Capítulo 7

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Eu tava deitado no sofá. Dessa vez eu tava com as costas no assento, as pernas no encosto e os pés na parede. Gostava de inovar. De cabeça pra baixo eu via na tela da televisão algumas pessoas brigarem por algum motivo qualquer. Qual seria o tema daquela terça-feira? Será que a filha queria fazer uma tatuagem contra a vontade da mãe? Ou será que a vizinha escutava música alta toda noite? Eu nem me importava direito. As histórias se misturavam nesses programas de auditório. Mudei de posição, deixando as pernas caírem no chão, e peguei o controle remoto. Programa de receitas, jornal regional, programa de entrevistas, filme chato e outro programa de entrevistas. Cadê os desenhos? Dei a volta nos seis canais duas vezes e parei de novo na briga. Agora parecia que a apresentadora estava mediando o conflito.

– Meu filho, senta direito! Vai fazer mal pra sua coluna – disse minha mãe.

– Faz não, mãe – meus olhos vidrados na TV.

– Não faz agora, mas quando você estiver mais velho você vai sentir dor nas costas.

– Tá bom – me sentei direito no sofá.

– Já fez o dever todo?

– Uhum...

– Até o de inglês?

– Até o de inglês – respondi, com os olhos ainda vidrados na TV, enquanto fazia a volta em todos os canais de novo.

– Muito bem, muito bem. O que cê acha da gente ir ao cinema, então?

Desviei o olhar da tela e sorri pra minha mãe. Meia hora depois já estávamos no carro. Eu sorria e olhava pra fora, examinando os outros carros na garagem do prédio.

– Tomou banho direito, Guilherme? Tô querendo saber mais de você ficar me tapeando com essa história de tomar banho mal tomado não, hein?

– Claro que tomei, mãe!

– Tá certo... – o carro terminava de subir a rampa da garagem pra chegar no mundo exterior – Como é que tá a escola, filho?

– Tá tudo bem.

– Tá fazendo amizades na escola nova?

– Ah, tá normal.

– Normal? Tem algum amiguinho novo?

– Que filme que a gente vai ver, mãe?

Minha mãe se preocupava comigo. Ela pensava muito em mim, no quanto eu era sozinho. Assim, ela não chegava a pensar que tinha algo de errado comigo. Eu era uma criança meiga, sempre sorrindo e abraçando meus pais. Mas é que eu nunca tinha sido de ter muitos amigos. Passava os dias na frente da televisão. Qualquer tentativa que ela fizesse pra me forçar a sair e brincar não dava certo. Ela pensava nisso e logo emendava, lembrando que eu não tinha nenhum problema com notas ou com o comportamento na escola. Sempre estava entre os primeiros da classe e era elogiado pelos professores. A única coisa que ela tinha que me forçar a fazer eram as aulas de natação duas vezes por semana. E eu ia.

– Eu não sei, meu filho. Você tem alguma escolha?

– Eu queria ver "O Diário da Princesa". Vamos?

Minha mãe olhou pra mim. Aos olhos dela eu era o menino mais lindo, o mais inteligente, o mais charmoso, o mais sensível... Eu era o seu filho.

– Vamos! – respondeu, sorrindo.

***

Abri meus olhos e olhei pro relógio. Quinze pras sete da manhã, hora de levantar pra começar o dia, ir pra aula. Quinta era dia de Direito das Obrigações e eu tava precisando focar mais nessa matéria. Abracei meu travesseiro, como se estivesse me segurando em alguém. Nossa! Que sono! Mas eu tinha que levantar... Fechei os olhos e me convenci que em trinta segundos abriria de novo. O sono vinha seduzir meus pensamentos, tentar me levar de novo pro sonho... O que era que eu estava sonhando mesmo? Não guardava nenhuma lembrança, mas me parecia algo tão interessante. Não! Era hora de acordar! De abrir os olhos. Mas eles estavam tão pesados... Na luta que acontecia na minha cabeça, em uma fração de segundo eu pensava na aula que começaria às oito, mas também no frio que fazia do lado de fora da minha cama. Na vontade de fazer xixi, mas também nas três faltas que eu podia ter por semestre. Como eu dormia de janela aberta, de manhãzinha estava uma brisa gelada... E enquanto eu pensava, puxei a coberta pra me esquentar melhor. Mesmo com a coberta me aquecendo, ainda estava um pouco desconfortável e decidi virar de lado pra pensar melhor na aula e no sono. Fechei meus olhos por cinco, seis minutos no máximo. Só aqueles minutinhos não iam fazer falta. Instantes depois abri meus olhos novamente e já eram onze da manhã! Ah não, que saco! Já não era a primeira vez que isso acontecia.

Machos AlfaOnde histórias criam vida. Descubra agora