Soraya ThronickeUma das coisas mais difíceis de enfrentar na ilha era o tédio. Levava tempo juntar comida e lenha, além de pescar duas ou três vezes por dia; ainda assim, tínhamos muitas horas ociosas. Explorávamos
a ilha e nadávamos, mas também conversávamos. E não demorou muito para eu me sentir quase tão à vontade com a Simone quanto ficava com os meus amigos. Ela realmente ouvia o que eu dizia.Simone perguntou como eu estava me sentindo emocionalmente. Confessei para ela que sentia uma sensação estranha no estômago toda vez que me indagava se algum dia seríamos encontradas. Contei que às vezes eu ficava com medo e que nem sempre dormia bem. Ela me disse que acontecia o mesmo com ela.
Eu gostava de dividir a cama com a Sisa. Às vezes ela se encolhia pertinho de mim, com a cabeça no meu ombro, e uma vez, quando eu estava dormindo de lado, ela pressionou o peito contra as minhas costas e encaixou os joelhos no espaço atrás dos meus. Fez isso dormindo, e não significou nada, mas foi uma sensação boa. Eu nunca tinha passado uma noite inteira com alguém antes.
Eu gostava dela. Muito. Sem ela, realmente a ilha teria sido um saco.
•🏖️☀️•
Ninguém nos resgatou; por isso, perdi minha consulta de revisão com o oncologista no final de agosto. Simone mencionou isso no café da manhã, um dia.
— Estou preocupada por você não ter ido ao médico — disse ela, me passando um pedaço de peixe cozido. — Cuidado, está quente.
— Estou bem — falei, soprando o pedaço de peixe para esfriá-lo um pouco antes de colocar tudo na boca.
— Sim, mas você esteve bastante doente, não foi?
— Foi.
Ela me passou a garrafa de água. Tomei um gole e baixei a garrafa.
— Conte como foi — pediu ela
— Minha mãe achou que eu estivesse gripada. Eu estava com febre e comecei a suar de noite. Perdi muito peso. Então, o médico descobriu um caroço no meu pescoço, e ficamos sabendo que era um nódulo linfático inchado. Fizeram alguns exames depois disso: radiografias, biópsia, ressonância magnética e uma tomografia por emissão de pósitrons, que eles chamam de PET. Aí me disseram que eu tinha um linfoma de Hodgkin de estágio três.
— Você começou a quimioterapia logo?
— Comecei. Mas não funcionou. Também encontraram uma massa no meu peito, e então também passei por sessões de radioterapia.
— Parece horrível.
Ela cortou um pedaço de fruta-pão e me deu o resto.
— É, não foi divertido. Eu entrava e saía do hospital o tempo todo.
— Você ficou doente durante quanto tempo?
— Mais ou menos um ano e meio, acho. Durante um tempo, não fiquei bem. Os médicos não sabiam o que pensar.
— Deve ter sido bastante assustador, Sory.
— Na verdade, eles tentaram esconder o que estava realmente acontecendo, o que eu detestava. Eu só sabia que estava mal porque de repente ninguém me olhava direto nos olhos quando eu fazia
as perguntas. Ou mudavam de assunto. Isso, sim, me dava medo.— Aposto que sim.
— No começo, meus amigos me visitavam o tempo todo, mas, como não melhorei, alguns pararam de aparecer. — Bebi outro gole de água e devolvi a garrafa para a ela
— Sabe a minha amiga Vanda?
— Sei.
— Ela vinha todo santo dia. Passava horas vendo televisão comigo, ou apenas ficava lá, sentada em uma cadeira perto da minha cama no hospital, quando eu me sentia mal demais para me mexer ou falar. Meus pais e o médico costumavam ter umas conversas demoradas, no saguão ou em qualquer outro lugar, e eu pedia para ela tentar escutar. Ela me contava tudo o que eles conversavam, por pior que fosse. Ela sabia que eu queria ouvir a história toda, sem rodeios, sabe?
— Claro — concordou ela. — Ela parece um ótima amiga!
— E ela é, mesmo. Você tem uma melhor amiga?
— Tenho, Marina. Nós nos conhecemos desde o jardim de infância.
— É muito tempo – Ela concordou— Os amigos são importantes. Entendo por que você queria passar o verão com eles.
— É — falei, pensando sobre todo o pessoal em Chicago. Eles devem estar pensando que morri.
Simone se levantou e se aproximou da pilha de lenha — Você vai me contar se notar algum sintoma?
Ela apanhou um tanto de lenha e jogou no fogo.
— Claro. Só não fique perguntando o tempo todo se eu me sinto bem. Minha mãe fazia isso e me deixava maluca!
— Tudo bem. Mas vou ficar um pouco preocupada.
— É... Eu também.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Simoraya - Na Ilha
FanficSimone Tebet é uma professora de inglês de 35 anos desesperada por aventura. Cansada do inverno rigoroso de Chicago e de seu relacionamento que não evolui, ela agarra a oportunidade de passar o verão em uma ilha tropical dando aulas particulares par...