3 - TRISTÃO E ISOLDA

431 60 4
                                    

Chego mais perto da escrivaninha e observo os incríveis desenhos em cima dela. São desenhos de objetos, pessoas e até algumas paisagens. Eles são bonitos, com certeza feitos por alguém com muito talento.

— Joe está tudo bem? — James pergunta, preocupado com o silêncio repentino.

— Ah Sim, é que eu fiquei admirado com os desenhos que estão em cima da escrivaninha.

— E o que você achou?

— Eles são encantadores, tem um traço diferente, feitos por um verdadeiro artista.

— A maioria das pessoas fala isso, sempre acho que é só pra me bajular, mas em você eu acredito.

— Foi você que fez esses desenhos? — pergunto sem acreditar.

— Foi. Eu já desenhava antes de perder a visão, isso facilita. Depois eu aprendi algumas técnicas e continuei desenhando mesmo assim. Claro que não é a mesma coisa, não tem tantos detalhes como eu gostaria.

— Você é muito bom.

— Obrigado — ele diz um pouco envergonhado.

— Você gosta de ler? — pergunto espontaneamente ao observar melhor as suas prateleiras, então percebo a besteira que perguntei e logo me corrijo. — Me desculpe eu não...

— Está tudo bem — ele levanta e segura a minha mão, fazendo meu coração voltar a pular. — Eu amo ler, aprendi a ler em braille e ouço audiobook também então...

Volto a observar uma das prateleiras e encontro uma das minhas histórias favoritas.

— Você tem Tristão e Isolda — comento, soltando a sua mão da minha e pegando o exemplar do livro. — Eu sempre quis ler essa edição — digo feliz ao folhear as páginas.

É uma linda edição, a capa tem o desenho do Tristão pensando na Isolda, que tem o seu rosto desenhado bem fraquinho no fundo da capa, o texto tem uma boa diagramação e durante a história tem várias ilustrações coloridas.

— Eu comprei esse exemplar quando ainda enxergava, mas não tive tempo suficiente para ler. Mas o que você acha de ler para mim? — ele pergunta.

— Vai ser muito bom, eu estou louco para ler esse livro — fico entusiasmado.

Sentamos na cama, um de frente para o outro, e começo a ler o livro em voz alta, explicando todas as ilustrações que aparecem na medida em que avanço a leitura. Ele fica ali, intacto, ouvindo a minha voz com muita atenção, dando algumas risadas de vez em quando. Estou adorando esse momento, a história, a companhia. Quando estamos praticamente na metade do livro o meu celular toca.

— Alô — atendo.

Onde você está filho? Já escureceu e você ainda não chegou, nem me ligou — minha mãe responde do outro lado da linha.

— Desculpa mãe, é que eu reencontrei o James — digo tentando conter a alegria na voz.

O James Cameron?

— Ele mesmo.

E como ele está?

— Mãe eu falo com você quando chegar em casa, já estou indo. Tchau — desligo o celular. — Ou eu desligava, ou ela iria me perguntar todo o seu histórico durante esse tempo.

— Eu gosto da sua mãe. Ela está muito irritada com a gente? — James pergunta.

— Não, ela é de boa, mas é melhor não abusar da sorte — a minha voz sai desanimada. — Podemos continuar a história outro dia?

— Claro, você não pode me deixar sem saber o restante da história.

— Então eu já vou... — digo me levantando da cama.

— Acompanho você até a porta — ele se oferece.

Ele anda seguro de cada lugar que pisa. Chegando ao hall ele abre a porta para mim.

— Foi muito bom encontrar você novamente — ele diz passando a mão na nuca.

— O sentimento é recíproco.

— Posso te pedir uma coisa?

— Sim.

— Você pode ser a minha "bengala" amanhã na escola? — Nós dois rimos.

— Com muito prazer, amanhã passo aqui para buscar você. Então... Tchau.

— Até amanhã.

Viro as minhas costas e caminho de volta para casa, feliz como não me sentia há muito tempo.

Além dos seus olhosOnde histórias criam vida. Descubra agora