Parte 2

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3:20 am


Meus tios já haviam se recolhido em uma das barracas armadas em volta da fogueira. Os dois realmente entravam no clima de escoteiros e mesmo sem necessidade de dormir fora do chalé, deixavam-no para eu e meus primos enquanto... Realmente, ignorância é uma benção. Meus primos ainda comiam os últimos pedaços de marshmellow enquanto os lampejos de luz que a fogueira emitia se tornavam nulos.


- Vou buscar mais comida, não saiam daqui sem mim.


- Você decidiu mesmo ir conosco. Agora sim você tem meu respeito.


- Não dou a mínima pro seu respeito, Jack. Agora cale a boca e não deixe que o quatro-olhos aí faça alguma idiotice.


- Eu não vou fazer nada de errado! Porque vocês não confiam em mim?!


- Jeff, é bom você não errar hoje, ou conto pro pai que você insistiu pra irmos só pra poder encontrar aquela flor que se abre de noite, como é o nome mesmo... Dama-da-meia-noite... Não! Dama-da-Noite!


- Idiota, Damas-da-Noite só se encontram no sul do país!


- Tenho certeza que para o pai, essa flor dá no fundo de casa. Em quem você acha que ele vai acreditar?


- Isso é injusto comigo Jack!


- Parem vocês dois, vão acordar seus pais. É o seguinte, vou buscar mais um pouco de marshmellows e espero que vocês dois fiquem aqui e não saiam sem mim.


- Pare de bancar o sabichão Gimmy boy! Vá logo para voltar logo. Estou me coçando pra entrar nessa floresta e não é por causa dos insetos.


- Só não se fodam.


Caminhava a passos largos em direção ao chalé. Minha barriga grunhia mais alto do que o assovio dos ventos ao passar pelos pinheiros da floresta.


Passos.


Rapidamente olhei para trás buscando o responsável. Minha tia realmente era capaz de me fazer ficar paranoico. Era possível ver somente os dois garotos conversando entre si sentados em torno da luz baixa da fogueira.


O vento só aumentava enquanto adentrava a porta de entrada do chalé.


Um arrepio incomum corria por todo o meu corpo. Um pressentimento ruim.


Podia ouvir o som do vento escoando em meio ao assoalho. De repente, silêncio.


Era como se tivesse sido levado a outro plano. Sentia náusea e na frente dos meus olhos, nada além de um breu interminável.


- Sangue, fogo, caos, perdição.


O loop constante destas três palavras ecoavam em minha mente como trovoadas.


- Sangue, fogo, caos, perdição... Sangue, fogo, caos, perdição...


Chuva.


Alguém tocava meu ombro. Me virei instintivamente para trás armando um soco com minha mão direita.


-Ei calma aí Rocky! Você ta bem? – Perguntou Jack andando para trás.


- Foi mal cara, você viu o apagão também?


- O único apagão que eu vi foi o seu! – riu Jack – Você simplesmente ficou parado em frente a porta do chalé, então eu vim ver se estava tudo bem.


O vento aquietou-se de forma abrupta.


- Acho que estou delirando um pouco, minha cabeça dói... Você se lembra onde a sua mãe deixou os outros pacotes de marshmellow aqui na cozinha?


- Acredito que estão no armário... Faça o seguinte, pegue a bomba de asma do Jeff lá em cima do segundo andar enquanto pego a comida por aqui.


- Vai lá você! Eu já ia pegar a comida antes de você chegar!


- Como está irritado esse garoto! Para de enrolar e busca logo a porra da bombinha dele, seu cagão! – Disse Jack com total desdém.


- Não se atreva a me chamar assim seu filho da...


- Georgia! O nome dela é Georgia, David a menos que ela saiba de algum outro nome que você se referiu a ela, não é mesmo?


- Caralho, eu te odeio cara!


A chuva aumentava em conjunto com a intensidade das trovoadas e relâmpagos no local. Ao andar pelo interior da sala de estar ainda conseguia ouvir Jack abrindo pacotes e mais pacotes de guloseimas. Naturalmente um animal faminto.


"Sangue, fogo, caos, perdição"


A frase não parava de se repetir, mesmo após o apagão. Estava ficando louco.


Olhei para a pequena janela acima do balcão de bebidas da sala de jantar procurando algum indício de que não estava me perdendo em minha própria mente. A chuva escorria pelo vidro.


Passos pesados vindos do segundo andar.


Fitei as escadas e respirei fundo.


Coração disparado.


"Sangue, fogo, caos, perdição".

***

Um Conto de TerrorOnde histórias criam vida. Descubra agora