Capítulo X

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Era noite após o embate na floresta. Ao procurar pela garota há algum tempo, o mascarado desistiu. Andou por um longo trajeto, mas percebeu que a fugitiva só teria escapado pelo uso de feitiços. De outra forma já teria sido capturada.

Estava voltando pelo caminho que viera, passando por entre árvores altas, sem folhas, já que estas apodreciam no chão em meio às raízes e mato seco. Avistou ao longe dois vultos, ambos encapuzados. Sabia do que se tratava, embora não estivesse gostando da situação.
- A garota escapou?! - perguntou o vulto mais alto, enquanto o menor apenas observava. O mascarado balançou a cabeça de forma positiva.
- Não vão gostar de saber disso. Ela estava com o livro, você desperdiçou a maior de todas as oportunidades. - completou o vulto menor, de forma pretensiosa. Calmamente, o paladino caminhou até os outros dois, ficando frente a frente com eles.
- O que vocês querem?! - disse com uma voz grossa e gélida.
- Apenas viemos conferir seu trabalho, e relatar possíveis... - ponderou o vulto maior, tentando escolher as palavras corretas, enquanto o menor completou a frase.
- Falhas! Ao Conselho.
- Não houveram falhas. A garota está onde deveria estar. Onde eu quero que esteja. - o mascarado disse, retomando o seu caminho ao passar pelos outros dois.
- Você tem certeza disso?!
- Não quer mesmo posicionar a caça de hoje como um fracasso!? - disseram de forma irônica.
- Apenas fiquem fora do meu caminho. - disse por fim o mascarado, sumindo pela névoa que tomava a floresta.
Os dois vultos se entre olharam, por fim o menor quebrou o silêncio.
- Espero que ele tenha se redimido.
O vulto maior riu de forma esquizofrênica.
- Não sei o que seria pior.

Ainda era madrugada quando o mascarado chegou à encosta. Em meio ao descampado, ruínas da antiga casa dos Hawkeye, cercadas por fitas de limitação. A casa houvera sido destruída na noite anterior, ao que tudo indica, por algum poderoso feitiço, o que chamou a atenção do paladino para o local. Ao passar pelas fitas, o mascarado adentrou o que sobrara da residência.
Havia muito entulho, muitas cinzas e o cheiro de queimado era bastante forte. Parte da parede da frente ainda estava em pé, assim como a grande porta de entrada, por onde ele havia passado. No local onde seria o salão central da casa, apenas um lugar tivera resistido. Uma parte no chão, coberta por um tapete apodrecido, chamuscado nas beiradas.

O mascarado retirou o tapete do local, revelando o círculo rúnico desenhado em vermelho no chão. Atravessou novamente pelo portal da entrada, se colocando pra fora da casa e fechando a porta com certa dificuldade, já que o chão a sua volta estava abarrotado de entulho. Ao fechá-la completamente, murmurou algumas palavras com sua voz grossa e fria. Voltou a abrir a porta e adentrou o local outra vez. Havia retornado ao salão, completamente destruído pelo fogo, porém em poucos instantes, tudo começou a se desfazer, como se o local e objetos estivessem se desmanchando em partículas de poeira, e revelando um novo local, com novos objetos e uma outra presença.

- Eu sabia que você viria até aqui. - disse a voz fraca de uma velha, deitada em uma cama simples, em um quarto branco com pouca mobília. Era Laura Hawkeye, mãe de Rachel, a presa do mascarado.
- Então sabe que teremos uma longa conversa...
- Estive esperando por isso.

Os dois vultos andavam em um corredor feito de pedras, tochas adornavam as paredes, o teto era alto e pouco se via, mas também era feito de pedras. Chegaram à uma escadaria, tomaram uma tocha e voltaram a subir.
- O que acha que ele dirá?! - questionou a figura mais baixa.
- Ele tem apreço por aquele paladino. No mínimo concordará com o que foi dito. - respondeu a figura maior, com a tocha em mãos.
- Em outras épocas, esta fuga custaria sua vida... A Ordem não perdoaria tamanha falha...
- Cuidado com o que diz, desta forma parece questionar as atitudes do Sumo Sacerdote... Isto também custaria sua vida... E estamos próximos de seus aposentos, dizem que ele pode escutar, mesmo a esta distância.
- Você tem razão... Pagarei penitência mais tarde.
Os dois chegaram ao topo da escadaria, uma grande porta de madeira grossa e escura, adornada com detalhes em ouro coroava o local, havia um grande lustre acima de suas cabeças, no teto alto. Eram os aposentos do Sumo Sacerdote da Ordem, aquela que houvera exterminado as famílias guardiãs do Livro das Sombras anos atrás.
Os dois se ajoelharam perante a porta, fazendo uma reverência. A figura menor tomou a palavra.
- Senhor, trazemos o relatório sobre as atividades do quinto. - disse com uma mistura de sorriso e desprezo no rosto.
Esperaram por um momento, a porta, com um estalido, abriu-se. Do interior do quarto escuro, uma figura ainda menor que o sacerdote ajoelhado aparecera caminhando lentamente, usando uma bengala para se apoiar, vestia um manto parecido com o dos sacerdotes, porém com uma cor verde oliva. Tinha os cabelos brancos penteados para trás e barba cheia porém curta e bem tratada.
- Digam-me. São boas ou más notícias?
Os dois se entre olharam, o sacerdote maior tomou a frente, engolindo em seco.
- Suponho que não, senhor. A presa conseguiu fugir do quinto. Utilizou encantos para esconder-se e está em posse do Livro.
- O quinto não nos disse para onde iria após sua falha, voltamos para lhe trazer esta notícia. - completou o outro.
O Sumo Sacerdote suspirou, deu de costas para os dois, e voltou para o quarto escuro, caminhando lentamente.
- Chamem o quarto, peçam para ir atrás da presa, e mandem o terceiro ficar de olho no quinto. Qualquer novidade voltem. Não quero ouvir mais falhas.
Ao entrar, a porta fechou-se atrás do velho. Os dois sacerdotes se levantaram.
- Satisfeito com a decisão?! - questionou o maior.
- Surpreso, mas não satisfeito.
Os dois sorriram, desceram as escadarias desaparecendo no túnel escuro.

SPELL - O Livro das SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora