Capítulo 20

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Certo, o lance de eu estar namorando passou quase despercebido pelos meus pais, com toda a atenção desviada para o Gabriel e tudo mais. Na verdade, acho que eles esperavam que isso fosse acontecer mais cedo ou mais tarde. Eu ter um namorado, quero dizer.

A única observação do meu pai foi sobre as minhas notas: elas não deveriam baixar — como se isso fosse possível. Mas a verdade era que ele também não precisava ter se preocupado. Eu sei, eu sei... geralmente, as notas das meninas tende a cair quando elas começam a namorar. Distração, sabe? Mas as minhas notas aumentaram consideravelmente.

O caso é que o meu namorado é um chantagista de primeira. Ele sabe perfeitamente bem da minha deficiência com qualquer tipo de dever de casa. Por isso ele aprendeu a dizer que só vai me ver depois que eu terminar a lição, o trabalho... ou seja o que o for eu estiver enrolando.

E o negócio é que por mais que eu reclame ou esperneie, ele não cede. E, quer saber, ele sempre ganha. Basicamente, porque eu sou viciada nos beijos dele. Não que isso também não o torturasse — eu sabia que sim —, mas ele é mais teimoso.

Então era exatamente isso que eu estava fazendo: esperando que eu terminasse meu trabalho de Biologia. Eu havia ligado para ele meia hora antes e usando minha voz mais sedutora para tentar convencê-lo. Não funcionou.

— Se você for uma boa menina e terminar o trabalho, passo aí quando eu sair da Cyber, ok?

— Você é um chantagista cruel.

Ele riu. E, claro, venceu outra vez.

Eu terminei aquela droga de trabalho umas três horas — e pensar que era sábado. Eu sabia que aos sábados, ele saía às quatro da Cyber. Mandei uma mensagem bem aborrecida para ele avisando que tinha terminado. Ele respondeu bem-humorado demais, pedindo para eu me encontrar com ele na praça, perto da escola — ele não precisava saber que era o mesmo lugar que fiquei com o Henrique.

Tive tempo de sobra para me arrumar. Eu estava usando um short jeans boyfriend, uma jaqueta azul-marinho e scarpin rosa choque. Aparentemente, cheguei cedo demais, porque ele ainda não estava lá. Ótimo. Aquele lugar não me trazia sorte mesmo.

Mas três minutos depois o vi atravessar a rua. Já estávamos juntos há quase cinco meses e, eu tinha que admitir, ainda ficava fascinada com a beleza dele. Aparentemente, ele havia passado em casa, porque em vez do uniforme, ele usava uma camiseta preta e a jaqueta marrom.

— Oi — ele falou, ao se aproximar o bastante.

Bem, o meu cumprimento não foi tão... civilizado, digamos assim. Eu esqueci completamente porque eu estava chateada. Simplesmente estendi os braços em sua direção e o puxei para mim - eu tinha começado a usar salto sempre que possível ao sair com ele, apenas para facilitar a questão da altura.

Percebi que o surpreendi um pouco quando passei a mão em sua nuca e o beijei, em frenesi. Era como se uma corrente elétrica percorresse meu corpo. Eu tinha chegado à conclusão que nunca enjoaria dele. Quando finalmente paramos para respirar, ele disse, pegando minha mão:

— Vem cá — ele tentou me conduzir até um banco, mas eu resisti.

— Não... — falei languidamente, tentando trazê-lo para perto outra vez.

— Vem... — dessa vez, ele resistiu, o que me fez estranhar. — Eu quero te mostrar uma coisa.

Sem dúvidas, ele parecia mais eufórico que o normal. Um tanto quanto frustrada, deixei-o me guiar até o banco mais próximo.

— O que você quer tanto me mostrar? — Minha voz soou um pouco mais impaciente do que eu gostaria.

Ele virou no banco, para ficar de frente para mim. O cabelo dele tinha uns reflexos lindos no sol. Fiquei observando enquanto ele abria o bolso da jaqueta e tirava uma caixinha de veludo violeta. Com um ar solene, ele me estendeu a caixinha.

— O que é isso? — Eu não lembrava se ser nenhuma data comemorativa.

— Abre — ele sugeriu, como se fosse óbvio.

Abri a tampa da caixinha, ansiosamente. Meu coração falhou uma batida. Senti meu queixo cair, mas não pude evitar. Depositada no cantinho da caixa, tinha uma pulseira prateada super fininha e delicada. Toquei o pingente com as pontas dos dedos. O pingente era uma águia minúscula prateada, não devia ter mais de dois centímetros.

— Viny... é incrível! — A minha voz vacilou de pura emoção. Era a coisa mais linda que eu já tinha ganho.

— Bem — ele falou, enquanto tirava a pulseira da caixa com suavidade —, nós vamos completar cinco meses de namoro... A maioria dos casais usaria uma aliança... Mas eu achei que isto não faria muito seu gênero...

Enquanto falava, ele não me encarava, em vez disso, ele passou a pulseira em volta do meu pulso, delicadamente.

— E como eu sei — ele continuou — que você adora o meu cordão... pensei em algo um pouco mais simbólico.

Ele fechou a pulseira e deixou as mãos caírem no colo, me olhando tranquilamente. Virei o pulso no ar, olhando a pulseira, encantada. Certo, tenho que admitir, ele tinha acertado em cheio o lance da aliança. Eu não queria uma. Mas aquilo devia ter custado os olhos da cara!

Ele riu, divertido, embora eu não tivesse dito nada em voz alta. Encarei-o, seriamente por um momento - eu ainda precisava me acostumar muito com esse lance da telepatia. Ele falou, ainda com ar de quem está se divertindo horrores:

— Ok, eu sei que você adora meus olhos... Afinal, são os mais bonitos que você já viu. Mas como pode ver, eles continuam intactos.

— Deixa de ser convencido — respondi, fingindo aborrecimento, já que estava encantada demais para ficar aborrecida de verdade.

— Agora, falando sério — ele continuou, controlando o riso e me olhando suavemente —, Não precisa se preocupar com isso. O preço, quero dizer. Eu já fiz o parcelamento e vou pagar em sessenta e cinco vezes sem juros.

Obviamente, ele não falava sério, mas deixou claro que eu nunca saberia o valor e que não queria que eu perguntasse. Tudo bem, então, sem perguntas. Virei o pulso outra vez, vendo o reflexo da prata no sol.

— Você ainda está ouvindo meus pensamentos, não está? — Perguntei, sem encará-lo.

Ele riu, sem o menor indício de remorso, tirando uma mecha de cabelo da frente dos olhos.

— Eu não podia perder o que você pensaria neste momento.

— Sabe — comecei, voltando a olhar para ele —, as pessoas normais conseguem sobreviver sem saber cada coisa que passa na cabeça dos outros — pousei o braço no colo e estiquei a mão para tocar a dele. - Não é justo. Por exemplo, eu não consigo ler seus pensamentos... E, acredite, às vezes eu queria muito conseguir.

— Ah — ele deu de ombros e eu achei a princípio que ele estava brincando, depois percebi que ele falava sério, apesar de descontraído —, você não precisa. Sem sombras de dúvidas, você sempre consegue saber o que eu estou pensando, mesmo sem a telepatia.

Ok, eu realmente havia aprendido a reconhecer alguns sinais nele: gestos, comentários. E, na verdade, eu também sabia que às vezes pegava de surpresa quando acertava alguma coisa que ele nem tinha dito. Uma coisa que a convivência tinha trazido de brinde. Mas agora eu já fazia isso com tanta naturalidade que nem reparava mais. Aparentemente ele reparava.

— Agora, por exemplo — ele falou, aproximando um pouco o rosto e mantendo os olhos fixos nos meus —, aposto que você sabe no que eu estou pensando...

— Acho que posso imaginar. — Sorri, ficando agitada.

Sem cerimônia, puxei a mão dele que segurava aminha, trazendo-o para mais perto. Assim que seus lábios tocaram os meus, senticomo se o mundo todo desaparecesse à nossa volta. Certo, certo... eu e meuvício em garotos... Pelo menos, meu vício se resumia agora a um único cara.    

Fim

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Muito obrigada a todos que chegaram até aqui. Cada visualização, estrelinha e comentário me fez mais feliz. Amo todos vocês *-*

Kisses


Incontrolável MenteOnde histórias criam vida. Descubra agora