Era um vento gelado, bagunçando meus cabelos pretos pela minha testa. Olhava para a árvore que balançava suas folhas de um lado para o outro com uma maestria que me impressionava, já que em nenhum momento aparentava estar sem forças para aguentar toda aquela violência. A árvore não quebraria ao meio, e isso era uma linda metáfora. No meu rosto, um enorme sorriso se formou quando senti um cheiro no ar que me lembrava o perfume de Thiago. O aroma dele havia ficado na minha blusa desde nosso abraço, e nesse tempo eu não parava de me pegar devaneando com a blusa em minhas mãos. Na minha cabeça, quanto mais eu sentia, mais me teletransportava para aquele calor que ele me dera.
Desviei os olhos da árvore para o livro em minhas mãos. Estava intacto desde que o havia trazido para fora junto de mim. Não lembrava mais da história e nem queria. A minha história, ultimamente, estava muito mais atraente. Era a primeira vez em que realmente queria viver a minha vida ao invés de vivenciar as das personagens.
Um barulho no meu celular quebrou todo o silêncio em que eu estava me afogando. No visor aceso, Eleonora confirmava nosso encontro mais tarde para nossa noite de cinema. Apesar de desanimado, cumpriria com a promessa e com nosso ritual de todo Domingo estar no cinema. Desde que Harry Potter terminara, nenhuma outra saga me animava mais. E o filme de hoje era continuação de alguma dessas tentativas frustradas de preencher o espaço vazio que o mundo bruxo me causara.
*
A fila estava enorme, diferente de nossa paciência. Léo não comprou os ingressos com antecedência como costumava fazer, e agora passávamos a maior parte do tempo esperando com que as pessoas andassem para que chegasse nossa vez, o que estava demorando. Enquanto isso, Léo me contava sobre o filme que iríamos assistir, já que ela era fã e tinha lido todos os livros; já eu, nem o primeiro longa-metragem conhecia.
- Você vai gostar! É ação do começo ao fim e se seguir o livro a gente vai sair daqui bem feliz. - O dedo indicador enrolava o cabelo loiro com mechas azuis - Tomara que você não se sinta tão perdido, né, senhorzinho? Eu disse para assistir. Eu avisei!
- Não faz o meu tipo.
- Nada faz o seu tipo, Gu. Você parece um velho no corpo desse adolescente chato que você é! Ranzinza.
- Distopia com adolescentes! Tão original! - Desabafei, enfim, dando mais um passo junto com a fila
- Bruxo com varinha é original, né?
Não respondi porque percebi que o humor dela estava se alterando. Eleonora era assim, quando algo entre nós não partilhava da mesma opinião, sempre falava coisas só para me irritar e começarmos alguma briga. Recentemente aprendi a lidar com isso e agora sempre ficava quieto, mesmo que meu interior vociferasse argumentos contra. Deixava-a ficar com toda a razão, já que a cabeça de Léo parecia fechada demais para unir o meu gosto com o dela sem que acontecesse alguma explosão dentro do seu cérebro
Quando finalmente compramos o ingresso e já estávamos acomodados dentro da sala de exibição, decidi que queria pipoca. Saí da sala escura a deixando falando sozinha, e mesmo com os trailers em exibição, ainda ouvia sua voz me acompanhar até ao saguão.
Perdi o começo do filme, mas não me importei, porque sabia que não entenderia nada do mesmo jeito. Eleonora tentou me explicar enquanto acontecia algumas coisas, mas pedi para que ficasse quieta, porque era melhor do que receber uma espécie de tradução simultânea. Não conseguia prestar atenção nas duas coisas ao mesmo tempo.
Não passou nem duas horas e os créditos iniciaram. O pessoal saía lentamente comentando sobre a história, só não conseguia entender se eram comentários bons ou ruins. Léo pediu que eu ficasse porque tinha lido em algum site que teria cenas pós-créditos. Sentei e peguei meu celular para chegar as notificações que ignorei durante o filme. Os créditos acabaram, as luzes se acenderam por completo e não tinha cena extra. Foi mais um motivo para uma briga até a saída, claro, Eleonora não estava em seus melhores dias.
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Todos os erros que eu cometi
Lãng mạnGustavo nunca soube o que era amor, apesar de paixões serem bem frequentes em sua vida. Agora que está apaixonado por seu melhor amigo, tem medo de não conseguir sair desse sentimento novo e desconhecido. Como gosta de criar listas mentais sobre os...