Capitulo 15: Dezessete

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Passei alguns dias apenas olhando para aquele chat em branco, esperando que a primeira mensagem viesse dele. Mas isso não ocorreu. Às vezes ele curtia alguma nova foto minha ou algum dos posts que só existiam na minha página para que ele lesse e entendesse a indireta. Nada que do que fiz o atraiu para começar a conversa. Começava digitando alguma coisa, mas me pegava ouvindo meu subconsciente, que às vezes - como aquela - tinha a voz de Eleonora me xingando de otário, e eu deletava tudo já escrito sem apertar a tecla de enviar.

Desencanei. Afinal, ele estava longe e não saberia nem ao menos o que deveria dialogar. Só queria ter algum argumento bom o suficiente para que a conversa rolasse naturalmente sem parecer que eu daria tudo para que ela não acabasse. Era um tanto triste saber que ler as palavras dele não teria o mesmo impacto de ouvir sua voz. E sua voz era algo que me fazia falta a cada dia mais desde sua partida. Mas carecia de suas palavras já que era o máximo que podia ter no momento...

Léo estava um tanto quanto ausente nos últimos dias desde que Nelson nascera. Depois de algum tempo, comecei a chamar a criança pelo seu segundo nome: Henrique. Para mim soava melhor e mais bonito do que o escolhido pelos pais. Henrique agora era um bebê forte e perspicaz, que sempre que notava algum olhar sobre ele, lançava um sorriso sem dentes para conquistar novos elogios e ataques de fofura. Ninguém resistia.

- Imagina quando crescer? - Minha mãe dizia com ele no colo, falando mais coisas em uma espécie de língua-para-bebês que incluía quase tudo no diminutivo.

- Vai dar trabalho! As menininhas da escola já têm uma nova paixão. Esse vai ser garanhão. - Meu pai completou.

- E meninos também. - Léo adicionou a observação, atraindo o olhar estranho do meu pai - Ele é lindo demais para que eu me contentar só com meninas no pé dele, Eduardo.

A criança passou dos braços de minha mãe para os braços da mãe de Eleonora, e ambas conversaram entre si na língua-para-bebês. Eu não sabia o que me deixaria mais constrangido depois que saísse dali: a voz ridícula que minha mãe forçava ou o pressentimento que aquela conversa entraria em assuntos que não seriam agradáveis com o último comentário de Eleonora.

- Você quer que seu filho seja gay? - Como previsto, meu pai perguntou com sua voz carregada de deboche.

- E lá vamos nós... - disse, enfim, colocando as mãos no bolso da calça jeans que me parecia apertada demais.

Como de praxe, Eleonora tinha palavras que eu não conhecia no meu vocabulário. E ela falando parecia uma metralhadora de argumentos que fuzilaram meu pai e sua armadura fraca feita do pior metal conhecido no mercado: o machismo.

- Deus me livre dele ser hétero - brinquei em voz alta, sem lembrar que meus pais ainda estavam na sala. - Eer... L-Léo... vamos no seu quarto? - Gaguejei quando notei todos os olhares da sala sobre mim.

- Você acabou de destruir tudo o que eu tentei descontruir em seu pai... - Sussurrou sobre o ombro enquanto me puxava pelo braço - Tal pai, tal filho. - Caçoou com um enorme sorriso nos lábios.

Num quarto agora desconhecido (faltavam os pôsteres daquela franquia ruim de crianças lutando para sobreviver em uma distopia que ela havia me obrigado a ir no cinema assistir), Eleonora me contava dos seus planos para o futuro. E era incrivelmente doloroso quando ouvi todos os relatos e em nenhum deles meu nome estava junto ao dela. Doeu perceber que agora não éramos mais crianças e que nossas vidas tomariam rumos totalmente diferentes e que o fato dela ter um filho a impedia de pensar só nela. Segurei o choro quando fui notificado que ela pretendia mudar para uma cidade maior onde Pedro poderia começar sua faculdade e ela arrumar algum trabalho para poder estudar quando seu filho estivesse um pouco maior.

Todos os erros que eu cometiOnde histórias criam vida. Descubra agora