D. Salvatore

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Eu não sabia dizer se ter Bonnie todos os dias ao meu lado era estar no céu ou se seria certo dizer que eu estava no inferno.

Ah, sim, eu poderia simplesmente confundir meus dias com o paraíso. Afinal, ela estava lá, linda de morrer com seus cabelos exalando jasmin, a voz de anjo soando perto de mim e sua risada melodiosa contagiando toda a atmosfera ao nosso redor.

Era o paraíso porque eu e ela havíamos nos aproximado muito - muito em relação ao que já éramos próximos, o que era quase nada, quase nada mesmo -. No colégio não é como se fôssemos de uma hora para outra ser inseparáveis e nos tornar os destemidos Batman e Robin. Para falar a verdade, nossa relação no colégio continuava a mesma. Eu a observando em silêncio e me arriscando para a ajudar em história. Ela ainda me defendia de Klaus e sua dupla Bob Esponja e Patrick, mas depois do que houvera na aula do professor Saltzman ele havia me deixado um pouco de escanteio. E isso eu agradeci aos céus! Agora eu poderia ser o que eu sempre fui, invisíveis a todos, e eu sempre fui muito bom nisso diga-se de passagem e sem querer parecer pretensioso.

Mas nossa distância acabava quando um pouco depois do colégio ela surgia na Pizzaria e começava a passar a tarde comigo fazendo pizzas e aprendendo como rechear e preparar o forno à lenha.

E era nessas horas que o paraíso era sentido por meus dedos. Era a hora em que eu poderia arriscar alguns esbarrões de leve. Sempre muito sutil, sempre "acidentalmente" meus dedos buscavam a mesma coisa que ela, ou eu ia na direção oposta e nossos ombros se chocavam. E qualquer mísero toque que minha pele havia com a dela, uma forte e poderosa corrente elétrica passava pelo meu corpo. Eu sentia os pêlos de meu braço e meu pescoço se eriçando e uma mini parada cardíaca se apossava de mim. Por dentro era tudo tão bagunçado e descompassado, ficava perdido e com medo de ser achado. Mas por fora a coisa era pior. Eu odiava o fato de ser tão branco a ponto de corar com tanta facilidade entregando-me assim o estado de constrangimento e de timidez extrema.

E odiava o fato de meu pai ser a discrição em pessoa.

E com ele que surge a sensação de estar no inferno em plena terra.

Meu pai nunca foi discreto, nunca foi de falar baixo e sério, ele nunca foi o tipo de pai que percebe quando está constrangendo o filho falando para a garota que ele ama os seus atributos físicos e o quão sensível ele pode ser.

- Ah, Bonnie, não entende o quão bom partido mio Damon é! - o sotaque forte e cantado sorria enquanto a menina apenas acentia sorrindo divertida - Io no quero me gabar, mas olha... Quando eu o fiz, ah! Mas eu caprichei que saiu essa belezura, anh! - e soltou um beijo estalado na ponta de seus dedos fechados. - Sensível, atencioso, muito inteligente, e olha, tem bom fôlego e disposição! Muito bem preparado para... sabe, né?

E a piscadela maliciosa foi a gota d'água. No minuto seguinte minha mãe - que eu chamei implorando como um tomate maduro para dar um jeito no marido - já puxava papai para longe de Bonnie que ria divertida. Ela só fazia isso quando meu pai estava perto e começava a falar de mim.

Ela não parecia se importar com as bobeiras que ele dizia, ela não ficava sem graça ou achava que ele era inconveniente, como eu achava. Ela só gostava desses momentos em que ele vendia o produto. E eu ficava aliviado por ela não ver com maus olhos.

Mas uma parte de mim não era apenas alívio, outra parte de mim ficava um pouco frustado. Poxa, meu pai se empenhando para mostrar minhas qualidades e ela apenas achava graça. Será que ela não conseguia ver que apesar de sem noção, o meu pai não era mentiroso.

Eu era sim, como ele falava: Uma belezura!

Mas, eu sabia que não era o bastante para ela. E sabia também que nunca seria.

Amor é um ClichêOnde histórias criam vida. Descubra agora