproximar, como se eu não merecesse tal honra.

           "Você consegue ouvir o vento?", a voz ecoou em minha mente como um sussurro reconfortante, fazendo-me estremecer não de medo, mas de alívio.

           "O que faço aqui?", questionei, buscando entender o propósito da minha presença.

           "Faça com que despertem", respondeu a pessoa misteriosa, erguendo o dedo indicador em direção ao lado, a mão enluvada.

           Sem hesitar, obedeci às palavras e segui na direção indicada. Ao erguer os olhos, deparei-me com um grande campo de batalha estendendo-se diante de mim. Um exército começava a se erguer do chão, uma visão impressionante de determinação e força. As fileiras de soldados estavam vestidas com armaduras reluzentes, refletindo a luz do sol que banhava o campo de batalha. Eles estavam alinhados em perfeita ordem. Pensei que se prostrariam diante de mim, mas todos se inclinavam na direção da figura misteriosa. E, desta vez, também fiz o mesmo, reconhecendo a autoridade.

           O fato de acordar e ainda sentir que algo faltava em mim me fazia ficar confusa, havia um sentimento pulsante de que algo não estava certo, porém eu já me conhecia o suficiente para saber que me sentira assim a vida toda: como se não pertencesse ao lugar onde estava e buscava me encaixar ao local. Em alguns momentos eu olhava ao redor, tentando encontrar alguém com quem eu realmente me identificasse, mas era em vão, sempre havia somente Celine e sua turma, e eu ali, sem saber se gostava das pessoas ao meu redor ou não, apenas ali. 

           Sentei na cama abraçando minhas pernas, quando fechei os olhos lembrei de meus pais, pensei no que poderiam estar fazendo, se havia outra filha em meu lugar ou se haviam se tornado um casal sem filhos. Com certeza, melhores sem mim, eu tinha medo de que, apesar de terem me perdoado, eu voltasse a magoá-los, e isso eu faria quando descobrisse que eu repetiria o semestre da faculdade, influenciada por Celine que queria companhia, pois também repetiria. Era incrível o quanto agora eu conseguia ver o quanto eu era facilmente influenciável e tudo por minha culpa.

           Mas isso havia acabado. Como dona da minha própria vida e de minhas próprias escolhas, jamais deixaria algo assim acontecer novamente. O sonho me fez refletir sobre qual era o meu lugar, diferente do outro quem se curvava era eu, seria um vislumbre de que eu estava seguindo a pessoa certa? Ninguém havia me contado quem era o tal mestre, então eu ainda não entendia bem o que significava servi-lo.

           Levantei-me da cama, ainda sentindo uma certa vertigem, recordando da dor intensa que havia percorrido meu coração no exato momento em que meu sangue tocara o pergaminho. A fraqueza que me acometeu fez com que minha mente ficasse turva, levando-me a sentar novamente na cama. Respirei profundamente, tentando recobrar minhas forças, e me esforcei para levantar novamente, avançando lentamente em direção à mesa à minha frente. Sobre ela, repousavam um copo de suco e um bilhete. Ao ler o conteúdo, percebi que dizia:

"Pela noite você será apresentada formalmente aos outros vulpes. Está indo muito bem, nervosinha."

           Reconheci imediatamente o apelido e soube que fora Ian quem o escrevera. Um sorriso involuntário surgiu em meus lábios, fruto da familiaridade e do apoio velado contido naquelas palavras. O bilhete, apesar de simples, carregava uma mensagem encorajadora, lembrando-me da importância do que estava por vir e do meu progresso até aquele momento. Consciente da relevância do evento noturno, onde seria apresentada aos outros vulpes, senti uma mistura de nervosismo e antecipação. Eu havia chegado até aqui e iria até o final.

DESPERTOS - A ESCOLHAOnde histórias criam vida. Descubra agora