Capítulo 4

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Ele a convidou, ela aceitou e eles saíram. Cinema na noite de sábado daquela semana. Ele a deixou escolher o filme; um drama bem falado pela crítica na época e que até chegou a concorrer a alguns prêmios naquele ano, acabou por não ganhar nenhum, exceto por um Oscar em melhor figurino. Ela teve medo de que ele não quisesse assistir a esse filme e isso acabasse por tirar o ânimo do encontro, mas ele tinha sim vontade de saber do que ele se tratava – ficara curioso ao ouvir todos os elogios. No fim nenhum dos dois gostou tanto assim da história; parecia mais do mesmo, como se tivesse sido feito de acordo com um padrão. A conclusão dos dois foi que a única coisa original naquele filme era o título. De qualquer forma, se divertiram muito conversando sobre isso.

Depois decidiram jantar por ali mesmo, na praça de alimentação do shopping. Não era muito romântico, mas era o que um casal de quinze anos, de classe média, podia pagar; Ernesto até se deu ao luxo de pagar por todo o encontro, do ingresso até o taxi que levou os dois para casa.

Conversavam, enquanto comiam, sobre seus gostos, sonhos, planos e medos; sobre o quanto se sentiam sós em meio a uma geração vazia, sem razão de ser; sobre como todos ao seu redor pareciam caminhar com uma nuvem sobre suas cabeças, impedindo-lhes de ter uma visão mais ampla das coisas, com suas vitrines, celulares e cartões de crédito, sem nenhuma preocupação em suas vidas; sobre como tinha se tornado impossível achar um cinema que não pertencesse a um shopping nas cidades pequenas e, mesmo nas metrópoles, os cinemas como construção única estavam falindo. Demoraram um bom tempo naquela refeição de tanto que falavam. Não tiveram sequer um momento daquele silêncio desconfortável, a não ser por um breve momento, logo após Ernesto chamar o taxi, por volta das quinze para meia noite, do lado de fora do shopping. Ele olhou nos olhos de Fabiana, suas mãos estavam tremendo e ele lutava com todas as suas forças para disfarçar esse nervosismo juvenil, queria mostrar para ela que sabia o que estava fazendo, tinha controle e segurança – sem pensar nem um instante que ela poderia estar passando pelo mesmo. Ele se aproximou do rosto dela e a beijou da forma que ele imaginava que seria a mais correta, ela aceitou como se estivesse esperando por aquele momento já há algum tempo. Então ele parou de forma abrupta e disse:

- Desculpe. É que eu nunca fiz isso antes.

Ao terminar a frase, sentiu de imediato que não poderia ter feito algo menos apropriada.

- Eu sei tanto quanto você – disse Fabiana, com um riso nervoso nos lábios que lhe interrompia as palavras e que ela tentava controlar com a mesma força que Ernesto tentava controlar suas mãos. - Sei que está bom e que devíamos continuar.

E continuaram até a chegada do taxi. Entraram no veículo e Fabiana passou seu endereço para o taxista – um homem calvo, com alguns fios brancos resistindo em sua cabeça, cheirando a cigarro e com aparência cansada, mas muito simpático, embora tivesse se espantado ao perceber a idade de seus passageiros. Eles se sentaram, um ao lado do outro, Fabiana descansando a cabeça no ombro de Ernesto. Em silêncio. Um silêncio confortável. Normalmente Ernesto repassaria toda a noite em sua mente, pensando no que fez de certo e no que fez de errado durante o encontro, quais assuntos deveria tocar no próximo encontro, para onde ir e como, mas dessa vez estava calmo; tinha certeza de que fizera todas as decisões corretas e, mesmo que pudesse ter melhorado em uma coisa ou outra, pouco lhe importava. Não queria planos, só sentir aquele corpo que descansava em seu ombro, respirando devagar e calmamente, cansada, mas feliz e satisfeita; aproveitar cada segundo daquela volta de taxi.

Chegaram ao prédio de Fabiana. Ele saiu e segurou a mão dela, para ajudá-la a sair do taxi. Beijaram-se por uma última vez e ela pegou a chave de casa em sua bolsa, após uns instantes tateando o seu interior. Entrou, dando-lhe um tímido adeus. Ao sentir a porta fechar e perder Fabiana de vista, Ernesto sentiu um breve vazio, não necessariamente ruim, era como se ansiasse por ter aquela cabeça em seu ombro novamente. Uma ânsia agradável. Os passos que ele deu, da porta do prédio até o taxi, eram leves e tranquilos; já nem sentia mais o cansaço da noite. Olhou para a lua e as estrelas uma última vez antes de entrar no carro, era como se nunca as tivesse visto antes – e realmente não as vira daquela forma.

InocênciaWhere stories live. Discover now