Dimitri, um estudante de artes com um segredo sombrio, nutre uma obsessão silenciosa por Valência há anos. A vida dele gira em torno dela, sua musa inalcançável, até o dia em que uma inesperada proposta lhe dá a chance de se aproximar.
Mas aquilo q...
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Mas tudo bem, o dia vai raiar pra gente se inventar de novo - Cícero, Tempo de Pipa
Eu estava sentado no banco da escola, os pés balançando no ar enquanto apertava a carta que tinha feito para ela. A folha estava amassada de tanto eu segurar, mas eu não queria largar. Tinha desenhado um coração com as bordas tremidas e escrito um poema que passei dias pensando. Não era perfeito, mas era o melhor que eu conseguia fazer, e eu só queria que ela visse.
Olhei para o relógio da parede pela milésima vez. Já tinham começado a recolher as cadeiras, e os outros alunos, felizes, saíam com suas mães, rindo e segurando as mãos delas. Uma garota com tranças passava por mim, exibindo o colar que tinha feito na aula de artes. Todos pareciam tão felizes. Todo mundo, menos eu.
Ela disse que viria. Prometeu que não ia perder. E, assim como das outras vezes, eu acreditei. O banco vazio ao meu lado parecia zombar de mim. Mas eu continuei esperando. Porque ela era minha mãe. A única pessoa que eu tinha. Eu não podia sentir raiva. Não podia sentir nada. Ela era tudo para mim, mesmo quando me deixava aqui, sozinho, como agora.
Minhas mãos apertaram a carta com força. Os dedos suavam, e eu senti a raiva crescer no meu peito, quente e sufocante. Eu não queria sentir isso. Eu queria ser forte. Queria acreditar nela, mas era difícil. Tantas promessas quebradas, tantas vezes que ela não apareceu. Talvez eu estivesse pedindo demais. Talvez eu fosse demais para ela.
Suspirei, soltando a carta amassada no chão, levantando-me devagar. Olhei para os lados, esperando que, de algum jeito, ela aparecesse correndo e me abraçasse, dizendo que estava atrasada, mas que me amava e tudo ficaria bem. Mas não havia ninguém.
Resolvi ir embora. Nossa casa não era tão longe da escola, e eu já sabia o caminho de cor. Passei pela calçada rachada e as cercas enferrujadas, segurando as alças da mochila com força. As lágrimas ardiam nos meus olhos, mas eu não deixei que caíssem. Não chorava mais. Não adiantava.
Cheguei em casa e estranhei a porta entreaberta. Ela sempre dizia para não deixar a porta assim, mas vindo dela, eu não esperava muito. Entrei devagar, o chão rangendo sob meus pés pequenos. Joguei a mochila em cima da cadeira da cozinha e abri a geladeira, pegando a garrafa de água.
Foi quando eu senti. Mãos grandes e pesadas agarraram meu cabelo, puxando com força. O grito ficou preso na garganta, e eu fui arrastado pela casa. Não gritei. Não chorei. Aquilo já era comum. As vezes em que ela estava fora de si, cheirando a álcool e amargura, gritando palavras que eu já não tentava mais entender.
Ela me jogou na sala, e eu bati as costas no chão frio. A dor correu pelas minhas costas, mas eu não fiz som algum. Só fiquei olhando para ela, os olhos inchados, o rosto marcado de cansaço e raiva. Ela era minha mãe, a mulher que eu amava, a pessoa que prometeu que sempre estaria lá. Mas ela estava quebrada, e eu era um pedaço dessa quebra que ela não conseguia consertar.