Capítulo 2

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1985

Era meu aniversário, faziam dois anos que eu estava fazendo aulas de teatro e testes para comerciais de televisão mas até aquele momento eu não havia passado em nenhum. Eu estava completando doze anos naquela tarde, minhas irmãs estavam com quatro anos, ou seja, já estavam com a idade de participar dos meus teatrinhos.

- Baba, eu não quero. - Minha irmã mais nova, Audrey, bufou enquanto cruzava os braços.

- Por favor Bibi, a Cynie vai atuar com você. - Implorei.

Cynie era o apelido que havia dado para minha irmã do meio, Nancy. Audrey e Nancy eram gêmeas idênticas, só não as confundia por causa dos cabelos. Baba sempre usava cabelos compridos e Nancy sempre usava os cabelos curtos, mas tirando essa diferença e a personalidade de cada uma, as duas eram idênticas.

- Não quero. - Audrey sentou no meio do quintal.

Estava no meio da minha festa de aniversário, todos os meus amigos estavam ali mas eu queria mesmo atuar com as minhas irmãs.

Eu e minhas irmãs sempre fomos unidas, mesmo brigando, nós três sempre encontrávamos um jeito de fazer a vontade de todas.

Olhei para mamãe falando ao telefone na sala de casa, eu conseguia vê-la por causa da porta de vidro que separava o quintal de onde ela estava. Ela sorria e olhava para o papai, não entendi o que eles estavam conversando mas ao vê-la me chamar com o maior sorriso do mundo eu sabia que era algo bom.

Corri até mamãe que segurou as minhas mãos, papai estava atrás dela segurando seus ombros. Papai sempre deu apoio a ela, não importava no que.

- Nós recebemos uma ligação muito legal. - Senti as mãos quentes dela acariciarem as minhas - A sua agente, Daniele, ligou nos dizendo que o seu teste foi aceito para uma participação para um comercial de cereais! Isso não é incrível?

O meu segundo trabalho como atriz foi em um comercial de cereais famoso em Pasadena. Você deve estar se perguntando como aquele pode ser o meu segundo trabalho, mas eu vou te explicar. Papai me colocou em todos os comerciais da "Young's" a maior rede de lojas de carros usados e mecânicas dos Estados Unidos da América.

O comercial começava comigo e com um ator que definitivamente não era o meu pai, papai nunca foi bom em atuar. Estávamos do lado de fora da loja principal, a maior de Pasadena, eu olhava para o meu "pai" andando pelos carros a venda. "Meu pai sempre compra os carros na Young's. Comprou para a mamãe, para ele, para o meu irmão mais velho e até para a tia Margaret! Todos eles tem desconto na mecânica Young's mostrando esse cartãozinho aqui, pagam pouco para um atendimento super maneiro. Espero um dia comprar um carro na Young's! Porque aqui o preço é baixo mas a qualidade... a qualidade é de outro mundo!" Era o que eu falava olhando para a câmera, esse comercial rodou o país todo, só estava esperando a ligação certa.

Aquele comercial de cereais ia mudar a minha vida, eu sentia isso desde que mamãe anunciou a ligação de Daniele.
Eu não via a hora de começar.

Semanas depois eu estava no estúdio com a minha mamãe, olhava para os lados esperando a minha vez de gravar. Sentia as mãos da mamãe em meus ombros como sempre fazia para me deixar segura.

- Harper Young, a senhorita é a próxima! - O diretor chamou-me.

Lembro muito bem de mamãe se agachar na minha frente com aquele sorriso que só ela tem, segurar os meus ombros e sussurrar bem baixinho:

- Você é a melhor atriz desse mundo! Do meu coração para o seu...

- Namaste. - Sussurrei com um sorriso no rosto, confiante porque eu tinha a minha mãe ali comigo.

E eu fui fazer o comercial, foi mágico a forma que eu falei aquele texto sem errar uma vez, a forma que as minhas aulas de teatro tinham feito efeito.

O diretor se aproximou de mim e de mamãe com um sorriso no rosto, tinha a minha foto com o meu número de telefone atrás.

- Senhora Young, a sua filha tem um talento único que não se vê muito por aí. - Cruzou o braços - Consegue levá-la para Los Angeles para um teste?

- Consigo. - Nem que fizesse o impossível, mamãe ia arranjar um jeito para me levar para Los Angeles.

- Ótimo. O teste será para uma série que estão produzindo, se chama "A Família Benson". - Aquela série seria uma das mais aclamadas nos próximos anos - Será maravilhoso se Harper mostrar seu talento.

- Claro senhor. - Mamãe permanecia neutra.

- Então pedirei para minha assistente ligar para a senhora e assim marcarmos o teste.

Eu não me lembro muito bem do teste, mas me lembro que minha madrinha, tia Mary, estava lá comigo. Ela foi de Chicago até Los Angeles por mim.

Eu passei.

Eu e tia Mary nos enchemos de sorvete no quarto de hotel que papai tinha pego para nós duas. Papai sempre pegou os melhores quartos, ele nunca economizou dinheiro com nenhuma das suas meninas. Quando digo suas meninas isso inclui a minha madrinha também.

- Então está animada para vir para Los Angeles nos finais de semana para a gravação da série? - Tia Mary perguntou colocando a colher de metal dentro do pote.

- Estou bastante. - Sorri copiando a ação dela - Sabe tia Mary, acho que eu vou ser uma grande atriz igual você disse.

- Eu tenho certeza disso HarHar. - Ela deixou nossos potes encima da mesinha de cabeceira - Sabe, uma pena eu não poder vir com você todos os finais de semana. Eu queria tanto te acompanhar nessa nova fase da sua vida, filha.

Tia Mary sempre me chamava de filha, mamãe e papai não se incomodavam. Tia Mary e seu marido, tio Luke, não podiam ter filhos.

- Madrinha, vem morar comigo. - Me aconcheguei em seus braços - A mamãe ia ficar tão feliz de voltar a morar com você.

- Como eu gostaria, mas não posso pequena. - Beijou minha cabeça antes de começar a acariciar-me - Eu tenho o meu marido, a minha casa, o meu trabalho. Mas eu te prometo que sempre que eu puder, vou estar bem caladinha de você. Lembra do que a sua mãe prometeu no dia em que você nasceu?

Elas nunca me deixavam esquecer.

- Que vocês sempre cuidariam de mim. - Mas que agora a Nancy e a Audrey entram no acordo também.

A risada da minha madrinha sempre foi marcante, escuta-la rir sempre me fez bem.

- Isso ai, HarHar. Você tem uma família que te ama muito e da mesma forma que eu protejo a sua mãe, eu vou proteger você e suas irmãs. - Sorriu - E o seu pai também.

- Você gosta do papai né tia Mary?

- O seu pai é o homem de coração mais bonito que eu já conheci. - Suspirou - Quando ele e Jane começaram a namorar eu entendi o que era amor de verdade, porque a sua mãe tinha sofrido muita coisa antes dele.

- Me conta, tia Mary?

- Quando você estiver mais velha, eu te conto.

Tia Mary nunca me contou. Mas eu descobri.

A Misteriosa Vida de Harper YoungOnde histórias criam vida. Descubra agora