96 - Eu não sei te tocar de outra forma

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XCVI


Scarlett já estava há tanto tempo na banheira que seus dedos enrugaram e a pele foi impregnada com o aroma doce dos sais de banho. Ela assoprou a espuma, observando-a flutuar até cair no chão, puxando-as para seu peito, colocando um pouco nos cabelos.

— Toc, toc. — Ela ouviu uma voz do outro lado da porta.

— Entra... — Respirou fundo, girando o olhar para o fantasma de James que atravessou a porta com os olhos fechados, abrindo um de cada vez com cuidado.

— O que foi aquilo mais cedo? Vi Sirius brigando feio com a Penny... — Ele puxou um banquinho fantasmagórico e se sentou nele, apoiando os cotovelos na borda da banheira. — Nunca imaginei que iria vê-la arredar o pé daquele jeito, também.

Scarlett apenas deu de ombros, sem dizer nada.

— Ela mencionou que você estava escondendo algo. — James prosseguiu, empurrando os óculos na ponte do nariz com o mindinho. — O que aconteceu?

Scarlett apertou os lábios, umedecendo-os enquanto pensava no que responder.

— Ela só surtou... elfa maluca... — Resmungou, fingindo estar ocupada demais com a espuma para encarar o amigo.

— Hum... sei... — James grunhiu em tom duvidoso.

— Posso te perguntar uma coisa? — A voz de Scarlett tremeluziu nas paredes do banheiro.

James passou a mão na espuma de Scarlett, criando uma espuma fantasmagórica nas mãos, jogando-a para cima e observando-a flutuar no alto.

— Pode.

— O que aconteceu com os seus pais?

James continuou com o olhar no alto, embora já não enxergasse mais o presente. A espuma refletia-se nas lentes de seu óculos, despencando aos poucos, enquanto memórias brilhavam em suas retinas. Seus olhos encheram-se de lágrimas. James abaixou o rosto lentamente, as íris de avelã ainda perdidas em dias em que Fleamont e Euphemia ainda estavam vivos, que a vida era cor-de-rosa e a guerra apenas uma ameaça distante.

Ele não moveu a cabeça, encarando Scarlett de esguelha. A curiosidade infiltrada em seu semblante se foi sem deixar rastro, substituída por uma dor que nada naquele mundo poderia curar, uma dor que Scarlett bem conhecia.

A dor de perder os pais.

James tirou os óculos do rosto para secar as lágrimas com a palma da mão. Ele sorriu com o canto da boca, um sorriso cheio de nostalgia e pesar.

— Varíola de Dragão... — Ele suspirou, os ombros tensos como se o mundo acabasse de recair sobre eles. — Pouco tempo depois do meu casamento com a Lily...

Scarlett sentiu a saliva ficar grossa, engolindo com dificuldade ao acompanhá-lo no choro. Sabia o que James sentia e doía ainda mais ter a certeza de que não havia nada que pudesse fazer a respeito.

— Eu sinto muito, Jamie. Muito mesmo. — A mão de Scarlett atravessou a de James, numa falha tentativa de consolá-lo.

— Eu entendo, agora, as coisas que você me dizia. Sobre... sobre nunca conseguir superar. Sobre... nunca mais ser o mesmo. E sobre como a dor... — Ele puxou o ar, colocando a mão no peito. — Cacete, eu estou morto e ainda dói!

Scarlett fungou ao concordar.

— Nem a morte é capaz de curar a dor da saudade... — Sussurrou, abraçando os joelhos. — Você os encontrou? Quando... quando morreu?

Scarius | Sirius Black (Ato II)Onde histórias criam vida. Descubra agora