Prólogo - Lótus da Meia-Noite

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No limiar entre a vigília e o sonho, onde as sombras dançam e os sussurros se tornam melodias, uma tragédia se desenrolava. A sala de concertos, envolta em uma penumbra quase etérea, era um santuário de expectativas e silêncios. Noemī, uma jovem cujos dedos delicados e alma atormentada transformavam o violino em um confidente, estava prestes a executar sua última confidência.

A cada apresentação, Noemī carregava o peso de um mundo indiferente, onde seu talento era uma moeda fria nas mãos de seus pais. Eles, como figuras de um quadro sombrio, observavam-na com olhares que não refletiam amor, mas sim ganância e controle. O público, encantado pela pureza de seu som, era alheio à tormenta que se escondia por trás de seus olhos tristes.

A noite caía como um manto de veludo, e as luzes do palco projetavam sombras alongadas que pareciam sussurrar segredos antigos. Noemī, com um vestido de seda branca que reluzia à luz suave, parecia uma aparição, uma entidade etérea prestes a se dissolver no ar. Ela ergueu a taça de vinho, um gesto carregado de ritual e despedida, seus olhos fixos em um ponto além do presente.

Cada nota que ela arrancava de seu violino era um lamento, um sussurro de dor e uma promessa velada. A música deslizava pelo ar, envolta em uma melancolia que fazia o tempo parar. A multidão, enfeitiçada, não percebia o veneno que se infiltrava em cada gole de vinho que Noemī tomava. Ela estava tecendo sua própria mortalha, uma sinfonia de fim e recomeço.

O veneno, silencioso e implacável, começava a exercer seu domínio. Noemī sentia a fraqueza em seus membros, mas sua determinação era um farol na escuridão. O público, prisioneiro da beleza trágica de sua performance, não via a sombra da morte se aproximar. Cada acorde era um passo mais próximo do abismo, cada melodia uma despedida dolorosa.

E então, na penumbra do palco, com um sussurro quase inaudível, ela pronunciou as palavras que ecoariam como um presságio: "Eu voltarei pra buscar vingança." A última nota, impregnada de uma tristeza insondável, reverberou pelo salão, deixando um vazio que nenhum aplauso poderia preencher.

Noemī caiu, seu corpo frágil encontrando o chão com uma leveza quase sobrenatural. O violino, agora mudo, repousava ao seu lado, um símbolo de tudo o que havia sido e do que estava por vir. O silêncio que se seguiu era carregado de uma tensão palpável, uma premonição do que o futuro reservava.

E assim, na penumbra entre a vida e a morte, Noemī não apenas se despedia do mundo, mas também se preparava para transcender. Sua promessa, velada em cada acorde, seria cumprida. A sinfonia de sua vida, embora interrompida, encontraria sua resolução final em uma melodia de vingança que ressoaria eternamente.

O palco, agora vazio, guardava os ecos de uma alma que se recusava a ser esquecida. E na escuridão, onde os vivos temem vagar, Noemī preparava-se para cumprir sua promessa, uma nota de vingança tocada na eternidade.

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