"E então, tu te tornas, eternamente
responsável por aquilo que cativas."
Hoje seria o grande dia de Jaque, o baile de sua tão sonhada formatura. Após tanto esforço e anos de luta, finalmente estava se formando em uma fisioterapeuta. Foram dias difíceis, primeiro tentando passar no vestibular da universidade pública, a USP, pois não tinha condições de pagar uma faculdade particular, e depois tentando conciliar os estudos de período integral, estágios e os diversos trabalhos que arrumava para ajudar no orçamento de casa. Além disso, quando se tornou capaz de se manter, não aceitou mais nenhuma ajuda financeira por parte do patrão de sua mãe, bastava ele ter arcado com todos os seus estudos até o colégio. Mas ela havia conseguido! Era uma vitoriosa!
A cerimônia de colação de grau já havia sido realizada, Jaque era oficialmente uma fisioterapeuta. Agora sua conquista deveria ser comemorada, pagou a duras penas a grandiosa festa de formatura sozinha, não aceitou a ajuda financeira da mãe, pois ela fez questão de lhe dar o vestido. E que, por sinal, era lindo, muito lindo! Jaque estava se sentido a verdadeira Cinderela, com seu vestido azul-turquesa, a cor escolhida pelas formandas da turma, mas o seu era um pouquinho diferente e mais especial. Conforme as luzes refletiam na saia longa, várias nuances de cores brilhavam, fazendo-a parecer uma asa de borboleta, sem contar o corpete repleto de pedrarias, muito bem ajustado ao seu esbelto corpo.
O único presente que ela aceitou do senhor Leônidas foi a maquiagem e o penteado, e ele fez questão de reservar um horário com o melhor cabeleireiro e maquiador, para seu dia tão esperado. E realmente o trabalho ficou fantástico! Seus cabelos longos encaracolados foram presos em uma trança jogada de lado, emoldurando seu rosto delicado, e a maquiagem tão bem-feita, com cores discretas, valorizando sua beleza negra.
Jaque, quando viu o vestido, confeccionado pela melhor costureira da região, desconfiou não se tratar de um presente de sua mãe, pois o alto valor era demais para o salário dela de governanta da tradicional família Carvalho, mas como ela garantiu ter guardado algumas economias, ela ficou mais tranquila e aceitou o presente de bom grado.
Era sua noite, seu dia tão esperado, e Jaque nunca havia se sentido tão realizada e feliz. Mas, ao invés de estar se acabando em uma pista de dança, junto de suas poucas amigas, estava agora na sala de espera de um hospital, com todos olhando para ela e seu lindo vestido. Léo tinha que estragar sua comemoração, logo naquela noite em que tudo estava tão perfeito.
Quando, pela primeira vez, pôde sentir seus braços fortes em torno de sua cintura, enquanto dançavam no salão, ao som da banda que tocava no palco. No início, Jaque achou que Léo nem aceitaria o convite para ser seu padrinho, mas ele apareceu trajando um smoking perfeitamente ajustado ao seu corpo musculoso, lindo em sua beleza loira, atraindo para si todos os olhares furtivos das mulheres e formandas do baile. Entretanto ele passou alheio a todas elas, com olhar fixo nos de Jaque, fazendo-a sentir-se única.
Léo se aproximou, depositou um beijinho em seu rosto e lhe entregou uma gargantilha bem delicada, com um pingente simbolizando o curso de fisioterapia. Ela até pensou em rejeitá-la, pois não deveria aceitar um presente tão caro, mas o olhar de advertência de Léo, de que não aceitaria uma desfeita, a fez calar e virar-se para ele colocar a corrente em seu pescoço. O leve contato das pontas de seus dedos deixou arrepios por onde passou. E ao invés de sentir-se ultrajada, Jaque ficou visivelmente emocionada com o gesto tão singelo e só conseguiu balbuciar um discreto obrigada devido ao nó se formando em sua garganta.
Tudo parecia mágico, um sonho realizado. Dançaram por um longo período, ele cumpriu todos os cronogramas de um padrinho, até a valsa que ele afirmou detestar falando ao pé do seu ouvido. Nesse momento, Jaque fingiu não perceber o arrepio lhe subindo pela nuca. Porém se tornou impossível ignorar as sensações causadas com aquela aproximação. Enquanto dançavam, ela se entregou, baixando as rédeas. Eles giravam lentamente e era como se existissem somente os dois no salão, presos em uma conexão inexplicável. Ao fundo, começou a tocar uma música tão linda, adorada em segredo por ela, pois a fazia lembrar-se dele, o refrão dizia:
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Amor Abstrato - DEGUSTAÇÃO
RomanceMarcados por traumas do passado, Jaque e Léo cresceram juntos, curando as feridas um do outro com a amizade típica de duas crianças. Eram diferentes em tudo. Ele, filho do patrão, e ela, filha da empregada. Com o passar dos anos, conforme Léo se tor...