Os estilhaços estão no chão, assim como ele.
Meu coração acelera e a adrenalina em minhas veias corre mais rápido, dissipando o torpor causado pelo álcool. Não houve pausa ou surpresa. Ele apenas despencou, como um boneco de ventríloquo com as cordas cortadas. Um peso morto.
Hyuk.
Eu queria mesmo ter feito isso?
Olho de relance para o cano da garrafa ainda entre meus dedos, escorregadio ao redor da palma suada da minha mão. Aperto com tanta força que a única parte inteira do vidro queima contra minha pele. Meus dedos doem, as unhas penetram tão forte a carne quanto se fossem feitas de vidro. Esqueço o que ele disse, minha mente está confusa, girando ao redor do próprio eixo.
Eu o ataquei. Ele merecia uma punição, mas o que eu pensei que aconteceria depois? Iríamos para casa sem eu ter que assumir as consequências dos meus atos? Não. Eu simplesmente não pensei em nada, a dor lancinante berrava com tanto desespero que nenhum pensamento conseguiria gritar mais alto.
Nada é páreo para a fúria de uma mulher humilhada.
Solto o que restou da garrafa com repulsa, deixando-a cair na terra ao lado das pernas estiradas de Hyuk. Um baque seco que reverbera em meu estômago.
Meus olhos estão tão vítreos que sinto minhas córneas secas. Encaro o rosto pálido de Hyuk, a cabeça inclinada em uma posição esquisita, os cabelos se tornando ainda mais escuros, conforme são lavados por seu próprio sangue. A ventania trás o cheiro penetrante até os meus pulmões, o ferro latejante, fluido e fresco. Gostando ou não do que fiz, não vou chamar a polícia, muito menos uma ambulância. Não vou assumir a culpa por uma coisa que ele mesmo causou. Ele, não eu. Tudo isso é por culpa dele.
Aproximo-me, vacilante, e coloco a mão na frente do seu nariz, tentando sentir alguma coisa. Seu peito não está se mexendo, enquanto ele continua perdendo sangue. Meus dedos estão trêmulos, tentando permanecer na mesma posição, sem tocá-lo. Parece uma eternidade até que eu me dê por vencida. Não o sinto respirar.
Matei meu Hyuk.
O filho da puta desgraçado.
Seu rosto parece sereno, embora o vermelho permeie por sua pele, em uma linha que rasteja da testa até a orelha, e cacos de vidro escondam-se ao redor dos fios do seu cabelo. Ele está um caos.
Minhas pernas tremem outra vez e quase caio em cima dele. Preciso me apoiar no carro para erguer o tronco. A realização de que estou em uma cena de crime se abate sobre mim, fazendo-me perder o ar por um segundo. Uma vibração crescente em meu peito me implora para que eu a liberte. Quero gritar de frustração, quero cair de joelhos e chorar porque ele deixou que seus amigos me ofendessem, quero me livrar dele, não só para me salvar, mas porque meu coração ainda dói. Por ele.
Meu punho está fechado contra o carro, estou socando a lataria e só percebo quando a dor se espalha pelo meu braço. Sou uma idiota que está deixando as digitais por toda a parte.
— Porra, que desgraça — murmuro, limpando o lugar onde apoiei minha mão com a minha bolsa. O tecido macio esfrega a lataria, mas os fechos e botões arranham a pintura no processo, deixando rabiscos horríveis na caminhonete prata.
Não que Hyuk vá voltar para ver isso. Mas só o pensamento faz a minha coluna fisgar.
Me afasto do carro antes que eu encoste em mais alguma coisa. Preciso sair daqui antes que alguém nos veja. Por sorte, Hyuk estacionou na pior vaga que tinha disponível. Tão longe da festa como estamos, não há uma boa iluminação. Deve ser difícil ver de longe, mas não sei se estou pensando racionalmente ou apenas tentando me convencer de que estou segura pela penumbra.
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Não Descanse em Paz
RomansaCassandra Villani matou seu primeiro amor. Eles estudavam na mesma faculdade, trocaram dois olhares e um total de zero palavras, mas o estrangeiro Song Hyuk ganhou o coração da garota simplesmente por existir. Coração ou obsessão. Quando ela é reje...