XIII

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Eu confiava mesmo? Essa palavra ecoava na minha mente enquanto eu tentava seguir algo que não podia ver. Ela era uma assassina, matou vários de seus próprios irmãos para simplesmente estar aqui. A pergunta que não me deixava era: o que a vida eterna realmente lhe trouxe? Matar um de seus irmãos por mais alguns anos de sofrimento não fazia sentido. Não faz sentido viver desse jeito.

Parei de andar. Olhei fixamente para a frente, acreditando estar olhando para a alma dela. Senti que ela também parou. E, como se lesse meus pensamentos, ela respondeu, ofegante, entre uma respiração e outra.

— Eu sei que disse que, assim que nos encontrássemos..., eu não estaria mais ao seu lado, assim como você também não estaria ao meu... – Alguns pássaros começaram a cantar ao longe. O sol já estava se pondo, tingindo o céu com os últimos tons de luz do dia. – Mas, se não quiser fazer isso por mim, faça por Enid... Por Mãozinha... Pelo seu tio, e até por aquele garoto em coma.

- Continue a andar – Foi tudo o que consegui responder.

Ela estava certa. Salvá-la agora poderia aumentar nossas chances de derrotar Gregório, aqui e nesta década. Mas por que sinto que não quero salvá-la apenas para ajudar o mundo?

Há tantas perguntas que gostaria que ela me respondesse. Neste momento, tento me concentrar apenas nisso, nas dúvidas sobre como realmente ajudar a todos.

- Acelere o passo – ela fala por fim. – Não consigo falar muito, por isso..., tente ouvir o meu canto assim que der. Acredito também..., que sua visão não vá durar muito, não é?

Caminhávamos lentamente pela estrada de terra que levava para fora da cidade. O céu começava a tingir-se de tons alaranjados com o cair da tarde, e o vento sussurrava entre as árvores ao longo do caminho. A estrada, antes familiar, agora parecia diferente, quase como se estivesse mudando sob meus pés. As casas aos poucos foram ficando para trás, substituídas por árvores e pequenos morros. Onde realmente ficava o santuário? Poderia estar tão longe quanto perto. E o que eu mais espero é que dê tempo de chegar.

O caminho tornou-se cada vez mais estreito, e o brilho suave do pôr do sol foi se apagando, substituído por uma sombra inquietante. Entramos em uma floresta antiga, onde os troncos retorcidos das árvores formavam arcos sombrios acima de nós, filtrando a pouca luz que restava.

Logo nos deparamos em um lugar ao qual parecia que nenhum ser humano pisava havia anos. À nossa frente, ruínas esquecidas emergiam do solo coberto de musgo. Pilares quebrados e pedras cinzentas, marcadas pelo tempo, formavam um círculo irregular. E quando eu menos espero, tudo fica em total silêncio. Algo ali, naquela quietude opressiva, nos esperava.

— Sarah? — questiono, ao sentir que ela não está mais lá. Olho ao redor e me vejo completamente sozinha, envolta pela escuridão. Será que foi a minha visão que parou, ou ela parou de cantar? Pego meu celular no bolso e acendo a lanterna para enxergar melhor. Não estou com medo, mas nunca se sabe o que pode surgir à frente.

Uma coisa poderia acontecer naquele momento: Gregório aparecer antes que eu encontrasse Sarah. Acelero o passo, continuo seguindo em frente, sem me desviar de qualquer obstáculo.

Essas ruínas ao meu redor tinham algum significado. Em breve, eu descobriria o verdadeiro motivo de estarem ali.

Sem perceber, caminhei por dez minutos em linha reta, ainda sozinha. Naquele momento, aquela mesma palavra voltava a vagar pela minha mente. Eu confiei realmente nela, mas por quê? Não fui eu que gritei com ela, pedindo que fosse embora da escola? Não fui eu que queria que ela parasse de mexer nas minhas coisas? Então por que essa palavra agora parecia um soco no estômago?

Sou tirada do transe ao ouvir um barulho vindo da moita ao lado. Mais um barulho, dessa vez vindo do meu celular. Bateria fraca, 10%. Não havia mais tempo. Começo a correr, mas com o máximo de cuidado. Já fugi de Tyler uma vez enquanto ele me caçava, então sabia, mais ou menos, como evitar os obstáculos no caminho.

Vitus Shaitt - WandinhaOnde histórias criam vida. Descubra agora