Capítulo 3

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"Era uma vez um pequeno príncipe que habitava um planeta pouco maior que ele, e que precisava de um amigo"[1]

Dois meses se passaram sem que Jaqueline conseguisse vê-lo. Ao ser transferido para o quarto, Léo deixou ordens expressas para não ser incomodado por ninguém. As únicas visitas que não pôde evitar foram as constantes dos investigadores e advogados que trabalhavam no seu caso. Segundo informações da Dona Laura, mãe de Jaque, a única permitida por ele a entrar em seu quarto, mesmo tendo sido orientado por seus advogados a somente falar em juízo, Léo repetiu por diversas vezes o ocorrido: foi à formatura, bebeu um drink, pegou a moto, saiu em alta velocidade, sentiu-se mal e caiu. Depois disso, não se lembrava de mais nada, somente de acordar no estado em que se encontrava, prostrado em uma cama.

Sua confissão foi um prato cheio para a impressa, que voltou a explorar o caso, a cada dia incorporando uma nova fofoca do passado de Léo. Um programa diário bastante sensacionalista cobrava respostas das autoridades, diariamente, em suas apresentações, entrevistando o trabalhador que perdeu um terço da perna e mostrando as dificuldades enfrentadas por sua família. Jaque, quando via o programa, se revoltava, pois, apesar de terem se afastado durante certo período, sabia que metade das reportagens eram pura especulação acerca do passado de Léo. O senhor Leônidas também estava acionando os advogados para entrar com uma ação contra o programa e o trabalhador, o qual negou toda a ajuda acertada e entrou com uma ação por perdas e danos muito maior do que a oferecida pelo senhor Leônidas, baseada nas expectativas de ganhos de um funcionário de prefeitura e ainda um bônus generoso. Mas como ele percebeu a oportunidade de ganhar mais, recusou todas as suas ofertas e passou a fazer chantagens sobre procurar a imprensa, caso seus pedidos fossem negados.

Todos os dias quando chegava do seu curso de pós-graduação, Jaque procurava a mãe para se atualizar, ansiosa por informações sobre estado da recuperação de Léo - os gritos dele quando descobriu sua situação ainda a assombrava -, mas as notícias eram cada vez mais desanimadoras.

Assim que recebeu alta do hospital, permaneceu trancado em seu quarto, sem aceitar ajuda ou dar continuidade ao tratamento. Dona Laura relatava que, por muitas vezes, ele só se alimentava quando era praticamente forçado por ela. Jaque se desesperava, pois sabia o quanto os tratamentos intensivos seriam importantes para amenizar seu estado.

Infelizmente sua condição de paraplegia foi confirmada. Em sua queda, Léo teve uma fratura na última vértebra torácica. A princípio seria reversível, caso a cirurgia tivesse ocorrido logo nas primeiras horas, mas, como o senhor Leônidas fez um escarcéu pela transferência do filho, a cirurgia acabou acontecendo tarde demais para reverter o quadro da lesão. Contudo esse fato foi omitido a todos, já bastavam as especulações e fofocas que cercavam o caso, isso sem contar a depressão em que Léo se encontrava desde que soube de sua nova condição.

Mais um mês se passou e tudo permanecia na mesma rotina inquietante para Jaque. O estado catatônico de Léo afligiu até seu rigoroso pai, que resolveu procurá-la clamando por ajuda.

- Não sei se sou apta para atender suas expectativas.

- Você é perfeitamente capaz! Falei com seus professores e todos teceram muitos elogios a você, dizendo que se formou com as melhores notas e que, se caso viessem a precisar, gostariam de ser tratados por uma profissional competente como você.

- Agradeço a confiança, senhor Leônidas, mas... ele me proibiu de entrar em seu quarto. A última vez que o vi foi quando ele acordou do coma - Jaque respondeu aflita, sem saber como atender ao inusitado pedido do chefe de sua mãe.

- Ele precisa de ajuda, minha querida, e eu não sei a quem mais recorrer.

- Não sei de que forma posso ajudá-lo, sem poder entrar em seu quarto.

Amor Abstrato - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora