- Espere, você está me dizendo que uma garota reabriu a floricultura da Patty?
- Eh… sim - disse Freen. - Não sei onde está o problema.
- Mas você… qual era o nome dela mesmo? - Nam perguntou.
- Rebecca, o nome dela é Rebecca.
“Melhor Becky” apareceu em algum lugar na parte de trás de sua cabeça como um sussurro que lhe dava arrepios.
- Isso, Rebecca.
A cabeça de Freen voltou para aquela floricultura. Becky encostada no balcão com a cabeça inclinada, olhando para Freen como se ela fosse uma espécie em extinção.
- Freen, FREEN! Onde diabos você foi? Qual é o problema? - disse Nam, que aparentemente continuou falando após esclarecer a questão do nome. - Estou perguntando por que você não perguntou a Rebecca onde poderia ir entregar o livro pessoalmente para Patty, em vez de deixá-lo na floricultura.
Essa foi uma pergunta muito boa na opinião de Freen.- Para ser sincera, isso não me ocorreu. - Se ela lhe dissesse que não foi capaz de dizer nada remotamente interessante… - Pareceu-me mais lógico deixar o livro ali. - Freen sentiu-se um pouco atordoada. - Eu realmente não entendo por que não perguntei a ela onde Patty morava.
- Talvez ela não saiba - disse Heng.
- Tenho certeza de que ela sabe. Você não dá as chaves do seu negócio de uma vida inteira para uma mulher maluca que você viu duas vezes. Rebecca deve saber onde Patty mora. Talvez você pudesse voltar lá e ver se…
Mas Freen a interrompeu.
- Não, não, acho que não, bem, não sei. Provavelmente já lhe entregou o livro, então por que voltar lá, certo? Eu precisaria de um motivo para voltar e não tenho, certo? Eu não tenho isso.
Nam olhou para ela de forma estranha. Já fazia anos que ela não ouvia Freen vincular tantas palavras seguidas na mesma conversa. Embora metade não tivesse sentido, a extensão de sua argumentação a deixou atordoada por um momento.
– Então, Rebecca – Nam pensou. – Bom, ainda acho que não faria mal se você fizesse uma visita à mulher. Ela não te vê há muito tempo. Você era como uma neta para ela, Freen…
A garota abaixou um pouco a cabeça. Ela ainda não sabia muito bem como administrar o relacionamento com o resto das pessoas, pelo menos não com aqueles com quem ela estabeleceu algum tipo de relacionamento depois do ocorrido. Até a maneira como ela interagia com seus velhos amigos, dos quais só restava Nam, era completamente diferente.
Ela sentiu um arrepio. Por que ela não conseguia se lembrar dela? É verdade que já se passaram seis anos, mas algo assim teria que ficar gravado em pedra, certo? Durante o tempo em que ela estava em terapia, eles lhe explicaram que era perfeitamente normal que seu cérebro tivesse apagado a lousa daquele evento. Esse estresse funcionou assim. Esse cortisol comeu as imagens. Mas, mesmo assim, Freen e seu masoquismo continuaram procurando em sua cabeça o rosto daquela garota. Pelo menos para saber se alguém a procurou ou se ela apareceu em alguma notícia de desaparecimento. Mas nada, ninguém nunca falou sobre isso. Aquela garota não existia para ninguém além de Freen naquela noite de primavera, e a versão dada foi que Freen teve um ataque de pânico na ponte devido ao estresse e ao álcool, e que ele teve alucinações de que uma garota estava cometendo suicídio. Uma versão maravilhosa – pensou Freen – que de forma alguma a deixava com cara de maluca.
Nam e Heng já haviam desistido há muito tempo de tentar fazer com que Freen falasse com eles. A garota estava perdida em seus pensamentos mais uma vez, então, quando os dois se levantaram e se despediram dela, avisando que iriam procurar algo para comer, ganhando um som indeterminado de Freen, eles saíram do apartamento, deixando-a sozinha no sofá.
– Achei que estava melhor – disse Nam assim que saíram.
– E ela está, acredite – respondeu Heng. – Acho que tudo no livro a desestabilizou um pouco. É normal. Certamente trouxe à luz algumas coisas que estavam submersas há algum tempo.
– Achei que ela estava morrendo – disse Nam, parando repentinamente no meio da calçada. Ela não sabia por que estava contando isso para aquele garoto que praticamente acabara de conhecer. Mas ele tinha visto a escuridão absoluta de Freen e não conhecia ninguém que pudesse entendê-la melhor do que ele. – Juro que pensei que ela fosse morrer por causa dessa dor. Nunca imaginei que alguém pudesse ser quebrado por dentro e isso pudesse ser visto tão claramente por fora – ela suspirou. – Eu a perdi. Eu a perdi por não acompanhá-la até sua casa para terminar a mala. Perdi o controle pedindo mais uma cerveja. Eu nunca vou me perdoar por Freen ter atravessado aquela ponte sozinha naquela noite.
Heng olhou para ela em silêncio. Ele não sabia que Nam carregava essa culpa e tinha certeza de que Freen também não sabia. Sempre que falavam dela, Nam aparecia como sua amiga feliz, como sua amiga que sempre tentava fazê-la rir. Mas a Nam que estava diante dele carregava há anos algo que encharcava seu coração e o tornava pesado como um pano grosso na água.
– Me desculpe, não sei por que estou te contando tudo isso. Você deve achar que sou uma estraga-prazeres, estou aqui há três dias – disse a garota, tentando amenizar o momento dramático que havia sido gerado.
– Você não precisa se desculpar. Amar Freen desse jeito automaticamente faz você entrar no meu top de pessoas favoritas – ele disse, encolhendo os ombros. – Então, parabéns – ele sorriu. E Nam relaxou. – Vamos, estou morrendo de fome.
Enquanto isso, Freen permaneceu em casa sem olhar para nenhum ponto fixo. Ela sabia quando aquela sombra começou a aparecer. Ela conhecia aquela sombra. Então, naquela mesma tarde, ela tomou uma decisão que sabia que teria de tomar mais cedo ou mais tarde.