12.

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Eu jamais te causaria dor de cabeça, Bernardo.

Aquela voz ecoou quando tropecei. A luz da lua fazia com que as sombras dos galhos parecessem esqueletos se arrastando pelo chão. Eu não sabia como e nem o porquê, mas eu andava por entre as árvores como se quisesse chegar a algum lugar. Abaixei a cabeça e percebi que tropecei em um galho muito atípico.

Ajoelhei na grama e, quando o toquei, percebi que estava muito longe de ser um galho. Era, na verdade, um braço. Ao redor não havia grama, apenas areia. Comecei a cavar até que todo o braço, ante-braço e mão estivessem fora do chão. Os dedos estavam azulados, frios, sujos e duros como pedra. Peguei a mão e fiz força, puxando o corpo para fora.

A cabeça emergiu da areia, completamente suja. Apesar das feridas ao redor da boca e da bochecha, reconheci o rosto de Jorge. Aqueles machucados foram causados pela mim, pelas minhas digitais. Se alguém o encontrasse, eu seria culpado. Eu bati, eu matei, eu escondi o corpo.

Antes que eu pudesse me desesperar, senti a mão fria apertar meu calcanhar.

— Não! — gritei, me esquivando e, logo em seguida, tropeçando em outro "galho", dessa vez muito maior. Era um corpo de mulher estatelado no chão. Ela sequer fora enterrada. Estava exposta, destroçada e queimada, os cabelos bagunçados com sangue — Socorro!

— Por que você está pedindo socorro, Bernardo? Você fez isso — uma voz masculina surgiu de trás de uma árvore. Meu primo apareceu, sorrindo para mim. Os dentes brancos estavam sujos de sangue — Ou será que fui eu?

— Por favor, pare! — minha voz começou a falhar enquanto meu corpo tremia — Por favor... Eu não... — fui interrompido por uma camada grossa de água gelada que caiu sobre mim.


Desculpe. — disse Felipe, quando eu abri os olhos. Minha cama e meu corpo estavam encharcados, mas eu não estava mais perdido entre as árvores. Não havia Jorge, a mulher e nem meu primo. Toda aquela situação não passara de um maldito pesadelo. — Você estava gritando e não parava de se mexer, a sua cama estava rangendo muito. Tentei te acordar do jeito normal, mas enfim...

— Obrigado. — eu disse, levantando da cama. Felipe sorriu, aliviado, jogando o balde para o lado e me dando um abraço.

— Você está bem?

— Não sei... — resmunguei, o rosto apertado contra o ombro dele. Todos meus órgãos ainda estavam acelerados por causa do sonho, a mão do cadáver parecia tão viva contra o meu calcanhar. Não fazia sentido eu sonhar com a morte de Jorge. Ele estava vivo, não estava? A menina de vestido azul me prometera que tudo ficaria bem... Mas isso não indicava que Jorge estaria vivo. — Qual é o número do quarto de Jorge? Preciso falar com ele. Agora.

— Calma aí, Bernardo. Você estava sonhando com o meu ex? — Felipe riu, as sobrancelhas arqueadas. — Bom, isso é irônico, porque acabou de escorregar uma carta dele por baixo da nossa porta. Seja lá o que você precisa falar com ele... — O meu colega andou até a cômoda e arrancou um papel amassado da gaveta. — Agora é tarde. É uma carta de despedida, ele está indo embora.

— Você o viu? — perguntei, ainda acelerado — Ele entregou a carta nas suas mãos? — eu conseguia imaginar a menina de vestido azul curvando-se sobre um papel, forjando uma carta. Escrevendo uma ou duas palavras em espanhol para despistar. Afinal, quem era aquela garota? Do que ela seria capaz? Por que diabos eu deixara Jorge aos cuidados dela?

— Bernardo, você está me assustando... — o sorriso de Felipe desapareceu — Não, ele não me entregou a carta. Bateu na porta e passou o envelope pelo vão que a separa do chão. Só isso.

A Última Gravata VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora