Simone TebetNa manhã seguinte, Soraya usou a faca para aparar as extremidades de dois grandes galhos, deixando-os
com as pontas afiadas.— Pronta para caçar alguns peixes com um arpão? — perguntou ela
— Com certeza.
Quando chegamos à beira da água, ela se ajoelhou e pegou algo.
— Isso deve ser seu — disse ela, me entregando uma sapatilha azul-escura.
— É, sim. — Olhei para a água. — Talvez a outra apareça.
Entramos na água, com a profundidade até os quadris. O calor não estava tão insuportável de manhã, por isso, usei a blusa tamanho grande que a Soraya me deu em vez de ficar só de calcinha e sutiã. A barra da blusa encharcou de água como uma esponja e grudou nas minhas coxas.
Durante mais de uma hora tentamos sem sucesso caçar um peixe com o arpão improvisado. Pequenos e rápidos, eles se dispersaram assim que fazíamos qualquer tipo de movimento.
— Você acha que teríamos mais sorte se fôssemos mais para o fundo? — perguntei.
— Não sei. Os peixes provavelmente são maiores, mas deve ser mais difícil usar o arpão – Foi então que notei alguma coisa boiando.
— O que é aquilo, Sol? — Protegi os olhos com as mãos.
— Onde?
— Bem à frente. Você está vendo algo que afunda e vem à tona? — Apontei.
Soraya semicerrou os olhos por causa da distância — Ai, merda. Não olhe, Simone!
Tarde demais.
Logo depois de ela me dizer para não olhar, entendi. Larguei meu arpão e vomitei na água.
— Ele vai ser carregado pelo mar até aqui, então vamos voltar para a praia — disse ela.
Eu a segui para fora da água. Quando chegamos à areia, vomitei novamente.
— Ele já está aqui? — perguntei, enxugando a boca com as costas da mão.
— Quase.
— O que vamos fazer? – A voz dela soava trêmula e incerta.
— Vamos ter que enterrar o corpo em algum lugar. Poderíamos usar um dos nossos cobertores, a não ser que você se oponha.
Por mais que eu odiasse abrir mão de uma das nossas posses, enrolá-lo em um cobertor parecia o mais respeitoso a fazer. E se eu fosse honesta comigo mesma, sabia que não conseguiria tocar o corpo
dele sem alguma proteção.— Vou pegar — falei, agradecida por ter uma desculpa para não estar lá quando o cadáver chegasse.
Quando retornei com o cobertor, entreguei-o a Soraya,empurrando com os pés, rolamos o corpo para cima do cobertor. O cheiro de decomposição, de carne saturada de água, invadiu meu nariz, e enterrei meu rosto na parte interna do braço.
— Não podemos enterrar na praia — falei.
Soraya negou com um gesto de cabeça— Não.
Escolhemos um lugar embaixo de uma árvore, bem longe da cabana, e começamos a cavar na terra macia com nossas mãos.
— Está grande o suficiente? — perguntou ela olhando para o buraco.
— Acho que sim.
Soraya esperou passar as ânsias de vômito que me acometeram, depois, agarrei uma ponta do cobertor e a ajudei a arrastar Rodolfo para a cova e colocá-lo no buraco. Nós o cobrimos com terra e
ficamos de pé. Lágrimas silenciosas rolavam pelo meu rosto.— Ele já estava morto quando atingimos a água — falei, com firmeza, como uma declaração.
— Estava — concordou ela.
E então começou a chover. Voltamos para o bote e nos arrastamos para dentro. A cobertura nos deixava secas, mas eu tremia. Puxei o cobertor — que agora dividimos — para nos cobrir e dormimos.
Quando acordamos, Soraya e eu pegamos fruta-pão e cocos. Nenhuma de nós falou muito.
— Toma. — Ela me entregou um pedaço de coco – Afastei sua mão.
— Não, não consigo. Coma você!
Meu estômago revirava. Eu nunca tiraria a imagem de Rodolfo da cabeça.
— Seu estômago ainda não está legal?
— Não.
— Tente tomar um pouco de água de coco — sugeriu ela, passando para mim. Levantei o recipiente de plástico e tomei um gole.
— Desceu bem? – Fiz que sim com a cabeça.
— Talvez eu fique com isso por pouco tempo.
— Vou pegar lenha.
— Tudo bem. Ela só havia se afastado por alguns minutos quando senti o gotejar.
Ah, meu Deus, não.
Esperando ser um alarme falso, andei na direção oposta de onde Soraya foi e baixei minha calça.
Lá estava, no fundo da minha calcinha branca de algodão, a prova de que eu havia acabado de ficar menstruada. Corri para a nossa cabana tosca e peguei minha camiseta de manga comprida. De volta à floresta, rasguei uma tira, enrolei e coloquei na minha calcinha.
Preciso que esse dia horroroso acabe.
Quando o sol se pôs, os mosquitos fizeram um banquete nos meus braços.
— Você deve ter decidido que ficar fresca era melhor do que levar algumas mordidas — disse ela quando notou que eu estava batendo nos mosquitos.
Soraya havia colocado o casaco e o jeans assim que os insetos apareceram. Pensei na minha camiseta de manga comprida, escondida embaixo de um arbusto que eu esperava conseguir encontrar novamente.
— É, tipo isso.
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Simoraya - Na Ilha
FanficSimone Tebet é uma professora de inglês de 35 anos desesperada por aventura. Cansada do inverno rigoroso de Chicago e de seu relacionamento que não evolui, ela agarra a oportunidade de passar o verão em uma ilha tropical dando aulas particulares par...