Poeticamente literal.

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Quem um dia me conheceu ou, sequer, escuta o que digo sempre me ouve dizer em meio a tudo que digo, vez ou outra, algo parecido sobre essas cidades. Em tempos que fui mais sociável sempre quis, e sugerir fazer, que decorássemos as ruas daqui com nossas caras desagradáveis e sempre dizia que, de repente, um gringo, por exemplo, poderia tirar uma foto qual aparecêssemos ao fundo e, onde quer que fosse que o gringo morasse, ele levaria a foto e mostraria aos amigos de trabalho e falaria coisas boas de Olinda - todos falam ao que parece - e lá estaríamos nós, enfeites não tão bonitos das ruas de Olinda, onde quer que fosse que o gringo morasse. N'outras palavras, e estas mais diretas, são um exímio pagador de pau desta merda de cidade. Quando me falta alguma mulher me resta Olinda que tudo me dar; mas pensam que, quando digo isso, é no sentido abstrato, mas, não o é. A melhor conceitualização que posso dar à isso é que é poeticamente literal. Mas não me dão ouvidos. Sou louco, dizem. Louco porque simplesmente digo que se ainda me valesse algo esperar sobre o melhor da vida quando dobro cada esquina, teria um futuro diferente que esse onde canto meus melhores refrões pras paredes e escrevo minhas frases favoritas nos banheiros públicos; que passaria as noites em melhor estado; que pensaria na minha cama e ela seria macia; que fosse como fosse, por exemplo, meu trabalho eu dormiria bem toda noite e beberia num pub requintado onde fosse proibido fumar e só pediria doses e mais doses de doze anos e não ficaria só com meu fone dançando sobre as cinzas e guimbas dos meus cigarros de 3 reais dentro do meu quarto. Mas sei que se hoje a felicidade, a paz, a liberdade e o amor me fossem objetos de desejo eu desejaria sempre 'Meia Noite em Paris' que seria as minhas noites mais podres nos becos mais podres da parte mais podre e pobre de Olinda.

Estou agora, se bem me lembro, em casa e dou um trago e inflo os pulmões; bebo o café e fecho os olhos. Lembro uma lembrança sem notoriedade que pensei quando, horas atrás, lamentava algo sobre um copo de cerveja - que não era o primeiro nem o ultimo - ou seja, sem simbolismo numeral o que quer dizer que lamentaria outra coisa no próximo até pensar em algo mais relevante quando chegasse no ultimo - e assim sigo fazendo revelações e revoluções de ímpeto intimo sem ninguém saber o que pensei e, o que pensei - até mesmo aquilo, sem notoriedade e simbolismo numeral, no copo de cerveja - ninguém saberá, senão, por minhas mãos; até se sobre Olinda.

Mas afinal, o que porra é Olinda?
O melhor dos piores lugares do mundo.

Dona do mais notório alternativismo gourmet vencido do Brasil que, mesmo sem nunca ter estado, nunca saiu da Belle Epoque. Que é o mesmo daquele que quase morreu por conta do mal entendido com o mendigo que fedia. Que é o mesmo também daqueles que quase mataram o cara por conta do mal entendido, ou seja, eles são tão violentos quanto. Muitos dos intelectuais que falei antes, quais eu adoro de coração, sou militantes destes movimentos. Por isso, acho, que sou um desertor das causas sociais de hoje em dia; estas estão cheias de Judas de vermelhos não tão vermelho assim, vermelhos tão diferentes do meu. Organizadores de workshops sobre felicidade que andam na Boa Vista com expressões inexpressivas de desprezo, mas, se chamados e informados "de quanto" abrem largos sorrisos de puta que dão as mãos suas orelhas; reencarnados revolucionários que, frente ao espelho, são banqueiros barrigudos e pais de filhos bochechudos e mimados, maridos de esposas estressadas que não sabem mais o que é gozar. Mas estes são apenas alguns que fazem Olinda ser o que é. Há também os que chamo de "Zés rico": Ilmos senhores, pobres de tão rico. Que pisam e justificam-se por terem sido pisados. Que diz que ama porque não foi amado por quem pisa; que foi pisado por quem amou. Filhos de beatas e advogados do Diabo dos filhos hereges do Senhor. São os retratos falados mudos, cuspidos e escarrados, da ignorância intelectual e seu salário tão gordo quanto eles. Que, quando bêbados, lamentam ser o seu enorme AP um forte apertamento de seu peito que está perdido em algum lugar localizado nos mais pobres bairros nobres desta cidade. Que saboreiam o café frio por ser francês; gourmet ou algo que o valha pagar tão caro por isso.

E ela disse: "Nunca Apague a Luz".Onde histórias criam vida. Descubra agora