Capítulo II: Lembrança e Despedida

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Vaegon Targaryen sempre foi conhecido por sua frieza e indiferença, mas o funeral de Viserra, sua irmã e esposa, não foi um evento que ele pôde ignorar. Ele se lembrava de cada detalhe daquele dia, uma recordação que o perseguiria como um espectro. O vento cortante de Pedra do Dragão agitava os mantos e cabelos dos que estavam presentes, e o cheiro do mar misturava-se à fumaça dos braseiros que ardiam em outros cantos da ilha. Mas naquela tarde, todos os olhares estavam fixos no corpo de Viserra, deitada sobre a pira, envolta em tecidos de vermelho e preto, os olhos finalmente fechados para o mundo que tanto a havia enredado.

Theoran, o dragão de Viserra, voava em círculos sobre o local do funeral. As escamas negras e marrons brilhavam à luz do sol, um monstro enorme e majestoso, um dos grandes dragões vivos em Westeros. Sua presença era impossível de ignorar. Theoran, com seus espinhos que iam da cauda até o topo da cabeça coroada por chifres cor de osso, era uma visão aterradora. Seu rugido, profundo e quase ancestral, ecoava nas montanhas ao redor, como se ele também sentisse a perda de sua cavaleira. Ele era o segundo dragão mais velho de Westeros, superado apenas por Balerion, o Terror Negro. No céu, ele era uma sombra que parecia tomar o firmamento, um lembrete do poder e da fúria dos dragões que os Targaryen tanto prezavam.

Vaegon observava tudo à distância, seus olhos impassíveis enquanto o corpo da irmã repousava. Ele não estava emocionado, como tantos esperariam de um marido. Não havia amor em seu coração, nem ódio. Apenas a quietude de alguém que compreendia o destino melhor do que os outros. Ele não precisava de palavras para lamentar, porque dentro de si ele já havia aceitado que Viserra tinha selado seu próprio fim no dia em que decidiu manipular seu destino com alquímicos e ambições.

Ao lado de Vaegon, seu irmão Baelon se mantinha em silêncio, o semblante sério como sempre. Baelon, o príncipe piedoso, não havia olhado para Vaegon mais de uma vez desde a morte de Viserra, e a frieza entre os dois irmãos era tão palpável quanto o vento. Rhaenys estava ao lado de Aemon, a jovem princesa tão cheia de vida, mas naquele momento silenciosa, observando a cena com olhos atentos, talvez já compreendendo as tramas que envolviam sua família.

A rainha Alissanne estava em pé junto ao rei Jaehaerys, e enquanto o rei Targaryen tomava a palavra, sua voz ressoando como um trovão calmo, Veigon sentiu o peso de cada frase. Jaehaerys falou de Viserra como ele a conhecera: impetuosa, ambiciosa, mas acima de tudo, uma filha que nunca deixara de lutar por aquilo que acreditava. O rei não ocultou os erros de sua filha, mas também não permitiu que a história dela fosse contada apenas como uma de falhas.

"Viserra," ele disse, com um tom solene, "era o que muitos Targaryen são: uma chama que queima com força, sem jamais se apagar enquanto há fôlego em seus pulmões. A sua vontade, como a nossa linhagem, era indomável. Mas, como todo fogo, ela consumiu o que havia ao seu redor."

O rosto de Jaehaerys não traía dor, mas havia uma tristeza velada em seus olhos, que apenas os mais próximos podiam ver. Vaegon não se iludia; sabia que o rei lamentava não só pela perda de uma filha, mas também pela perda de controle sobre um destino que ele acreditava poder moldar.

Ao final do discurso, Jaehaerys silenciou, deixando o vento preencher o espaço. Os presentes estavam quietos. Nenhum som de choro, apenas o murmúrio distante do mar e o bater das asas de Theoran, ainda sobrevoando o local, como se guardasse o corpo de sua cavaleira.

Então, chegou o momento que todos aguardavam. A rainha Alissanne, forte e imponente, deu um passo à frente. Ela fitou o corpo de sua filha por alguns instantes, e então, com uma voz clara e decidida, ordenou:

"Dracarys."

Asaprata, o grande dragão prateado de Alissanne, avançou com um passo lento e poderoso. Suas escamas cintilavam à luz do crepúsculo, e quando ele abriu as mandíbulas, o calor do fogo que emanava dele podia ser sentido por todos os presentes. Uma chama intensa e branca saiu de sua boca, engolindo o corpo de Viserra, transformando os panos e a carne em cinzas num instante.

Vaegon assistiu ao corpo da irmã desaparecer nas chamas. Ela havia buscado o poder, o controle sobre seu destino, e no final, tudo que restou foi o fogo, como sempre acontece com os Targaryen. As chamas eram sua herança, seu fim inevitável.

Quando a fumaça subiu aos céus, Theoran soltou um rugido de partir os céus, uma última homenagem à sua cavaleira caída.

O Herdeiro do Fogo: A Saga de Baelys TargaryenOnde histórias criam vida. Descubra agora