Chegamos ao hospital em uma tarde que parecia comum, mas eu sabia que não era. Cada batida do meu coração parecia mais alta do que a anterior, um tamborilar frenético, movido pelo medo. Atravessei as portas do pronto-socorro com passos rápidos, sentindo o peso da preocupação me arrastar, enquanto Henrique mantinha um passo firme ao meu lado. Ele parecia tão calmo, tão composto, mas eu sabia que por dentro ele devia estar tentando encontrar as palavras certas, assim como eu.
— Boa tarde, em que quarto a Paloma Goulart está? Sou a filha dela — perguntei à recepcionista, tentando manter minha voz firme, mas as palavras saíram trêmulas.
Ela olhou para a tela do computador por um instante e respondeu:
— Quarto 213, no segundo andar.
Me virei, encontrando Henrique exatamente onde eu esperava que ele estivesse, ao meu lado, olhando para mim com aquela expressão calma, quase protetora.
— Obrigada pela carona, Henrique. Pode ir agora, vou ficar aqui com minha mãe — falei, esperando que ele entendesse que eu precisava de um momento sozinha.
Mas ele balançou a cabeça, firme.
— Vou ficar com você, não se preocupe — disse com uma tranquilidade que me desarmou.
Havia algo na maneira como ele falava, uma força silenciosa, que me impediu de insistir. Sem discutir, apenas segui o caminho em direção ao quarto da minha mãe. No fundo, eu sabia que precisaria de apoio, mas parte de mim ainda lutava contra essa ideia. Henrique, apesar de ser um quase desconhecido, estava ali, e isso me causava uma confusão de sentimentos.
Subimos as escadas em silêncio, o som dos nossos passos ecoando pelas paredes frias e brancas do hospital. O número 213 não demorou a aparecer, no fim do corredor. Hesitei por um momento antes de abrir a porta. Meu coração estava pesado de preocupação, e o que eu veria a seguir poderia mudar tudo. Respirei fundo e entrei.
Minha mãe estava deitada, os olhos fechados, o rosto pálido contrastando com seus cabelos grisalhos. Uma enfermeira se afastava da cama, carregando uma bandeja. Ela me olhou e sorriu, como se quisesse transmitir alguma tranquilidade em meio ao caos.
— O médico já está a caminho para falar com vocês — disse gentilmente, antes de sair da sala.
Aproximei-me da cama, meu coração se apertando a cada passo. Segurei a mão da minha mãe, sentindo sua pele fria e frágil, e uma onda de emoção tomou conta de mim. Não podia perder minha mãe. As lágrimas começaram a correr livremente, sem que eu pudesse contê-las.
Ouvi a porta abrir atrás de mim e me virei, enxugando rapidamente o rosto com as costas da mão. Um homem de cabelos grisalhos, usando jaleco, entrou na sala. Ele se apresentou como doutor Paulo.
— Sou a filha dela, Maitê — falei, tentando manter a compostura enquanto apertava a mão dele.
— Eu entendo, Maitê. Tenho informações sobre o quadro da sua mãe. Não é fácil dar essa notícia, mas é importante que você saiba que o caso dela é grave.
As palavras do médico pairaram no ar como uma sombra. Grave. Não sabia o que aquilo significava exatamente, mas o peso delas já parecia insuportável.
— O que ela tem? — perguntei, minha voz quase um sussurro.
— Sua mãe deu entrada com dor intensa no peito e estava tossindo sangue. Fizemos uma endoscopia digestiva e identificamos um câncer no esôfago.
Aquelas palavras me atingiram como um soco no estômago. Câncer. Não, isso não podia estar acontecendo. Minhas pernas começaram a ceder, e só percebi que estava caindo quando senti os braços de Henrique me segurando, me impedindo de desabar completamente.
— Você precisa ser forte agora, Maitê — continuou o doutor, com um olhar de compaixão. — Ela vai precisar de você mais do que nunca.
Eu queria gritar, chorar, pedir para que aquilo fosse um pesadelo. Henrique estava ao meu lado, firme, me apoiando com seu silêncio. O toque de sua mão em meu ombro me trazia de volta à realidade, me forçando a processar a informação brutal que o doutor acabara de me dar.
— Doutor... o que podemos fazer? — perguntei, tentando manter minha voz estável.
— Se vocês tiverem condições, recomendo procurar um hospital especializado. Aqui, o tratamento será mais lento, e pode ser que não tenhamos tempo suficiente para intervir como ela precisa. O câncer é agressivo, e quanto antes começarmos, melhor.
Assenti, mas minha mente parecia incapaz de acompanhar. Tudo o que eu conseguia pensar era que estava perdendo minha mãe, e rápido.
Após o doutor sair da sala, o silêncio entre mim e Henrique ficou pesado. Eu sabia que ele estava lá, mas naquele momento tudo o que eu queria era ser forte por minha mãe, e essa força parecia escapar por entre meus dedos.
— Você já pode ir, Henrique — falei, minha voz um pouco mais dura do que eu pretendia. — Eu preciso de um tempo sozinha.
— Eu não vou te deixar sozinha nesse momento — respondeu ele, com firmeza. Não havia hesitação em sua voz, mas aquilo me incomodava. Por que ele insistia tanto?
— Você nem me conhece... Não deveria estar aqui — rebati, sem olhar para ele.
Ele ficou quieto por um momento. Quando finalmente falou, sua voz era baixa e calma.
— Me passa seu número, pelo menos.
Eu hesitei, mas depois peguei o celular dele e digitei meu número rapidamente. Parte de mim queria ignorá-lo para sempre depois disso, mas outra parte, talvez a parte que ansiava por apoio, aceitou a ajuda, mesmo sem saber por que.
Ele deu um leve sorriso, como se estivesse tentando confortar de algum jeito, mas tudo que eu conseguia sentir era uma confusão dentro de mim. Antes de sair, ele me olhou uma última vez.
— Qualquer coisa, estou aqui. Não hesite em me ligar.
E então ele saiu, deixando-me sozinha, de frente para a realidade avassaladora. A solidão me abraçou novamente, e eu me virei para minha mãe, tentando ser a filha forte de que ela precisava.
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Chamas do Desejo
RomanceAcostumado a conseguir tudo o que deseja, Henrique inicialmente a vê como mais uma conquista fácil. No entanto, Maitê não é como as mulheres com quem ele está acostumado. Ao ser tratada com desdém e arrogância, ela impõe limites e o rejeita, despert...