O que há entre nós

Capítulo 03

A semana passou mais rápido do que eu esperava. As primeiras dificuldades começaram a se dissipar e, aos poucos, fui me acostumando com o ritmo frenético do restaurante. O cheiro da comida, a bagunça da cozinha, os pedidos apressados – tudo foi se tornando parte da minha rotina. Fui me enturmando bem com a equipe e já me sentia confortável naquele novo ambiente. Suzana me fazia rir com suas piadas, João sempre tinha uma história engraçada, e Marta, com sua energia positiva, parecia sempre disposta a me dar conselhos. Até Junior, com seu jeito distante, começou a me ajudar, oferecendo dicas discretas e, de alguma forma, me fazendo sentir mais segura.

Mas naquele dia, o que eu menos esperava era que uma simples entrega de pedido mudaria tudo.

Eu estava indo para a cozinha quando ele entrou.

Ele apareceu sem fazer muito barulho, mas sua presença era impossível de ignorar. Alto, forte, com ombros largos e um porte que transmitia poder. Ele vestia botas de couro, jeans justos e uma camisa xadrez que, embora simples, se ajustava perfeitamente ao corpo musculoso que ela cobria. Seus cabelos loiros estavam levemente desarrumados, mas nada ali parecia fora de lugar. E seus olhos… olhos azuis, intensos, que pareciam atravessar qualquer um que ousasse olhar para ele. E a barba, bem aparada, completava o conjunto, dando-lhe um ar ainda mais imponente, como se tivesse sido esculpido por mãos divinas.

Era impossível não notar sua beleza. Ele era como um anjo caído, a combinação de força e perfeição que faria qualquer um se sentir pequeno perto dele. Mas não era apenas sua aparência que chamava a atenção. Havia algo nele, uma aura de poder e perigo, como se ele estivesse acostumado a ser o centro de tudo, o tipo de homem que comandava a atenção de todos ao seu redor.

Eu, no entanto, não sabia quem ele era. Não fazia ideia de que estava diante de um dos homens mais poderosos da cidade. Não sabia que ele era o maior fazendeiro, um homem temido e respeitado. Para mim, ele era apenas mais um cliente.

Ele se sentou em uma mesa no canto, sem sequer olhar para mim, o que me deu a sensação de que ele preferia não ser incomodado. Eu me aproximei para pegar o pedido, com a sensação de que ele não me notava, nem mesmo quando me aproximei para cumprimentá-lo.

“Boa tarde, senhor. O que posso trazer para o senhor hoje?” Perguntei com a voz o mais firme que pude, mas meu estômago estava apertado de nervoso.

Ele não respondeu de imediato, seus olhos estavam fixos no cardápio, como se eu não fosse mais do que uma sombra que passava por sua mesa. Quando, finalmente, ele levantou os olhos para mim, foi com uma indiferença que parecia cortar o ar. Não me olhou diretamente, mas apenas me avaliou de cima a baixo, com um olhar frio, como se eu fosse apenas mais uma funcionária do restaurante, sem importância.

“Um suco de laranja,” ele disse de forma brusca, sem tirar os olhos do cardápio.

Eu acenei, anotando rapidamente o pedido, mas não consegui evitar o desconforto crescente. A forma como ele se comportava, como se eu fosse invisível, me fez sentir como se fosse uma criança que não merecia sua atenção. Ele não demonstrava qualquer tipo de cordialidade, e a distância entre nós parecia aumentar a cada segundo.

Quando finalmente trouxe o pedido dele, a tensão entre nós era palpável. O cheiro da comida na bandeja, o som suave dos talheres, tudo parecia muito distante. Coloquei o suco na mesa dele, com cuidado, tentando não fazer mais nada que chamasse atenção. Mas, no exato momento em que me virei para ir embora, bati com a cintura na mesa, fazendo com que o copo derramasse diretamente sobre a mesa, encharcando tudo com o líquido amarelo.

O mundo pareceu parar.

Eu congelei por um instante, sentindo o pânico se espalhar por minhas veias. O suco, agora derramado em cima do pedido, manchava tudo, e eu não sabia como reagir. Olhei para ele, esperando algum tipo de reação, e foi então que vi a expressão dele se transformar.