Assim que me recuperei, resolvi dar uma volta pelo lugar, conforme caminhei no jardim, sendo cercada por flores, ouvi uma voz cantarolar. Uma voz masculina e bela. Eu me aproximei do som, querendo conhecer os outros moradores. Olhei por entre as plantas, um homem, alto de cabelos pretos e olhos cinzentos claros estava às regando, enquanto cantava uma música britânica bem baixinho. Para não assustá-lo, limpei a garganta, porém, não foi eficiente, o moço pulou mesmo assim.
― Desculpe, não queria te assustar... Estou parada como um fantasma...
― Gostaria que todos os fantasmas fossem como você ― sussurrou, deixando o regador de lado, encarei o lírio que ele estava regando. ― Gostou?
― É bonita...
Sem mais explicações, o homem me reverenciou, e abriu a palma, revelando uma orquídea branca, eu sorri sem jeito, conforme peguei a planta da sua mão.
― Perdão, milady, não perguntei o seu nome.
― Verena Finkler, e você?
― Você é nova aqui.
― Isso te incomoda?
― Apenas me fascina ― disse, fazendo uma pausa. ― Eu sou Markus Evans, mas todos me chamam de Mark.
Um sorriso brotou nos meus lábios.
― Acha-me fascinante?
― Com toda certeza.
― Está sendo gentil ― constatei, mantendo o sorriso no rosto.
― Sou gentil com quem merece gentileza. Você merece admiração.
― Está tentando me seduzir? ― brinquei, achando toda a disposição de Markus engraçada.
― Está funcionando? ― retrucou no mesmo tom. Eu revirei os olhos, agradável. Enquanto sorria para o dono do casarão, o homem que tinha essa disposição para ajudar as crianças... para me ajudar.
― Estava, até eu descobrir suas intenções ― sussurrei, achando toda a brincadeira divertida, Markus suspirou exageradamente, como se estivesse triste com a derrota, depois um sorriso sincero apareceu em seus lábios, algo simples. ― Obrigada, Sr. Evans.
― Mark, por favor ― retrucou, antes de me encarar. ― Acabamos de nos conhecer, qual o motivo do agradecimento?
― Você me deixou ficar.
― Eu sei.
― Por que?
― Nós precisamos disso ― respondeu, enquanto olhava para meus olhos. ― Precisamos de apoio, sabe, nem sempre precisamos recolher os cacos sozinhos.
― E como você sabe que estou em cacos?
― Porque eu também estou.
Fiquei um pouco surpresa com a resposta, mesmo que eu já devesse ter previsto isso. Observei as plantas ao nosso redor, dando um cheiro diferente ao ar, o purificando e o deixando mais gostoso. Meus olhos não desviaram dos olhos cinzas de Markus, e quando percebi, ele estava sorrindo e eu sorri também.
― Verena é um nome típico alemão, não é? ― perguntou Evans.
― Sim, isso é engraçado?
― Não, é que seus olhos me fazem sorrir ― explicou. Eu achava estranho como Mark conseguia falar coisas assim casualmente, normalmente os homens não são assim, caso eles elogiam, não possuem a tonalidade de Markus, não possuem a simplicidade e o respeitar de Evans. ― É bom conhecer pessoas como você, Verena.
― Pessoas como eu?
― Fortes. Sabe, todos que estão aqui, são conhecidos por sua força... eu gosto de dizer, que todas as pessoas lutaram nesta guerra, não somente quem pegou a arma ― Markus balançou a mão, deixando algumas cicatrizes visíveis. Cicatrizes que pareciam estar ali antes da guerra. Eu tentei não tirar os olhos dele e das flores, meu sorriso ainda nos meus lábios, embora meu coração esteja palpitando demais de uma forma ruim, pensei que tudo ficaria péssimo de novo, que o mundo voltaria a girar na minha cabeça, mas Mark me trouxe para a realidade.
― Acredita em lendas, Verena?
― Nós somos lendas ― retruquei. Markus ficou analisando, com um sorriso no rosto de canto, quase como se achasse a resposta engraçada. ― O que foi?
― Há uma verdade nisso.
Eu abri meu melhor sorriso, achando divertido sua maneira de falar.
― Então, acredita.
― A lenda precisa se basear em algo, nem que seja em uma mentira ou uma distorção da realidade ― falei, Markus concordou. Estava gostando da ideia de ter um homem concordando tanto comigo, eu conhecia bem a sociedade. ― Isso não te incomoda?
― O que?
― Concordar tanto com uma mulher?
― Por que me incomodaria?
― Você sabe como são as pessoas ― murmurei, com medo que Mark mudasse, mas o sorriso no seu rosto deixou claro que era o mesmo.
― Como diz meu irmão: que se dane as pessoas ― retrucou, parecendo feliz pelo exemplo que o irmão estava lhe passando. ― Você é uma pessoa, Verena, pessoas devem ser tratadas como pessoas.
― Deve ser a primeira vez que escuto isso em anos ― falei baixo, lembrei da minha experiência com pessoas e como haviam sido péssimas, como a maioria das pessoas são machistas e opressoras, gostam de ver os outros sofrerem, mas Mark parecia diferente, ele parecia... humano, como ninguém nunca foi comigo ou com essas crianças. ― Você é diferente, Markus.
― Ou talvez eu seja louco, Verena.
― É tudo questão de perspectiva.
― Isso me lembrou alguém.
Eu dei uma risada, quem poderia tê-lo lembrado?
― Você disse que é questão de perspectiva, qual é a sua?
― A minha? Por que seria importante? ― quis saber com genuína curiosidade, raramente as pessoas queriam saber o que eu sentia, foi assim durante 27 anos ou o que eu me lembrava durante esses 27 anos. Minha mãe sempre deu o melhor para nos ver bem, mas nunca aceitou nossa opinião. Ela morreu, mas não se tornou melhor por causa disso. Tinha seus defeitos, assim como nosso pai, cujo primeiro defeito foi abandonar nossa família.
― Você é parte dessa família agora, Verena. Destrua tudo antes de ser destruído.
Um sorriso brotou nos meus lábios com as palavras de Markus.
Destrua tudo antes de ser destruído...
― Eu nadava.
― Você era atleta?
― Sim.
― Você podia ensinar as crianças na piscina da cidade.
Meus olhos brilharam, meu sorriso aumentou, claramente aumentando minha animação.
― Você confia em mim para isso?
― Confio.
― Por que?
― É tudo questão de perspectiva ― retrucou, eu revirei os olhos, com um sorriso no rosto. ― Talvez tudo seja uma enorme perspectiva.
― Obrigada.
― Eu agradeço.
Eu olhei para as flores que nos rodeavam e pensei em deixar ele continuar seu serviço.
― Só mais uma coisa... não desista de nadar, Verena.
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Entre Guerras
Tarihi KurguA Segunda Grande Guerra foi marcada pela brutalidade, sangue derramado de inocentes e pelos Campos de Concentração. Verena Finkler, depois de ter sido resgatada e experimentado novamente a liberdade, vai para uma pequena cidade da Alemanha, chamada...