Capítulo 22- Enid Sinclair

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Estávamos sentadas em um luxuoso restaurante, daqueles com lustres de cristal pendurados no teto e garçons andando silenciosamente, como sombras. O ar cheirava a vinho caro e pratos finamente temperados, mas para mim, tudo estava carregado de uma tensão sufocante. Ao meu lado, Wednesday estava rígida, quase imóvel, e cada vez mais acanhada com as palavras de seu pai.

A mesa redonda, grande e imponente, estava cheia de empresários engravatados, todos com seus sorrisos calculados e risadas fáceis. A porcelana e os talheres brilhavam sob a luz suave, e o tilintar ocasional de taças parecia ecoar mais alto do que o normal. Eu observava Wednesday de soslaio, tentando entender o que estava acontecendo por trás de sua fachada fria. Seus olhos, que normalmente eram lâminas afiadas, estavam fixos no prato à sua frente, sem realmente ver nada.

Gomez Addams, sentado do outro lado da mesa, era o centro das atenções. Ele falava com confiança, seus gestos expansivos parecendo ocupar todo o espaço. Era impossível ignorá-lo. Ele era o tipo de homem que dominava a sala com sua mera presença. Toda vez que ele falava, parecia que os outros homens ao redor da mesa riam apenas para agradá-lo. Mas, eu podia sentir o peso por trás de suas palavras, especialmente quando ele se dirigia indiretamente a Wednesday.

— O futuro da empresa depende de quem estará disposto a assumir o controle. — Gomez disse, sua voz grave ecoando pela sala. — Nem todos estão prontos para carregar esse fardo.

Seu olhar recaiu sobre Wednesday. Ela não olhou para ele, mas eu vi o aperto de sua mão no guardanapo ao seu lado, seus dedos tão firmes que os nós estavam esbranquiçados. A cada farpa lançada por seu pai, ela parecia se encolher um pouco mais, como se tentasse desaparecer debaixo da mesa.

Os empresários ao redor continuavam a rir, ignorando completamente o desconforto de Wednesday, ou talvez simplesmente escolhendo não ver. Eu senti meu estômago revirar com a falsidade daquilo. A cena me parecia uma armadilha, como se todos ali estivessem participando de um jogo em que Gomez era o único vencedor.

— Alguns filhos entendem a responsabilidade de manter o legado da família — ele continuou, seus olhos brilhando com um humor cruel. — Outros... têm outras ambições.

O riso dos outros empresários foi abafado, mas presente, e eu senti o impacto dessas palavras em Wednesday. Ela não movia um músculo, mas eu sabia o quanto aquilo estava afetando-a. Era como se o peso das expectativas fosse uma âncora presa a seus ombros, afundando-a mais a cada comentário. Eu queria gritar, interromper aquela tortura sutil, mas sabia que isso só a deixaria mais exposta.

— Ah, Pugsley... — Gomez suspirou, pegando sua taça de vinho e girando o líquido lentamente. — Se ele estivesse aqui... Ele nunca hesitaria em seguir meus passos. Ele sempre foi tão dedicado, tão... leal.

Nesse momento, o nome "Pugsley" pareceu parar o tempo. Eu olhei diretamente para Wednesday. Seus olhos ficaram vidrados, e por um segundo, pensei que ela fosse quebrar. Mas não. Ela apenas respirou fundo, prendendo todo o sofrimento e raiva dentro de si. A mão que antes segurava o guardanapo agora apertava a borda da mesa com tanta força que suas unhas quase cavavam o mármore. Eu nunca a tinha visto tão... vulnerável.

A lembrança me atingiu como um raio: a noite em que eu a deixei bêbada no dormitório, murmurando o nome "Pugsley". Na época, eu não tinha ideia de quem ele era. Agora, tudo fazia sentido. Pugsley era seu irmão. E ele estava morto. Gomez não estava apenas falando de um filho ausente, estava comparando Wednesday a um fantasma. E a dor disso, de viver à sombra de alguém que não estava mais lá, era mais profunda do que eu podia imaginar.

— Ele faz falta todos os dias — Gomez continuou, sem perceber ou talvez ignorando completamente o impacto de suas palavras na filha. — Eu sei que ele nunca teria recusado a chance de liderar esta família como deveria.

Rebel Hearts (Wenclair)Onde histórias criam vida. Descubra agora