Capítulo 17: Ela que Espera

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A tempestade passou, restando apenas gotas de água nas folhas e na grama. Embora o coração ainda esteja ferido e as lágrimas tenham secado recentemente, o tempo parece não conhecer a palavra "compaixão".

Eu e Khun Mas, estávamos sentados juntos na cama do quarto dele. Eu estava cuidando dos seus ferimentos.

Todos os cortes em Khun Mas foram causados pela explosão das minhas emoções, uma piada cruel que não tem graça. Limpei o sangue e tratei os ferimentos dele com delicadeza. O corte na coxa era mais profundo do que os outros, e embora eu o tenha enfaixado várias vezes com um pano limpo, o sangue continuava a vazar.

Eu suspirei. Se eu não tivesse recobrado a consciência, ele poderia ter morrido. Não é surpresa que antes disso ele tenha tentado afastar todos os fantasmas que se aproximavam dele.

"Esse tempo todo, pensei que você fosse um fantasma. Nunca imaginei..." Tentei engolir as palavras, mas falar sobre minha própria morte era amargo demais para suportar. Toda vez que aceitava que isso havia realmente acontecido, era como morrer novamente.

Ele me olhou com gentileza. "Para mim, você está vivo, só que é uma vida após a morte em uma forma que eu não compreendo muito bem. Mas, mesmo assim, você não é como os outros espíritos que já encontrei. Você é adorável e não tem más intenções."

"Isso quase soa bem."

"Desde criança, eu sempre tentei fugir, mas parece que nunca consegui escapar."

Olhei para ele com simpatia. Khun Mas teve que lidar com espíritos desde a infância, e alguns espíritos ele podia até se comunicar. Era um dom que ele nunca quis e não sabia por que os espíritos o perseguiam. Mas eu sabia.

Todos os espíritos que ainda permanecem entre dois mundos – o dos vivos e o dos mortos – têm algo que não conseguem superar: raiva, ressentimento, amor, preocupação, saudade, culpa ou a incapacidade de aceitar sua própria morte. Esses sentimentos nos mantêm presos em nosso próprio limbo.

Agora eu entendia por que Khamphuan tentava se aproximar de mim. Ela queria se comunicar com Khun Mas por meu intermédio, porque ele nunca havia aceitado ouvir o que ela tinha a dizer. E não era só Khamphuan, mas todos os espíritos que ele havia encontrado. Desde criança, Khun Mas passou por experiências traumáticas com fantasmas e espíritos. Ele ficou aterrorizado com o que via, e ninguém mais conseguia enxergar o que ele via. O mais triste é que ninguém poderia ajudá-lo.

Mesmo Khamphuan, perdeu o controle e o machucou, quando Khun Mas era uma criança se assustava e sempre fugia.. Os espíritos podem ficar ainda mais furiosos que os vivos, pois somos almas incompletas, vagando sem um corpo onde habitar.

Agora, queria dissipar o mal-entendido que o atormentou por toda a vida.

"Khun Mas, eu sei que tudo o que você passou foi realmente terrível. Não sei como são os outros espíritos, mas sobre o espírito da mulher naquele quarto, o nome dela é perdeu o controle e o machucou. Tenho certeza de que ela não pretende te machucar. Ela só quer te pedir algo."

Khun Mas hesitou, pressionando os lábios e com um olhar de dúvida.

"Venha comigo, Khun Mas. Escute o que ela tem a dizer, só desta vez."

Descemos juntos para o andar de baixo. O quarto no final do corredor, no lado direito da casa, parecia sombrio e silencioso. Eu costumava sentir medo ao passar por ali, mas desta vez foi diferente.

Quando chegamos em frente à porta, ela se abriu lentamente.  Khamphuan estava sentada no chão, sob uma luz suave que parecia vir de uma aurora. Ela estava em frente a um espelho, com incenso e um pote de pó ao lado. Um pequeno pente estava ao lado de uma flor de pavão amarelo-alaranjada. Khamphuan estava vestida com uma blusa tradicional de manga comprida e uma saia listrada típica das mulheres do norte. Seu rosto, belo e doce, era marcado por tristeza. Ela nos olhou com olhos que pareciam suplicar.

Em uma noite de luarOnde histórias criam vida. Descubra agora