"Anseios e Revelações"

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Era mais um daqueles dias. Ekko saiu cedo, e Jinx se encontrou sozinha outra vez. A pilha de livros na caixa parecia atraí-la cada vez mais. O novo interesse despertado pelas páginas começava a se intensificar. Até então, ela via o conteúdo dos livros como algo distante e quase ficcional, mas agora as descrições e sentimentos que lia pareciam despertar algo muito mais pessoal e real.

Ela se recostou na cama, folheando mais um daqueles livros, enquanto cada linha despertava uma curiosidade nova e a fazia imaginar como seria experimentar o que estava lendo. Os personagens viviam experiências tão intensas e desconhecidas para ela, e cada sensação descrita parecia saltar das páginas, ganhando vida em sua mente. Jinx já havia experimentado a adrenalina de uma explosão, o êxtase de uma fuga e a satisfação de uma vitória, mas a intensidade de um toque ou a profundidade de um sentimento como o descrito ali eram algo diferente, quase incompreensível para ela.

Aos poucos, as páginas começaram a lhe despertar uma sensação de vazio — como se algo estivesse faltando em sua própria vida. Uma parte dela sempre se contentou em viver o caos e a liberdade, sem laços ou amarras que pudessem limitar sua natureza. Mas o que aqueles livros lhe mostravam era um tipo de experiência que ela jamais havia considerado.

Os pensamentos se emaranhavam em sua mente e, antes que percebesse, um desejo começou a brotar, crescendo de forma quase incontrolável. Não era apenas curiosidade sobre o que os personagens viviam; era uma vontade de sentir aquilo por si mesma, de sair do mundo de papel e tinta e experimentar aquelas sensações na vida real.

A tarde foi avançando enquanto Jinx se afundava nos livros, imersa nesses novos pensamentos. Sua mente pulava de página em página, absorvendo cada detalhe, cada palavra, cada emoção descrita. E a cada parágrafo, crescia a certeza de que talvez fosse hora de mudar alguma coisa. Talvez Ekko estivesse certo ao querer mantê-la segura, mas será que ela mesma queria isso? A verdade era que ficar ali, sozinha, já não parecia suficiente.

Então, ouviu o som da porta se abrindo. Ekko voltou mais cedo do que o normal, e ao ver Jinx com o livro em mãos, ele arqueou uma sobrancelha, uma mistura de curiosidade e uma pontinha de constrangimento, como se já imaginasse o tipo de leitura que ela estava fazendo.

— Ah, você tá aí com… eles — disse ele, tentando não rir enquanto largava a mochila ao lado da porta.

Jinx fechou o livro devagar e o colocou de lado, um tanto hesitante. Estava perdida em pensamentos, e, ao olhar para Ekko, uma ideia se formou em sua mente. Aquela era uma oportunidade que ela não queria desperdiçar, um momento em que talvez pudesse compartilhar um pouco do que sentia, ou ao menos descobrir o que ele pensava sobre tudo aquilo.

— Ekko — começou ela, com um tom meio enigmático —, eu tava pensando… sabe, tem um tempão que você sai e eu fico aqui. E eu… eu comecei a querer… — Ela pausou, buscando as palavras certas. — Comecei a querer entender melhor esse… mundo aí que eu ando lendo.

Ekko a olhou com um misto de curiosidade e surpresa.

— Entender… que tipo de "mundo", exatamente? — Ele perguntou, um sorriso tentando surgir no canto dos lábios, mas ao mesmo tempo mantendo uma expressão sincera.

Jinx hesitou um pouco antes de continuar, quase sentindo as palavras pesarem em sua boca.

— Bom, eu tô falando de sair por aí, sabe? Conhecer pessoas… quem sabe até encontrar alguém que… se interesse por mim. — Ela olhou para ele, um pouco desafiadora. — Talvez eu precise de um namorado, Ekko.

A palavra "namorado" parecia ecoar pela sala, quase como uma explosão. Ekko congelou por um segundo, com uma expressão que Jinx nunca havia visto nele. Ele sempre fora tão sério e responsável, mas ali, naquele instante, havia uma intensidade no olhar dele que a deixou ainda mais intrigada. Ela observou o rosto de Ekko mudar sutilmente, como se ele estivesse tentando processar o que acabara de ouvir.

Ele pigarreou, tentando manter a compostura.

— Um… namorado? — repetiu, sem saber exatamente o que dizer. Ele baixou o olhar por um momento, e Jinx percebeu que ele tentava esconder uma expressão que beirava o desconforto.

Jinx aproveitou a oportunidade, empurrando a situação com seu jeito provocador.

— É, um namorado, Ekko. Já imaginou? Seria divertido ter alguém pra explorar o que eu ando lendo nesses livros… Eu nem sabia que existiam essas coisas antes! Só descobri porque você deixou esses livros por aí. — Ela riu, divertida, mas havia uma verdade por trás daquela frase que parecia afetar Ekko de forma inesperada.

Ekko fechou os olhos por um segundo e respirou fundo, tentando organizar seus pensamentos. Aquela possibilidade de Jinx encontrar alguém mexia com ele de um jeito estranho, um sentimento que não sabia bem como nomear. Ele sempre se considerou protetor com ela, mas essa ideia de "namorado" parecia algo mais profundo, algo que lhe despertava um desconforto que ele não sabia lidar.

— Olha, Jinx… não é que eu ache ruim você querer… explorar, conhecer gente. Mas você não acha que é meio perigoso? Digo, Zaun não é o lugar mais seguro pra… esse tipo de coisa. — Ele tentava se manter racional, mas, no fundo, sabia que estava apenas disfarçando algo mais. — E… além disso, você… nunca pareceu interessada em ter alguém assim. De onde veio essa ideia?

Ela deu de ombros, mas o brilho nos olhos denunciava que havia pensado bastante nisso.

— Veio dos livros, oras. Eu não sabia que essas coisas podiam ser tão intensas… tão… sei lá, envolventes. Aí fiquei curiosa. E você tá sempre saindo, então, por que eu deveria ficar aqui parada?

Ekko a encarou, tentando manter a calma. Mas o simples pensamento de Jinx se envolvendo com alguém mexia com ele. Não era só preocupação; era algo mais profundo, um medo estranho de perdê-la para outra pessoa, alguém que talvez não entendesse quem ela realmente era ou não a tratasse com o cuidado que ele achava que ela merecia.

— É que… — Ekko parou, procurando as palavras. — Não quero que você se machuque, Jinx. As coisas que você lê aí… elas parecem fáceis nos livros, mas a vida real é bem diferente.

Ela soltou uma risada curta, como se achasse graça naquilo.

— Tá dizendo que eu não aguentaria? — provocou ela, cruzando os braços. — Você sempre acha que eu preciso ser protegida, Ekko. Mas a verdade é que eu sei me cuidar. E talvez eu precise de algo novo. Eu tô cansada de ser sempre a "protegida" aqui.

Ekko engoliu em seco, sem saber como responder. Ele sentia uma pontada de ciúme, como se a possibilidade de Jinx se afastar dele para encontrar alguém fosse mais dolorosa do que imaginava. Mas, ao mesmo tempo, sabia que não poderia impedi-la. Ela era livre, impulsiva, e era isso que ele mais admirava nela. Ele queria vê-la feliz, mas o pensamento de outro alguém ao lado dela trazia uma sensação de vazio que ele não sabia explicar.

Depois de um silêncio longo, Ekko suspirou.

— Bom… se é isso que você quer, não vou te impedir. Só… tome cuidado, tá? Você sabe que, se precisar, eu vou estar por perto.

Jinx o encarou por um segundo, parecendo avaliar a sinceridade dele. Talvez houvesse algo nas palavras de Ekko que ela não tinha considerado até então, uma preocupação que ia além da amizade e proteção. Era quase como se, naquele momento, algo invisível entre eles começasse a mudar, mas nenhum dos dois estava preparado para reconhecer isso.

— Vou sim, Ekko. Eu sei que você tá por aqui. — Ela sorriu, um sorriso leve, mas cheio de algo indefinido. A ideia de sair e experimentar aquele mundo novo ainda a excitava, mas, de alguma forma, o olhar de Ekko também a fazia se sentir menos sozinha do que imaginava.

Enquanto ele se afastava, Jinx sentiu que a casa estava mais cheia de perguntas do que respostas. E, pela primeira vez, ficou confusa com algo que os livros não conseguiam explicar.

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