Sombras de Hendrik

Capítulo 14: O Caminho das Sombras

Hendrik sentiu uma onda de alívio e medo ao mesmo tempo. Admitir que estava pronto era uma rendição, mas também o início de algo novo. A escuridão não o aterrorizava mais como antes - ela o seduzia, prometendo respostas para perguntas que ele nunca teve coragem de fazer.

"Então, siga-me," Selena disse suavemente, virando-se e caminhando para o corredor escuro que levava ao porão da casa.

Hendrik hesitou por um segundo. A escuridão do corredor parecia engolir tudo à sua volta, como se fosse uma extensão de seus próprios demônios. No entanto, algo dentro dele o impulsionou a seguir, como se aquele caminho fosse inevitável, traçado desde o começo.

Cada passo parecia ecoar pela casa, os sons se misturando com sua própria respiração pesada. As paredes estavam cobertas de espelhos antigos e rachados, refletindo imagens distorcidas de Hendrik e Selena enquanto caminhavam. Ele mal reconhecia o homem que via nos espelhos - seus olhos, uma vez cheios de brilho, agora estavam envoltos em uma sombra densa, como se carregassem o peso de anos de repressão.

Quando chegaram ao porão, Selena acendeu uma única vela que iluminou fracamente o ambiente. O lugar parecia abandonado, coberto de poeira e teias de aranha, mas algo naquela atmosfera sombria parecia estranhamente familiar para Hendrik. Era como se ele já tivesse estado ali antes, mesmo que nunca tivesse posto os pés naquela casa.

"Por que estamos aqui?" Ele perguntou, tentando disfarçar o nervosismo que começava a subir em seu peito.

Selena o encarou por um longo momento antes de responder. "Aqui é onde tudo começou. Onde meu pai, assim como você, fez sua escolha."

Ela apontou para uma pequena mesa no centro do porão. Sobre ela, estava um diário antigo, as páginas amareladas e desgastadas pelo tempo. Ao lado do diário, uma faca com o cabo decorado com símbolos que Hendrik não reconhecia.

"Este diário pertenceu ao meu pai. Ele também lutava contra sua escuridão, mas ao contrário de você, ele não soube como controlá-la. Ele tentou ignorar os sinais, até que foi tarde demais."

Hendrik pegou o diário com cuidado, sentindo o peso da história que ele continha. As palavras escritas em uma caligrafia apressada revelavam os pensamentos de um homem em conflito, alguém que, assim como Hendrik, havia se deixado consumir pela pressão do sucesso e pelas expectativas externas. Mas ao contrário dele, o pai de Selena havia sido destruído por isso, cedendo completamente ao vazio que crescia dentro dele.

"Então é isso que vai acontecer comigo?" Hendrik perguntou, sua voz vacilando enquanto olhava para Selena.

Ela balançou a cabeça lentamente. "Não, Hendrik. A diferença é que você ainda pode escolher. A escuridão não precisa ser sua ruína. Você pode controlá-la, se souber como. Mas isso exige sacrifício."

A palavra "sacrifício" reverberou na mente de Hendrik, o deixando ainda mais inquieto. Ele olhou novamente para a faca sobre a mesa. "O que você quer dizer com sacrifício?"

Selena se aproximou dele, seus olhos fixos nos dele, e respondeu com calma. "Para se libertar da escuridão que te controla, você precisa abrir mão do que mais te prende. E isso, Hendrik, pode ser mais difícil do que qualquer coisa que você já fez."

Hendrik sentiu um arrepio percorrer seu corpo. Ele sabia exatamente do que Selena estava falando. O que o prendia não era apenas o sucesso, a fama, ou a pressão externa. Era algo muito mais profundo - era a imagem que ele criara para o mundo, a máscara que usava todos os dias. Abrir mão disso significava deixar para trás quem ele achava que era.

"Eu não sei se posso," ele admitiu, sentindo uma mistura de desespero e compreensão.

Selena colocou a mão no ombro dele, apertando suavemente. "Ninguém sabe ao certo. Mas, às vezes, é preciso se perder completamente para encontrar quem você realmente é."

A vela na sala parecia tremer com as palavras dela, como se até mesmo a luz fraca estivesse ciente da gravidade da situação. Hendrik olhou mais uma vez para o colar em seu pescoço, sentindo o calor do metal pulsar contra sua pele. Ele não sabia quanto tempo mais conseguiria suportar aquilo - a tensão, a dúvida, o medo do que viria a seguir.

Com uma respiração profunda, ele pegou a faca da mesa e segurou-a com firmeza, sentindo o peso frio do metal em sua mão. Ele sabia que a escolha estava diante dele. Ou ele se entregaria completamente à escuridão, ou encontraria uma maneira de controlá-la.

"Eu estou pronto," ele disse, mas desta vez não parecia estar falando apenas para Selena. Era como se estivesse falando consigo mesmo, tomando a decisão final que moldaria o seu destino.

Selena observou em silêncio, um leve sorriso nos lábios, como se soubesse que aquele momento era apenas o começo do que estava por vir.