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O desenho de Isabella estava marcando as páginas de um livro, rabiscos coloridos a qual quanto mais se observava, mais confuso ficava, porém misteriosamente despertava curiosidade.

 Alicia o pegou mais uma vez, notou que havia muitas flores á frente de alguns rabiscos pretos. Ela sorriu desistindo de decifrar o enigma.

Iria ao seu lugar preferido, onde lá podia ficar em paz, pegou o elevador e para sua surpresa estava novamente com defeito, sem muita disposição, desceu vagarosamente as escadas, por um descuido, o livro que carregava acabou caindo de suas mãos, juntou-o com ira.

Com toda a confusão de seus pais, acabou esquecendo que tinha combinado de sair com a amiga, naquela tarde fria.

- Aonde você pensa que vai sem mim? – Uma voz dizia ao longe, saía apressada da grande mansão ao lado.

As ruas estavam praticamente desertas, um homem passava apressado em uma bicicleta velha, na esquina da frente um grupo de jovens arriscavam suas vidas descendo a ladeira de skate, passavam poucos carros.

Então as duas meninas, a hippie e a roqueira como gostavam de se referirem a elas, caminhavam para um lugar secreto. Estavam bastante afastadas do bairro em que residiam, o cenário pacato de onde vieram, foi substituído, por odor de esgoto, crianças de pés descalços jogando bola nas ruas sem asfalto, com traves improvisadas, becos estreitos por todos os lados.

Mais a frente, o grande lixão, onde adultos e crianças, dividiam espaço com moscas, procurando comidas, roupas, e coisas que poderiam ser aproveitadas ou vendidas. Pessoas andavam de um lado para outro, não se importavam com o frio que estava fazendo, crianças choravam, outras gritavam fazendo birra.

Luísa olhava assustada, nunca antes havia estado em um lugar como aquele, apressava os passos, pois não gostava de tudo aquilo, sentia nojo, alguns habitantes estavam muito ocupados para notarem as meninas, porém, outros as olhavam até as perderem de vista.

- Onde você está me levando? Esse lugar é um inferno.

Finalmente o cenário da vida real havia ficado para trás, agora havia poucas casas, muitas árvores. Haviam chegado ao tal lugar secreto.

- Você é realmente louca, passa por todo aquele inferno de lugar, correndo o risco de ser assaltada, ou morta, para vim a um velho cemitério?

O grande portão de tão velho e enferrujado fazia um enorme barulho ao abri-lo, túmulos mal cuidados e quebrados, folhas secas das árvores forravam o chão.

- Pensei que gostasse de lugares como esse. – Argumentou Alicia deitando-se por cima de um velho túmulo.

- Não gosto de cemitérios, muito menos os feios e acabados como esse, nem um cachorro vira-lata gostaria de ser enterrado aqui.

- Eu gosto.- Alicia respondeu.

- Aliás tem muita coisa que você gosta, a qual eu não gosto. – Luísa interrompeu, com tom irônico.- Pode me explicar por que me beijou?

O barulho do portão indicava que alguém estava entrando, talvez não fosse tão esquecido, e algumas vezes pessoas lembravam de visitar seus entes que já se foram. E a conversa das garotas parou por ali.

Uma menininha pálida entrou, olhava detalhadamente para todos os cantos, vestia um vestido rosa, cabelos grandes e lisos, ao olhar em seu rosto, via-se uma pequena cicatriz, parecia que havia se queimado com algo, mas ainda assim, não cobria sua beleza, ruiva, de olhos castanhos claros, confundia-se com um verde, tinha apenas sete anos. Segurava um pequeno buquê de rosas artificiais vermelhas, mas muito bonitas.

- Você não perde a mania de deitar-se sobre o túmulo de meu avô, não é Angel? – A menina dizia ao aproximar- se.

Alicia ligeiramente levantou-se, desculpando-se.

- Esta é Lunna, vem quase todas as tardes visitar o túmulo do avô e deixar flores... Esta é minha amiga Luísa, não se importe com ela, tem esse jeito nojento, mas é gente boa. – Disse se direcionado a amiga que ainda estava com semblante de nojo.

Depois da morte do avô, a menina agora só tinha a companhia de sua velha avó, sempre que podia deixava flores, mas havia sempre alguém que as furtavam, e isso a deixava irada.

- Já levaram as rosas, mas não tem problema, trouxe outras e mais belas... E você trouxe as flores que prometeu?

Esquecida como era, obviamente esqueceria, prometeu trazer em outra visita. Alicia retirou cigarros do bolso, ascendeu um para ela e outro para a amiga, a garotinha parecia não ligar para toda aquela chaminé.

- Mortos não são psicólogos Angel... Aqui existe fim de histórias tristes e alegres, é o fim de tudo, mas muitos acreditam que é apenas uma etapa. – A menina argumentava enquanto observava tristemente o túmulo. – Você não pode vir aqui simplesmente para deixar suas tristezas, ou para acalmar-se, os espíritos não vão te consolar, muito menos te dar conselho, este lugar já é triste o suficiente, a maioria não vem morar aqui, porque querem, outros vieram pois não aguentavam a vida de angústias, a verdade é que para tudo tem seu tempo.

Ficaram em silêncio por alguns segundos, ouvia-se apenas pássaros cantando ao longe, e o vento frio soprando forte, levando e trazendo folhas secas. Lunna pegou o livro que estava sobre o túmulo do avô, o abriu, e curiosa retirou o desenho e o olhou.

- Minha irmã é uma bela artista de desenhos abstratos. – Ela demonstrou simpatia pela primeira vez.

- Silêncio... Tem anjos aqui. - A garotinha sussurrou.

- Não estou vendo nada. – Luísa olhava para todos os lados procurando anjos.

- Só quem viu a morte de perto ou acredita de verdade na existência de anjos, podem os ver.

Alicia ficou pensativa, havia escutado em algum lugar aquela frase, se não igual era parecida, mas também não quis entrar em detalhes.

- Você não me assusta garotinha. Conheço uma história muito mais macabra e verdadeira. – Interrompeu Luísa começando a contar a história.

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Ao nascer da lua cheia (O Livro de Angel 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora