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Fui conduzido por Rose até a porta do meu novo quarto que estava bem longe de ser exatamente novo. A porta de madeira estava lascada, se passasse a mão por ela, farpas ficariam presas nos dedos — o que realmente acabou acontecendo durante os meses em que morei no Colégio São Dimas.

A maçaneta já estava amarelada, assim como os números metálicos 9 e 4, sendo que o segundo estava pendendo para o lado direito. Assim que Rose abriu a porta, meu olfato foi o sentido mais rápido a ser aguçado. Persegui o cheiro de cigarro com o olhar, até encontrar um garoto sentado na beirada da janela. Ao perceber nossa presença, ele apagou o cigarro e sorriu para nós.

— Rose, você está adorável! E você deve ser... Bernardo? Muito prazer, eu sou Felipe. Seu novo colega de quarto e possivelmente melhor amigo— ele estendeu a mão que cheirava nicotina.

Felipe era um cara que poderia, muito bem, estampar a capa de uma revista feminina. Era bem alto, cabelos castanhos perfeitamente bagunçados, olhos claros e dentes brancos alinhados. Ele usava o uniforme do colégio: terno preto, camisa branca, sapatos sociais pretos bem engraxados e, o toque principal, uma gravata vermelha.

—Você mostra o colégio para ele, Felipe? — perguntou Rose, com a voz um tanto trêmula. Seu olhar corria pelo quarto, mas sempre terminava no garoto. Era um ciclo vicioso: olhar perdido por alguns segundos, rosto rubro e mão no crucifixo. Imaginei o quanto Rose estaria se culpando ao sentir atração por um rapaz de dezoito ou dezenove anos. Aposto que ela estaria cumprindo a função de ser uma pecadora arrependida.

— Claro, querida! —Sorriso. Olhar perdido. Mão no crucifixo. Segundos depois, Rose se retirou, batendo a porta com um pouco mais de força que o normal. — E aí, Bernardo, qual crime horrível você cometeu para vir parar aqui no colégio de adolescentes perigosos? — disse Felipe, se jogando na cama que parecia pequena demais para os seus quase dois metros.

— Eu... — meu estômago revirou. Não queria falar sobre isso com alguém que eu acabara de conhecer.

— Fique tranquilo, cara. Ninguém aqui é criminoso de verdade. Somos apenas pessoas que os pais ficaram com preguiça de sustentar por causa de um probleminha ou outro. Eu, por exemplo, estou aqui porque gosto de uma genitália que culturalmente meus pais não estavam prevendo que eu fosse gostar. — Felipe completou mais rápido do que eu consegui processar: — Estou falando de pênis, cara. Meus pais consideram minha sexualidade um crime tão grande quanto roubar um banco, por isso me colocaram aqui. Não vejo problema, já que tem uns caras bem gatos neste colégio. Você se importa se eu fumar? —fiz que não com a cabeça. Felipe falava sem respirar, as informações caindo sobre mim como se eu estivesse debaixo de uma cachoeira. — E aí, qual é a sua história? Cara, você não precisa ficar em pé aí o tempo todo. Essa cama é sua.

Caminhei pelo chão de madeira até minha nova cama. Sentei no colchão sem fronha, fazendo uma análise mental do que seria meu 'ninho' nos próximos meses. Confortável, porém um rangido grosseiro soou logo que me sentei. No último mês, eu me mexia dormindo durante a noite inteira. Espero que meu colega de quarto não se incomode com isso.

— Eu... Meio que me envolvi em uma merda com meu primo. — ergui os ombros.

— E que merda foi essa?

— É... Eu...

— Você não quer contar. Tudo bem! — Felipe ergueu as mãos — Esse é o nosso quarto. Você pode me contar quando quiser, mas eu sou bem curioso, então não enrole. A sua história é o seu cartão de visita por aqui. Agora, vamos conhecer este colégio ma-ra-vi-lho-so.

A Última Gravata VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora