CAP 9

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Felipe apenas fitava o chão com as mãos cruzadas sobre as pernas, ele mal me encarava. Eu tinha realmente ferrado com tudo, não podia me prolongar muito então fui direto ao ponto:

-Eu não deveria ter explodido com você daquele jeito. Gostaria que um dia você me desculpasse, mas a razão por eu ter feito aquilo, o motivo em si é muito maior do que você imagina. Sabe Felipe, tem muito sobre mim, muitas coisas que você não sabe e tudo isso está relacionado ao Castelinho.

Quando eu mencionei o fatídico lugar ele olhou direto para mim, alerta e surpreso. Percebendo que eu consegui sua atenção, continuei:

-Sabe, isso que eu vou falar talvez não soe bem aos seus ouvidos, mas eu já lutei muito clandestinamente, eu pertencia àquele mundo - a surpresa em seu rosto aumentava a cada palavra minha - tanto que fiz coisas das quais não me orgulho, coisas nas quais que eu poderia ser preso. Lá é um antro de cobras, só tem bandido, gente perigosa, e quando perigo eu me refiro a coisas pesadas, tipo máfia.

A surpresa dele aumentou e notei que ele queria dizer algo e não conseguia. Deixei ele absorver minhas palavras por um instante e prossegui:

-Você sabe que eu tinha uma vaga olímpica para o boxe? - ele apenas discordou com a cabeça, parecendo mais surpreso ainda - Sim eu tinha. Eu sempre fui bom na trocação, sempre foi o meu forte, eu era rápido e um cara da confederação brasileira de boxe me viu lutando muay uma vez e me fez o convite, fiquei 1 ano treinando boxe e garanti a vaga, eu só precisava continuar treinando duro, bater as pesagens e ganhar um campeonato e eu seria convocado. Mas não consegui, bem, eu tive de desistir.

-Mas... eu não entendo, por que você não foi paras Olimpíadas?

Eu apenas sorri tristemente, e o olhei nos olhos.

- Porque eu fui recrutado pela máfia, Felipe, eu me transformei num criminoso.

Vi que ele ficou chocado e colocou as mãos na cabeça. Dei um tempo para ele que mirava em todos os lugares do quarto, confuso. Por fim deitou-se na cama, suspirando audivelmente e disse:

-Me conta o resto, sei que tem mais.

Eu concordei e fui arrastando a cadeira até chegar perto da cama dele, peguei em sua mão, puxando-a para mim e ele não negou meu contato, entrelacei nossos dedos, acariciando os deles com meus polegares, e continuei:

-Sim, tem mais. É bom que eu te explique o motivo de eu ter começado a frequentar lá... Eu fui um adolescente inconsequente, eu não tinha limites, era encrenqueiro e vivia me metendo em confusão, daí, foi aquilo que te contei antes, comecei a lutar muay thai. Em pouco tempo, eu me tornei campeão juvenil e isso abriu muitas portas assim como me deu visibilidade no esporte. Em um campeonato paulista, esse olheiro me viu lutar e passado uns meses me ofereceu uma vaga olímpica. Eu nem pensei em recusar, aceitei na hora e comecei a treinar, foi uma das épocas em que eu mais me dediquei e ainda faltavam 3 anos para acontecer o evento. Eu treinei muito e fui aprimorando meus movimentos, era uma atleta profissional, só que chegou uma hora que só isso não bastava para mim, eu queria adrenalina, queria sangue, queria dinheiro, fama, glória, eu não tinha paciência para esperar os três anos, eu era um pirralho mimado. Daí um colega de academia me levou no castelinho um dia, ele ia lutar e eu fiquei ensandecido com aquilo... Não passou nenhum mês e comecei também.

Vi que era muita coisa para ele assimilar, então desenlacei nossos dedos, rompendo o contato de nossas mãos, arrastei a cadeira de novo para a escrivaninha e sentei na sua cama e ele automaticamente foi para o lado. Tirei meus tênis e deitei de barriga para cima, assim como ele. Ficamos olhando para o teto, sem dizer nada e ele, bem devagarinho foi virando em minha direção e deitou sua cabeça em meu peito, me abraçando de lado.

Meu LutadorOnde histórias criam vida. Descubra agora